O nosso país tem quatro datas marcantes na sua história recente: a Revolução do 25 de abril; o golpe do 25 de novembro de 1975; a entrada de Portugal na CEE (1 de janeiro de 1986) e a adesão ao Euro (2002). Sem estes eventos, Portugal estaria hoje na penúria. Sem a Revolução do 25 de Abril, continuaríamos no obscurantismo de 48 anos de ditadura. Sem o 25 de novembro 1975, viveríamos num país de partido único, sem liberdade, como o Partido Comunista Português defende na sua génese, enquanto partido totalitário e não democrático. Portugal tem 10 milhões e 810 mil eleitores. Destes, apenas 5 milhões e 250 mil votaram nas últimas legislativas de 2019. Cinco milhões e 550 mil mil Portugueses (51, 40%) não votaram. Ou seja, Portugal tem mais abstencionistas que votantes. Cerca de 330 mil Portugueses (6,4%) votam no Partido Comunista, num partido que defende um sistema totalitário e que é contra a permanência de Portugal na União Europeia, em pleno século XXI. Em pleno século XXI, também 9,5% dos votantes, ou seja, cerca de 498 mil Portugueses votam num partido, o Bloco de Esquerda, que é contra a permanência do país no Euro, um partido sem ideologia e sem modelo económico conhecidos. Qual é a ideologia deste partido? Qual é o modelo económico que defende para o país? Alguém sabe explicar? Livre de fundamentação ideológica, é um cata-vento de assuntos que recolhe nas redes sociais. O Bloco e os seus representantes vivem da raiva que têm contra aqueles que produzem riqueza e ódio a tudo o que é privado. Perto de 500 mil Portugueses pensam desta maneira e acham que o dinheiro que vem da Europa não faz falta? Os milhões e milhões de fundos comunitários que foram investidos neste país, e os milhões e milhões que vêm da Europa nesta situação de calamidade não foram precisos e não são necessários e não fazem falta para o Bloco de Esquerda.

Um dos aspetos mais graves da nossa democracia é a abstenção. Ninguém ainda explicou aos abstencionistas que, por se absterem de votar, perdem o direito a queixarem-se da política e da governação do país. Não será nas conversas de café e nas conversas entre amigos, que cerca de 5,5 milhões de Portugueses vão defender os seus direitos e preparar um país melhor para os seus filhos e netos.

Mas não obstante a Revolução, a entrada na UE e a adesão ao Euro, Portugal já foi três vezes à bancarrota: em 1977, 1983 e 2011. Em 1977, fruto da indisciplina que se vivia no período pós-revolucionário, da chegada a Portugal de centenas de milhar de Portugueses vindos das ex-colónias, e que foi preciso alimentar, vestir, integrar na sociedade, e também fruto das nacionalizações das principais empresas feitas na sequência do golpe abortado do 11 de março, o governo do PS, com o apoio do PSD, teve necessidade de pedir ajuda ao FMI. E o que o FMI trouxe na bagagem, como sempre faz, foram pacotes de austeridade. Em 1983, fruto do rumo descendente da economia portuguesa, da tendência recessiva provocada pelo “segundo choque petrolífero”, que teve lugar em 1979, da descida contínua das reservas cambiais, resultante da “fuga de capitais” pela perda de valor do escudo, tornou-se necessário, então, contrair um novo e grande empréstimo ao Fundo Monetário Internacional, o qual colocou como condições – sempre as mesmas: a redução da despesa pública e dos salários e a subida de impostos. Em 2011, em consequência da governação do Sr. Sócrates, marcada por casos de corrupção e pela promiscuidade entre interesses privados e gestão pública, o país entrou em recessão e a situação culminou no pedido de ajuda externa, endereçado às instituições europeias e ao FMI. Dizer que a principal causa do pedido de ajuda externa foi a crise financeira e económica mundial de 2007/2008 é mais uma mentira daqueles que nos mentem sempre e descaradamente, há 46 anos. Aliás, a crise foi mundial, existiu para todos, certo? Para além da dívida pública gigantesca, da responsabilidade dos governantes portugueses, e dos vários esquemas de corrupção, Portugal também tem uma grande dívida privada, sendo que esta última não é o resultado de excessos dos cidadãos, como grande parte do discurso político dos partidos do sistema (PS/PSD) nos quer fazer crer.

