1 Vamos começar com um facto histórico sobre as vitórias eleitorais da direita na democracia portuguesa. Os melhores resultados do bloco do centro-direita correspondem às grandes vitórias do PSD de Cavaco Silva em 1987 e em 1991. Se somarmos os votos do PSD com os do CDS, temos um total de 54,66% dos votos que corresponderam 151 deputados em 1987 e um total de 55.03% que elegeram apenas 140 deputados — ironias do nosso sistema eleitoral.
Esses resultados não corresponderam a nenhuma maioria política porque o PSD de Cavaco Silva, com maiorias absolutas robustas (as maiores até a este momento com 50,22% dos votos e 148 deputados em 87 e 50,60% dos votos e 135 deputados em 91) não via nisso qualquer vantagem face a um CDS que parecia à beira da extinção com apenas cerca de 4% dos votos.
O mesmo aconteceu em 2005 em que um José Sócrates histórico conseguiu a primeira maioria absoluta para o PS com 45,05% dos votos e 120 deputados. Se somássemos os votos do PCP e do Bloco de Esquerda — com quem Sócrates sempre teve péssimas relações —, chegamos a um soma total de 58,99% e 142 deputados. Contudo, repito, este resultado é apenas aritmético (e o resultado mais robusto alguma vez alcançado por um bloco ideológico desde 1974) e não correspondia a nenhuma maioria política.
2 Se tivermos em conta a tendência de todas as sondagens destes últimos três meses — e que pode ser consultado neste agregador da Rádio Renascença —, parece claro os estudos de opinião indicam uma clara maioria do bloco da direita (AD + IL + Chega) que ronda os 54%.
Este dado sai reforçado com os dados da tracking poll que a TVI/CNN Portugal começou a publicar e que, ao fim de três dias, dá uma tendência de vitória à AD e coloca o bloco da direita com cerca 57% (com distribuição de indecisos).
A última sondagem da Universidade Católica acrescentou um dado novo surpreendente ao colocar a AD claramente à frente das intenções de voto com 35% dos votos e uma eventual coligação AD + IL à beira da maioria absoluta com os 7% que valerá a IL.
Se somarmos o Chega, temos um bloco de direita com 58% dos votos dos eleitores, sendo certo que tal percentagem equivaleria quase de certeza a um número de deputados que suplantaria os 148 deputados do PSD de Cavaco Silva em 1987 — muito por causa dos mandatos que o Chega deverá conquistar.
Ou seja, as sondagens indicam que o país pode virar claramente à direita a 10 de março, como nunca visto. Uma tendência que obviamente terá de ser confirmada durante a campanha e com os resultados eleitorais.
3 Dito isto, há uma pergunta que se impõe: deve a direita desbaratar a oportunidade de ter uma maioria política com quase 60% do Parlamento? Será que a direita não deve “dar uma nova chance ao país de fazer diferente” e agarrar “com as duas mãos” tal oportunidade “e dar força política ao Governo [liderado pela AD]” para fazer as transformações políticas, económicas e sociais que o pais precisa, como afirmou Pedro Passos Coelho esta segunda-feira em Faro?
A resposta a muito curto prazo, e no que diz respeito ao Governo que deverá sair das eleições de 10 de março, está dada: se ganhar as eleições, a AD liderada por Luís Montenegro só convidará a Iniciativa Liberal (IL) para formar Governo, de forma a ter uma maioria relativa robusta ou até mesmo uma maioria absoluta.
Portanto, a AD exclui o Chega de uma eventual coligação governamental e vai dramatizar o mais possível o voto útil à direita durante a campanha eleitoral — com destaque para a última semana de campanha — para tentar ganhar o maior número possível de votos a André Ventura. Até porque quanto mais baixa for a votação do Chega, maior é a probabilidade da AD + IL chegarem a uma maioria absoluta.
Podemos discutir — e há quem discuta com fundamento — se Luís Montenegro não se colocou de forma desnecessária numa camisa de forças política, ao recusar um partido, em vez de excluir políticas que um determinado partido defenda.
Foi precisamente isso que António Costa fez em 2015 após as eleições: excluiu políticas que colocassem em causa a manutenção de Portugal na União Europeia e no Euro (que Bloco e PCP contestam) ou na NATO (aliança militar que sempre teve a oposição do PCP). Mas não excluiu os partidos.
