O mantra da Comissão Europeia na transição da Europa para uma economia mais verde tem sido consistentemente otimista: mais empregos, novas oportunidades de negócios e melhor qualidade de vida. Tudo isso é verdade. Os fenómenos climáticos extremos a que assistimos nas últimas semanas são um exemplo dramático das consequências que enfrentamos ao ignorar o aquecimento global.
Porém, a transição verde também tem custos. Embora alguns possam ser cobertos através do Fundo de Transição Justa previsto pela Comissão Europeia, por exemplo, outros são mais indiretos, mais difíceis de compensar e com consequências mais complexas.
É o caso do projeto do gasoduto Nordstream 2 (o primeiro foi terminado em 2011), envolvido em polémica, que pretende transportar gás entre o norte da Rússia e o norte da Alemanha por baixo do mar Báltico, reduzindo a necessidade de usar as múltiplas ligações entre a Rússia e a Europa que passam pela Ucrânia. Este segundo gasoduto sob o Báltico tem sido abertamente contestado pela Ucrânia, que vê as ligações energéticas que atravessam o seu território não só como fonte de receita, mas também como instrumento de segurança face aos avanços da Rússia.
Para a Alemanha, concluir um novo gasoduto é inevitável. No seu esforço para a transição verde, a Alemanha deixou de poder contar com a energia atómica, devido à pressão política na sequência do desastre de Fukushima. A sua dependência energética aumentou, com a energia importada a aumentar de 60% do total em 2010 para 67% em 2019 (enquanto a percentagem desceu em França, Itália, Espanha e até em Portugal). Os gasodutos que vêm da Ucrânia são muito mais longos e respetivos os custos de reparação e manutenção serão provavelmente excessivamente elevados face à via alternativa de um gasoduto mais curto, partindo diretamente da Rússia para a Alemanha debaixo do mar Báltico, e com tecnologia mais avançada. Por fim, a utilização acrescida de carvão para produzir eletricidade é impensável do ponto de vista de transição climática.
A pressão política para responder às alterações climáticas é crescente, até porque os fenómenos extremos têm custos elevadíssimos e são cada vez mais difíceis de antecipar. Por outro lado, para preservar a competitividade da economia é necessário reduzir os custos energéticos. A Europa Central e de Leste enfrentam assim um trilema: como é possível compatibilizar os dois primeiros objetivos (competitividade e ambiente) com soberania energética face à Rússia. No curto e médio prazo parece impossível resolver, até porque a Rússia é o país com maiores reservas de gás do mundo, segundo o World Factbook. Por exemplo, na Argélia, que abastece a Península Ibérica, as reservas de gás são um décimo das da Rússia.
A Ucrânia iniciou um processo formal de consulta com a Comissão Europeia e o Governo Alemão, argumentando que a Alemanha não consultou a Ucrânia como está previsto nos Acordos de parceria com a União Europeia. Com este processo, ainda que não consiga acabar com o projeto Nordstream 2 poderá talvez obter mais concessões financeiras e de segurança face a eventuais ameaças da Rússia. Independentemente do resultado destas consultas, o que é certo é que a transição verde, sendo necessária e urgente, acarreta riscos geoestratégicos para a Europa que têm de ser avaliados.