Voltando aos números e aos Portugueses que votam desde sempre PS ou PSD, e partindo dos números das últimas legislativas, cerca de 3 milhões e 350 mil Portugueses votam PS e PSD, ou seja, cerca de 66% dos Portugueses votam nos partidos do sistema desde que há democracia em Portugal. Estes Portugueses gostam e apreciam a oligarquia situacionista e partidocrática dominante há 46 anos no nosso país. Estes 66% dos votantes revêm-se nos programas eleitorais e nas políticas económicas que são seguidas no nosso país há quase meio século. O país tem uma sociedade civil pouca dinâmica e que aguentou 48 anos de um regime autoritário sem liberdade. É a mesma sociedade civil que vota há 46 anos nos mesmos dois partidos.

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Já iremos falar do fracasso das políticas económicas seguidas em Portugal, mas esse fracasso deve-se, exclusivamente, a estes dois partidos que escolhem as políticas económicas do país desde o 25 de Abril. Por regra, verifica-se em Portugal a ocupação do Estado por pessoas mal preparadas, sem escrúpulos e que se apropriaram do aparelho do Estado. Uma classe dirigente que tem uma ambição desmedida em alcançar o poder para se servir, e para servir os seus, e recolher as benesses do Estado e do seu aparelho. É nesta gente que os Portugueses confiam, ou seja, desconfiam dos partidos políticos, mas votam sempre nos partidos estabelecidos, nos partidos do sistema.

Então, podemos perguntar-nos o que estes dois partidos têm oferecido aos Portugueses desde sempre, porque sempre foram Governo.

Começando pela banca, esta já passou uma fatura aos contribuintes, desde 2008, de perto de 25,5 mil milhões de euros (cerca de 11% do PIB), que os sucessivos governos acolheram, mas sem colocar na Justiça os responsáveis dessas instituições pelas vigarices inimagináveis e negócios de favores que se verificaram durante anos. Foi injetado muito dinheiro com aval do Estado, dinheiro esse, inevitavelmente perdido e pago com dinheiro dos cidadãos. Olhamos para alguns banqueiros que arruinaram o sistema financeiro português, não há um único que esteja preso. Oliveira e Costa do BPN, o primeiro banco a receber ajuda pública, morreu sem ter cumprido um único dia da pena de prisão de 15 anos a que foi condenado. Ricardo Salgado ainda não foi julgado.

