Lembram-se dos putos que pareciam bandos de pardais à solta naquela música do Paulo de Carvalho? Também eu me recordo, mas longe vão esses tempos em que os putos andavam para aí à vontade, quais pardalitos. Alguns até a ensaiarem, tal e qual as diminutas aves, pequenos voos de teste, cada vez que malhavam duro das suas bicicletas no piso de alcatrão. Claro que hoje em dia nada disso é possível. Nomeadamente, a parte de malhar duro no alcatrão. Uma vez que os actuais putos só têm autorização para brincar, com cautela, estando mais acolchoados que o Popas da Rua Sésamo. E, muito em breve, a coisa ficará ainda mais complicada para a pequenada. Desconfio que, assim que começar a vacinação dos catraios dos 5 aos 11 anos, as limitações impostas ao bando de putos não vacinados vão permitir-lhes quase tanta liberdade de movimentos quanta tinha o papagaio morto dos Monty Python.

Mas não interessa porque, este ano, o Pai Natal traz vacinas para todas as crianças. Poderá haver na mesma o eventual presente no sapatinho, claro, mas o que haverá, na certa, é a garantida vacina no organismozinho:

– Pai Natal! Trouxeste o carro telecomandado e os matraquilhos que pedi!

– Ho, ho, ho! Claro, Joãozinho. Este ano portaste-te muito bem.

– Boa! E além do que pedi, ainda trazes uma mala de médico para eu brincar aos doutores!

– Não, Joãozinho. Esta mala de médico é verdadeira e é minha. É onde trago a vacina da Covid para te dar.

– Mas Pai Natal, como tu próprio disseste, este ano portei-me tão bem. Além de que essa vacina é experimental, pode ter efeitos secundários complicados, e pretende proteger-me de uma doença que não representa qualquer perigo para mim!

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

– Ó Joãozinho, e deves achar que eu, só porque sou uma figura mitológica, estou disposto a correr o risco de me pegares o coronavírus, queres ver.

– Mas Pai Natal, tu já tens três doses da vacina e o perigo da variante Ómicron é quase tão mitológico como tu.

– É impressionante quão bem informado estás, Joãozinho.

– Obrigado, Pai Natal.

– Agora cala-te e arregaça a manga, mas é.

– PAI NATAL, NÃÃÃO!

Vai ser um esforço incrível, o que o nosso governo fará para vacinar todos os miúdos. Vê-se que a saúde dos putos é a grande preocupação deste executivo do PS. Quer dizer, ou é a saúde dos putos, ou é a necessidade absoluta de manter as escolas públicas abertas de molde a não se tonar óbvio que ainda existem imensos alunos que não têm os há anos prometidos computadores. Bem vistas as coisas, é de facto provável que a preocupação do governo seja com um estado de saúde. Só que é o estado de saúde em que o próprio governo chegará às eleições de 30 de Janeiro. É mais isso, é.

Como diria Rui Rio, a propósito das eleições antecipadas é de assinalar o corrupio em que anda a Justiça portuguesa. Ele é ex-secretários de Estado do governo de Sócrates acusados no caso das PPP; ele é Manuel Pinho detido para interrogatório no âmbito do caso EDP; ele é João Rendeiro a ser apanhado na África do Sul. Atenção, estas movimentações seriam surpreendentes em qualquer altura, mas mais surpreendentes se tornam quando estamos naquele período do ano em que qualquer tentativa de resolver assuntos esbarra no clássico “Hum, nestas semanas vai ser complicado. É que agora mete-se o Natal.” Qual quê! Este ano, por esta altura, não se mete Natal nenhum para a Justiça portuguesa. Este ano a Justiça portuguesa é que mete tudo dentro por alturas do Natal.

Pois, ou muito me engano, ou nesta quadra natalícia o Pai Natal vai ter de se desdobrar em workshops de contorcionismo. Pelo menos parece-me que a experiência adquirida, ao longo de décadas, a entrar em assoalhadas através de apertadas chaminés, poderá, muito em breve, vir a ser bastante requisitada por uma série de indivíduos interessados em sair de apertadas assoalhadas através de tubagens de ar condicionado.