Esta vai ser uma semana importante para saber exactamente quanto dinheiro virá da União Europeia, para podermos então ser mais ou menos ambiciosos no programa de recuperação da economia. Enquanto isso, vamos marcando passo porque, mais uma vez, não temos dinheiro e dependemos dos outros. Na verdade, porque o Estado português gasta mal, não consegue desempenhar parte da sua função fundamental que é apoiar os portugueses quando eles mais precisam dele.
A primeira cimeira europeia com presença física, desde a pandemia, vai acontecer no fim desta semana, 17 e 18 de Julho, com o Fundo europeu de Recuperação, o plano “Next Generation EU”, como o prato mais quente da agenda, a par do quadro financeiro plurianual, já sacrificado para se chegar a acordo na frente da retoma da pandemia. Os quatro frugais liderados pela Holanda e a que se juntam a Áustria, Dinamarca e Suécia que têm também ao seu lado a Finlândia.
O que está em causa é um envelope financeiro de 750 mil milhões de euros que a Comissão Europeia obterá endividando-se. Na proposta da Comissão, a parte mais importante e controversa daquele montante global são os 560 mil milhões para a Recuperação com 310 mil milhões sob a forma de subsídio e 250 mil milhões em empréstimos. Os classificados como “frugais”, aos quais António Costa chama “forretas”, querem não só reduzir o montante global como são muito críticos em relação às verbas a fundo perdido.
A aprovação deste fundo de recuperação tem um enorme poder simbólico: estamos perante o primeiro passo de mutualização da dívida com os mais ricos a fazerem transferência adicionais para os mais pobres ou mais afectados pela crise pandémica. O peso da restituição do dinheiro, que a Comissão Europeia irá pedir emprestado, recai sobre os mais ricos, sem que estes obviamente tenham a garantia de que nada disto se volta a repetir.
O primeiro-ministro António Costa tem-se desdobrado em contactos para que se chegue finalmente a um acordo. Estiveram cá o primeiro-ministro italiano Guiseppe Conte e espanhol Pedro Sanchez, na liderança de dois dos países que mais vão beneficiar com o fundo de recuperação pela violência que enfrentaram na fase inicial da pandemia. Mas António Costa falou também com a primeira-ministra dinamarquesa na sexta-feira e na quinta com o primeiro-ministro da Letónia.
A semana do primeiro-ministro inicia-se com um dos mais duros opositores, deslocando-se à Holanda onde se vai encontrar com o austero Mark Rutte, indo depois à Hungria para reunir-se com Viktor Orbán.
O primeiro-ministro holandês, que lidera a oposição dos frugais é descrito pela “The Economist” como tendo a arte do compromisso sem capitular, antecipando-se que no fim desta semana se acabará por chegar a acordo. A par de Angela Merkel é um dos mais antigos líderes dos governos europeus presentes no Conselho Europeu mas, contrariamente a Merkel, que hoje pode gastar o seu capital político com o projecto de recuperação europeu, Rutte precisa dele para as eleições que se aproximam, como refere a revista. É ainda interessante perceber como os holandeses olham com cepticismo para a narrativa de que este dinheiro tem como objectivo impedir a fragmentação do mercado único — “e evitar a invasão da China”, diz sarcasticamente um deputado holandês citado pela “The Economist”.
Claro que Portugal tem de apoiar um primeiro-ministro que combate por recursos para que possamos ter dinheiro para recuperar. Com as suas qualidades de negociador, António Costa compreenderá os condicionalismos de Rutte – que lidera um país euro-entusiasta mas com uma ideia muito negativa dos países do sul que era bom conseguir mudar.
As perspectivas apontam no sentido de uma acordo, ainda que se possa assistir a uma redução do envelope financeiro e a menos subsídios e ainda a uma supervisão apertada das aplicação dos recursos.
Mas o que, como portugueses, mais desejaríamos era deixar este papel de mão estendida cada vez que há uma crise, era poder ter um papel de sermos nós os generosos. Tivemos essa esperança com as políticas económicas na era da troika, o que acabou por não acontecer. Voltamos a ter essa esperança com o plano desenhado por António Costa Silva. Esperemos que desta vez seja a sério. Que comecemos a percorrer um caminho que torne o Estado forte e capaz de apoiar os portugueses quando eles mais precisam dele, em vez de desperdiçar dinheiro.