A corrupção custa a Portugal cerca de 18,2 mil milhões por ano, ou seja, 7,9% do PIB, segundo um relatório recente (2018) apresentado no Parlamento Europeu pelo Grupo Verdes/ Aliança Livre Europeia. O montante anual perdido para a corrupção, e friso que este montante perdido é anual, supera o orçamento anual para a Saúde (16,2 mil milhões de euros) e é dez vezes superior à despesa com o desemprego (1,8 mil milhões).  Muito haveria por dizer sobre corrupção em Portugal. Mas o que me choca mais, é ver a indiferença e a apatia com que os Portugueses lidam com este problema e votam em partidos que não a combatem. O povo é a maior vítima da corrupção em Portugal, mas não quer saber. Tenho que homenagear, a propósito deste tema, duas pessoas em Portugal que sempre combateram este flagelo e que nunca foram ouvidas pela generalidade dos cidadãos: o Dr. Medina Carreira, que infelizmente já não está entre nós, e o Dr. Paulo de Morais. Para avivar a memória de muitos Portugueses, que têm a memória muito curta, e com a ajuda dos casos enumerados no livro do Dr. Paulo de Morais, “O Pequeno Livro Negro da Corrupção”, lembro aqui apenas alguns casos, alguns deles ainda em investigação sem fim à vista, outros ainda sem resultados concretos na Justiça, mas o que me interessa realçar neste momento é que não podemos esquecer e banalizar de forma alguma estas práticas reiteradas e perniciosas na nossa sociedade e com consequências que se vão fazer sentir ao longo das gerações dos nossos filhos e netos. E enumero apenas alguns. Repito, apenas alguns, porque muitíssimos mais existem, mas a máquina da justiça não tem capacidade, não tem meios humanos e financeiros para combater este flagelo. Mas esquecer estes casos ou fazer de conta que não existem, é matar a esperança no futuro do nosso país. Estes nomes dizem muito a muitos Portugueses, porque já ouviram falar deles, e importa enumerá-los, volto a dizer, só com o propósito de não os esquecer: Apito Dourado; BANIF; BPN; Banco Privado Português; Bragaparques; Duarte Lima; EXPO 98; EURO 2004; EUROBIC; Fátima Felgueiras; Hélder Bataglia; Orlando Figueira; Finibanco; Freeport; Fundo Social Europeu; Henrique Granadeiro; Isaltino Morais; José Guilherme; Grupo Lena; Operação Lex; Luanda Leaks e Isabel dos Santos; Máfia do Sangue; caso das Viagens-Fantasma no Parlamento; Manuel Godinho; Monte Branco; Oliveira e Costa; Operação Fizz; Operação Furacão; Operação Marquês; Panama Papers; parcerias público-privadas rodoviárias; Parque Escolar; Pedrógão Grande; Manuel Pinho; Ponte Vasco da Gama; caso Portucale; algumas privatizações na sequência da intervenção da Troika em Portugal; Rioforte; Ricardo Salgado e BES; José Sócrates; Submarinos; Tancos; Tomás Correia; TGV; Armando Vara; Vistos Gold. A escolha destes nomes foi aleatória, mas recomendo vivamente e de novo a leitura de “O Pequeno Livro Negro da Corrupção” do Dr. Paulo De Morais, porque se trata de um ato de cidadania. E falta-nos muito em Portugal o exercício da cidadania, um exercício pleno e sem medos. Muitos outros casos haveria para enumerar, mas o meu propósito aqui é apenas lembrá-los para definir um país, o nosso país, que se vergou aos interesses e aos lóbis.

Salvo melhor opinião, o combate à corrupção deve ser uma prioridade. Não o tem sido. Num país onde cerca de 2,2 milhões de Portugueses vivem numa situação de pobreza e de exclusão social. O que corresponde a um quarto da população portuguesa. Num país onde o Instituto Nacional de Estatística não publica o peso dos rendimentos e da riqueza do 1% dos cidadãos mais ricos, é interessante verificar, que num inquérito realizado pelo BCE, em 2014, estima-se que 1% dos mais ricos em Portugal represente cerca de 26% de toda a riqueza nacional. Ou que 5% dos mais ricos representam 45% da riqueza nacional. Portugal é, certamente, um dos países da zona euro com maior concentração de riqueza.

Este debate em torno das questões do rendimento e da riqueza teve um lugar de destaque a nível internacional nos últimos anos, especialmente após a publicação do livro “O Capital no Século XXI”, de Thomas Piketty. Nesta obra, o economista francês defende, com base em dados retirados das administrações fiscais dos vários países do mundo, que, desde o início dos anos 80, se tem vindo a registar um agravamento acentuado na desigualdade da distribuição dos rendimentos e da riqueza. Este é um fenómeno, segundo Piketty, que resulta do facto de a rentabilidade obtida pelo fator capital crescer a um ritmo superior à economia e que tende a prolongar-se, caso não sejam tomadas medidas corretivas. É curioso notar que Portugal, que tem tido desde sempre governos socialistas e sociais-democratas, não corrigiu este problema, mas agravou-o, uma vez que Portugal é um dos países da Europa ocidental com maior desigualdade na distribuição do rendimento e da riqueza. Por isso digo, que em Portugal os impostos não são elevados comparativamente com outros países da UE, por exemplo, mas são, sobretudo, mal distribuídos.