Seja como for, os Açores provaram que a estratégia de Luís Montenegro do “não é não” ao Chega é correta. Não só porque potencia de forma eficaz o voto útil na AD à direita, como esvaziou a estratégia do “bicho papão” dos socialistas — que foi tão eficiente em 2019 e, principalmente, em 2022.
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Acresce a tudo isto outra questão relevante. Não só o radicalismo de muitas declarações de André Ventura ou o extremismo de algumas propostas (como a prisão perpétua ou a castração química) ou as sucessivas políticas erráticas (a viabilização ou inviabilização de um Governo da AD é a melhor prova disso mesmo) — é mesmo saber se é possível confiar politicamente no Chega.
Basta ver o caso dos Açores para perceber que, caso estivesse num eventual Governo da República, o Chega poderia ser o maior fator de desestabilização desse mesmo Executivo. O Chega tem de provar que é um parceiro de confiança. Enquanto não der essa prova, tem de ficar arredado do Governo.
Por isso mesmo, e num contexto de uma maioria absoluta aritmética do bloco da direita, o Chega terá logo uma primeira oportunidade para começar a mostrar aos seus eleitores e à AD de que é um partido responsável — e não um promotor de instabilidade.
Basta não aprovar nenhuma moção de rejeição do programa do Governo da AD para começar a dar sinais de responsabilidade política.
5 Portanto, a minha questão que iniciou o ponto 3 não está no curto prazo. A “chance” que a direita deve dar ao país para o transformar em nome do progresso e do desenvolvimento da nossa comunidade, a que se refere Pedro Passos Coelho, deve ser construída no médio/longo prazo — e começando logo por medidas de emergência para a área da saúde e da educação e pelo Orçamento de Estado para 2025.
Até porque o Chega tem precisamente esse desafio logo a seguir às eleições: como poderá ser útil ao país e aos seus eleitores? Colaborando com um Governo da AD ou tentando derrubá-lo?
Acresce a isso as questões programáticas. Se analisarmos bem os programas da AD, da IL e do Chega percebemos facilmente que há pontos em comum claros nas áreas económica, como a fiscalidade, e na forma como o setor privado deve colaborar com o setor público para suprir as carências nas áreas da saúde e na educação, entre outros temas.
Tudo isto terá de ser visto no pós-10 de março. Será algo que terá de ser eventualmente construído após as eleições. Não é algo que tenha de ser negociado antes — seja de forma secreta, como o PS inventou nos últimos dias, seja de forma discreta.
Aliás, não deixa de ser extraordinário que um partido, como o PS, que nada disse aos eleitores durante a campanha eleitoral de 2015 sobre o que iria fazer após as eleições, caso o bloco da esquerda tivesse a maioria do Parlamento, agora venha dar lições de moral.
6É importante que não nos esqueçamos como esta história dos blocos surgiu. Foi António Costa, tão ansioso que estava em chegar ao poder, que permitiu que o PCP e o Bloco de Esquerda entrassem no arco da governação. Costa não derrubou muro algum — abriu a porta escancarada para que os radicais de esquerda acedessem, ainda que forma indireta, ao poder.
Pior do que isso, radicalizou o Partido Socialista na linguagem, nos métodos oportunistas que caracterizam a extrema-esquerda e nas ideias. E permitiu que Pedro Nuno Santos — sem dúvida o líder mais radicalizado que o PS alguma vez teve na sua história — ganhasse o partido com o objetivo de ressuscitar a Geringonça.
Mas agora com uma grande diferença: o PS quer coligar-se com o PCP e o BE numa coligação governamental. Repito: foi António Costa quem abriu as portas deste novo mundo.
E a partir do momento que o PS abre a porta do Conselho de Ministros a bloquistas e a comunistas, há razões para recearmos que o PCP e o Bloco de Esquerda radicalizem o país, como o Podemos fez em Espanha durante os Governos de Pedro Sanchez.
Como o PCP e o Bloco de Esquerda no Governo, o preâmbulo da nossa Constituição — que toda a esquerda faz sempre questão de dizer que tem uma força meramente simbólica —, passaria a ser uma realidade cada vez mais nítida em diversas áreas, como o direito à propriedade e outras liberdades económicas.
Esse, sim, é o verdadeiro bicho papão que pouco ou nada se fala.
Teremos muito que falar a seguir às eleições. Até lá, teremos uma campanha intensa, viva e, esperam todos os portugueses, esclarecedora para que os eleitores votem em consciência e de forma livre no dia 1o de março.
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