O sector do turismo contribui para quase 15% do PIB nacional e é responsável por um quinto de todas as exportações, empregando cerca de 330 mil pessoas. Entre 2017 e 2018, quatro em cada dez novos empregos foram criados pelo sector do turismo. São, sem dúvida, números impressionantes, que não parecem receber o merecido reconhecimento pelo peso que exibem na nossa estrutura económica.

No Governo com maior número de ministérios desde 1976, totalizando 19, será que a existência de um Ministério da Modernização do Estado e Administração Pública não conseguiria actualizar a composição do Governo para os tempos em que vivemos? É certo que esta composição é, em parte, justificada por questões ideológicas, mas entre o que o nosso país precisa e o que a ideologia dita, a distância é grande. Não falta o Ministério da Agricultura e até um Ministério do Mar, não tendo o cúmulo de ambos o impacto na nossa economia que tem o turismo. Só o termo “estratégico”, um termo ambíguo e caro (1200 milhões de euros, para ser preciso) poderá justificar a existência dessas pastas em vez da do turismo.

A revolução do turismo nacional deu-se por alturas de 2012/13 com, provavelmente, o melhor ministro que este país não chegou a ter: Adolfo Mesquita Nunes. Enquanto secretário de Estado do Turismo, promoveu a liberalização do sector e os caminhos necessários para que, um punhado de anos depois, pudéssemos ter na algibeira o slogan “Portugal está na moda”. Nada surge do nada e é apenas justo referir o nome de Bernardo Trindade, seu antecessor, que no Governo anterior começou a encarar o sector com a importância devida.

Admito a minha ignorância, pois só socorrendo-me do Google consegui descobrir que a actual secretária de Estado do Turismo se chama Rita Marques e é engenheira electrotécnica. Nesta pesquisa deparei-me com as afirmações desta secretária de Estado, que prevê um 2021 novamente a crescer. Este optimismo esbarra de frente com as posições de Adolfo Mesquita Nunes e de Bernardo Trindade, presentes no mesmo evento onde aquelas afirmações foram proferidas. O anonimato de quem tutela a pasta do turismo é sintomático da importância que este Governo lhe dá. Na pasta da economia substitui-se o ornato Manuel Caldeira Cabral por Pedro Siza Vieira, curiosamente casado com Cristina Siza Vieira, Presidente da Associação da Hotelaria de Portugal. Será que não está na altura de criar o Ministério do Turismo com um governante igualmente forte?

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Com o vírus que provoca a doença Covid-19, o turismo nacional (e mundial) sofreu o maior embate de sempre, levando a que a procura turística caísse mais de 90% nos primeiros meses após decretado o estado de pandemia. O país está a recuperar timidamente e a duas velocidades. No interior e no litoral com praia, as taxas de ocupação têm registado valores viáveis, ainda que possam não ser suficientes para salvar o cômputo geral do ano. Já os destinos de city break são os que mais têm sofrido, atingindo até Lisboa, que fora a campeã do turismo nacional. O sector já assistiu à destruição de 13 mil empregos desde o início da pandemia, valor mascarado pelo sistema de lay-off, cujos efeitos reais e totais serão contabilizados no início do ano de 2021. O balanço de 2020 será trágico.

Qual a solução para o sector? Não será uma, mas provavelmente um misto de várias. Por um lado, contenção de custos por via de aumentos de eficiência e por despedimentos, por outro, o esforço de confiança e cativação de turistas. É assinalável o esforço meritório do Turismo de Portugal em implementar um selo de segurança e confiança para quem nos visita: o selo Clean & Safe que, de forma lesta, praticamente todas as empresas da hospitalidade adoptaram. Por outro lado, haverá lugar à reestruturação da teia de empresas em actividade, havendo lugar certamente a inúmeras falências e aquisições. Com os ensinamentos da anterior crise, será adoptada, provavelmente, uma outra forma de gestão destes activos. Muitos, ao passar para as mãos da banca, suspeito que serão concessionados à exploração de operadores existentes no mercado, em vez de se optar pelo caminho dos fundos de investimento (por vezes de buy and flip).

Já a solução apresentada pelo Primeiro-Ministro foi a da reconversão para o sector social. Ou seja, dá como perdido todo um sector, baixando os braços a uma destruição abrupta de emprego. A actual ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Ana Mendes Godinho – detinha o cargo de anterior secretária de Estado do Turismo. Será este o justificativo deste racional? O nosso papel enquanto gestores é precisamente de nos adaptarmos a novas circunstâncias e escolhermos trilhos que sustentem as nossas empresas. Já os trabalhadores não podem simplesmente receber guia de marcha para outro sector para o qual não têm formação, experiência ou conhecimento. Fosse isto dito por um outro Primeiro-Ministro, anterior, a celeuma seria, garantidamente, grande e as primeiras páginas dos jornais  gastariam muita tinta com o tema (consigo pensar em 15 milhões de razões para isto não suceder). O sector social, esquecido por governos de qualquer das ideologias governantes do país, nunca foi além de muleta retórica. Onde estão as creches, os lares públicos e gratuitos? Parece que o Estado não quer saber de quem não é contribuinte líquido.

Desconfio que António Costa não terá o peso de fazer despedimentos e, muito menos, de ser despedido. Quando muito, chega a recontratar para os seus gabinetes pessoas previamente afastadas por estarem envolvidas em temas nebulosos. Para nós, os não políticos, entre gestores e assalariados, o rendimento não é estável ou, sequer, certo. Somos nós que vamos sofrer o embate, somos nós que vamos ter noites mal dormidas e invariavelmente ter de fazer contas à vida. Também seremos nós, quando o vírus passar, que iremos reconstruir o país e levá-lo a bom porto. Quanto à classe política, poderá começar pela criação do ministério do Turismo e sair da frente nos temas onde o Estado não deve criar o seu emaranhado burocrático ou, quem sabe, simplesmente não perder uma excelente oportunidade para estar calado.