Aos mais distraídos lembro que a evasão fiscal retira anualmente cerca de 2% da receita tributária. Portugal perdeu, em 2019, cerca de 883 milhões de euros de receitas fiscais que foram desviadas dos cofres do Estado. Este valor equivale a 7,63% do orçamento da Saúde. Estas perdas davam para pagar salários anuais a 49.651 enfermeiros. Podem consultar estes dados no estudo sobre “O estado atual da justiça fiscal”, elaborado pela Tax Justice Network, em parceria com mais duas entidades que zelam pela transparência fiscal, a Public Services International e a Global Alliance for Tax Justice. A propósito do controlo que faz a Autoridade Tributária em Portugal, lembro o episódio caricato da saída de quase 10 mil milhões de euros para “offshores” entre 2011 e 2014, que embora tenham sido comunicados ao fisco pelos bancos, não foram tributados. Outro episódio caricato prende-se com as declarações de 2014 de um diretor da Autoridade Tributária, de seu nome Azevedo Pereira, que testemunhou o seguinte: em 2014, quando saiu da Autoridade Tributária, uma equipa especial por si chefiada tinha identificado cerca de mil famílias ricas – os chamados “high net worth individuals”, que por definição acumulavam 25 milhões de euros de património ou, alternativamente, recebiam 5 milhões de euros de rendimento por ano. Ora, “em qualquer país que leva os impostos a sério”, palavras do então diretor da Autoridade Tributária, este grupo de privilegiados garantiria habitualmente cerca de 25% da receita do IRS do ano. Por cá, os nossos multimilionários apenas asseguravam e asseguram 0,5% do total do IRS. Ou seja, estes “multimilionários” pagam 500 vezes menos do que seria suposto. Num país sempre governado pelos socialistas e sociais-democratas, esta falta de igualdade perante a lei e a falta de equidade tributária são gritantes e revelam, sobretudo, uma manifesta e hedionda falta de vontade política.

Num país com um endividamento da economia assustador, de 360,2% do PIB (empresas, famílias e Estado), e que atinge o valor de cerca de 740 mil milhões de euros, valor este muitas vezes esquecido, porque se fala sempre e apenas da dívida pública em percentagem de PIB que já vai nos 137% este ano, pergunta-se se esta dívida global da economia e se a nossa dívida pública são sustentáveis.

No que se refere à dívida pública, lembro que o Tratado Orçamental da UE estabelece que a dívida pública dos países da União Europeia não deve ser superior a 60% do PIB. Por conseguinte, com os níveis da nossa dívida, é crucial o país apresentar solvência e liquidez, ou seja, capacidade para pagar as suas dívidas no momento do seu vencimento. Do mesmo modo, os particulares e as empresas devem fazê-lo e as moratórias em vigor, cuja prorrogação continua a ser autorizada pelas instituições europeias, representam um problema a prazo num país com um nível de endividamento colossal.

Neste cenário, o que verificamos é que o modelo económico assentou, desde 1995, num aumento permanente das responsabilidades do país perante o exterior. A falta de competitividade externa tem sido mascarada pela acumulação de défices sucessivos da balança externa e levou a um nível de endividamento dos agentes económicos portugueses e a um endividamento externo incomportáveis. Como é sabido, a taxa de poupança das famílias tem vindo a cair, refletindo o peso crescente do consumo privado na despesa agregada e o crescente endividamento das famílias, o que leva a um crescente esforço das famílias com as responsabilidades mutuárias por elas assumidas, esforço esse apenas atenuado momentaneamente pelas moratórias, como já referimos. A poupança das empresas também é baixa, fruto de um serviço de dívida alto. O Estado português deve priorizar o investimento público em projetos estruturantes para a nossa economia e apoiar de forma massiva as nossas empresas nos mercados internacionais, consolidando assim o peso das nossas exportações. E tantas vezes se tem falado de dois setores da atividade económica ainda não devidamente explorados, mas quase nada tem sido feito: o mar português e a localização privilegiada de Portugal, entre a Europa, as Américas e África. Já agora, alguém sabe o ponto de situação do Banco Português de Fomento criado pelo DL N. 63/2020 de 7 de setembro e aprovado pelo Banco de Portugal e pela Comissão Europeia, que deveria arrancar no passado mês de novembro? E a “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020/2030” de António Costa Silva já teve alguma execução, já se traduziu nalgum projeto concreto? Não faltam ideias, estudos, comissões que são criadas, mas tem sempre faltado fiscalização, cumprimento das metas estabelecidas e execução.

Assim, a mim parece-me que o caminho a seguir é estreito e passa, necessariamente, por uma redução significativa da despesa pública, que representa em Portugal perto de metade da riqueza nacional produzida. Note-se que o nosso PIB per capita é de apenas  24 mil euros, substancialmente abaixo dos quase 32 mil euros da União Europeia. Ou seja, apesar do Estado Português gastar cerca de 95% da média europeia, produzimos apenas cerca de 75% do que se produz na Europa. De acordo com os novos cálculos da Comissão Europeia para 2020, Portugal será o sexto Estado-membro que mais divergirá da Europa entre os 27 e o pior entre os países menos desenvolvidos. A economia portuguesa vai afastar-se 1,6 pontos percentuais da média europeia, de 78,6%, em 2019, para 77%, em 2020. Lembro que convergir com o pelotão da frente da Europa era o grande desígnio de Portugal quando aderiu à Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1986. Mas o país divergiu mais do que convergiu nas últimas décadas e arrisca a chegar ao final deste ano mais longe da média europeia do que do nível de vida da Bulgária, o lanterna vermelha da UE27, como refere o último Expresso de 28 de novembro. Pelas previsões da Comissão Europeia, a Bulgária terminará a presente década de 2011-2020 com um ritmo de crescimento médio anual de 1,8% contra – 0,3% de Portugal. Este crescimento anual negativo na última década é o resultado direto da governação socialista e social-democrata e das práticas governativas em Portugal nos últimos 20 anos. Também sintomático do nosso nível de desenvolvimento social e educacional, é a percentagem da população entre os 25 e os 64 anos que completou pelo menos o ensino secundário. Em Portugal, essa percentagem é de 52,2%, em 2019, contra, a título de exemplo e para falar tão só dos países de Leste contra os quais competimos hoje, 82,5% na Bulgária, ou 85% na Hungria, ou 79% na Roménia, ou 91,2% na Letónia. É notável o nosso atraso, pelo que devemos agradecer aos suspeitos do costume, àqueles que nos governam tão bem desde sempre.

O nosso rendimento não suporta o nível de despesa pública que temos. Não temos rendimento suficiente e, como já vimos, é muito mal distribuído. O caminho só pode ser um e acarreta, inevitavelmente, a redução do número de funcionários públicos, que em Portugal atinge o número astronómico de 700 mil pessoas. É possível reduzir a despesa pública com uma boa gestão dos dinheiros públicos e com uma estratégia que passa pela redução seletiva e estudada dos recursos despendidos com prestações sociais (42% da despesa pública) e com salários (25%), reorganizando as funções sociais do Estado. É um trabalho duro, muito difícil, que tem de ser feito com cuidado e muita sensibilidade, mas é inevitável. A reorganização do Estado passa também pela redução dos institutos públicos (mais de 500) e fundações (cerca de 579), muitos deles sem razão de existir e sem racionalidade de gastos. Melhor Estado significa não só um Estado mais pequeno, mas sobretudo um Estado que assegure de forma eficiente todas as suas funções de soberania e que reforce as suas funções de regulação em detrimento de um intervencionismo que só complica e atrapalha, como muitos de nós já têm enfrentado na sua vida profissional.

Como vimos no decorrer deste artigo, é possível reduzir muita despesa em serviços muito mal geridos, num combate eficaz à corrupção e à evasão e fraude fiscal. Os dinheiros públicos deverão ser canalizados para as pequenas e médias empresas viáveis, que poderão assegurar a manutenção de muito emprego em Portugal, em vez de privilegiar sempre os mesmos grandes grupos económicos e empresas pré-falidas, onde se enterra tanto dinheiro público, sem qualquer escrutínio público. Insisto neste princípio: não desperdiçar os dinheiros públicos, ano após ano, em empresas que não têm viabilidade económica. Deixar definitivamente de canalizar dinheiro para a banca, onde vários desfalques custaram aos contribuintes tanto dinheiro, que se perdeu definitivamente. Os bancos só podem ser encarados como quaisquer outras empresas privadas e devem ser bem geridos, como qualquer outra empresa privada em qualquer outro setor da atividade económica. Sei que criam nos eleitores uma série de receios relacionados com a estabilidade do sistema financeiro e a estabilidade global do país, mas peço que não acreditem nesses argumentos. Vejam o que tem acontecido até aqui e onde foi parar o dinheiro dos contribuintes. Os contribuintes não devem assumir os prejuízos e o lixo da banca, não devendo o Estado pactuar com práticas de gestão danosa, e até criminal por vezes. Também deverá o Estado renegociar os contratos das parcerias público-privadas rodoviárias, invocando alteração das circunstâncias e o interesse público. Estamos a falar aqui, como o explica de forma exemplar o Dr. Paulo de Morais, de um dos mais poderosos instrumentos de promiscuidade entre governos e empresas privadas e de prejuízo das contas públicas. O Estado português prepara-se para pagar, nas próximas décadas, por este ativo, quase 18 mil milhões de euros. Foram celebrados contratos de forma ruinosa, permitindo a vários titulares de cargos públicos transitar para cargos nas empresas privadas que beneficiaram destes contratos.

Falamos de reformar o Estado para o tornar mais eficaz nas suas funções de soberania, nomeadamente na Justiça, onde é preciso que ela seja mais célere e esteja ao serviço dos cidadãos. É necessário administrar a Justiça e reformá-la através da simplificação das leis, com o fim de impedir manobras meramente dilatórias. Não podemos admitir condenações em primeira instância e recursos sem fim para a Relação, para o Supremo e, se for necessário, ainda para o Tribunal Constitucional, numa sucessão interminável de manobras dilatórias, como bem assinalou Luís Rosa em magnífico artigo recentemente no Observador. Deste modo, a Justiça é desacreditada. Também seria importante pensar no aumento das penas e na exclusão da sua suspensão para alguns crimes.

Por fim, a reforma do nosso quadro constitucional, retirando da Constituição o seu pendor estatista e socializante, devendo esta ser ideologicamente neutra.

Para além da Revisão da Constituição, é fundamental alterar o sistema eleitoral obsoleto, através da introdução dos círculos uninominais, não beliscando o princípio da proporcionalidade e aproveitando num círculo nacional os votos não convertidos em mandatos. A criação destes círculos diminuirá a dependência do deputado em relação à direção do partido e reforçará a relação direta entre cada deputado e o seu eleitorado. Por fim, uma redução substancial do número de deputados e a admissibilidade de candidaturas não partidárias são imprescindíveis para reformar o sistema eleitoral.

Em conclusão, muito mais haveria por dizer, mas não é possível num artigo destes falar de tudo o que não está bem e que gostaríamos de ver diferente. Mas acredito que tudo o que foi dito através destas linhas só tem significado se a grande maioria dos cidadãos deste país, principalmente os que não votam, se convencerem de que este é o momento para fazer qualquer coisa em prol do seu país e que nas próximas eleições devem castigar aqueles representantes do povo que não têm servido o interesse público, mas apenas os seus interesses e as suas clientelas. Existe agora uma alternativa democrática que é votar em partidos diferentes, partidos sem vícios e que tenho a certeza que, se um dia chegarem ao poder, serão diferentes. Temos que acreditar e dar o benefício da dúvida, acabando definitivamente com o monopólio da representação política dos dois partidos do sistema. Não tenho quaisquer dúvidas que estes dois partidos são os responsáveis únicos pelo estado da Nação e que prejudicaram e continuam a prejudicar o país. Não há impossíveis em política, mas os Portugueses têm que deixar de ser mansos para serem proativos e atores da mudança, votando, repito, nos novos partidos emergentes. A escolha caberá a cada um.