No seu discurso à nação, Vladimir Putin avançou com um grande programa de reformas, sem explicar porque é que elas não foram feitas durante os 14 anos que governa a Rússia. Na política externa, continua a aguçar o sentido do nacionalismo entre os seus concidadãos.

Num momento em que a economia russa atravessa graves dificuldades, devido principalmente à diminuição do preço dos combustíveis e cujo exemplo mais evidente é a desvalorização do rublo, o Presidente russo propõe toda uma série de medidas para liberalizar a economia russa: “Temos de fazer muito: criar novas tecnologias e produção concorrente, formar uma maior reserva de solidez na indústria, no sistema financeiro, na preparação de quadros modernos. Para isso temos um grande mercado e recursos naturais, capitais e bases científicas”.

Ou seja, o dirigente russo mais não fez do que repetir propostas feitas por ele há 14, 10, 5 anos, mas que nunca foram realizadas, repetindo-se também na denúncia de velhos problemas do seu país: corrupção, fuga de capitais, burocracia.

Quanto às formas de concretização dessas propostas, Putin apresenta claramente propostas económicas liberais, prometendo mais poder de manobra e iniciativa aos privados. No campo político, apela a uma maior colaboração entre os cidadãos e o Estado: “Gostaria de dirigir-me aos representantes de todos os partidos políticos, às forças sociais, aposto no nosso trabalho conjunto, consolidados”.

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Porém, se olharmos para a realidade russa, não se consegue compreender porque é que estas velhas receitas irão agora resultar.

É também evidente que Vladimir Putin tem um discurso ideológico cada vez mais conservador e nacionalista. O Presidente começa a operar com termos que ainda recentemente eram prerrogativa da extrema-direita russa: “A Crimeia, a antiga Korsun, Quersoneso e Sevastopol têm para a Rússia um valor civilizador e sacral enorme, da mesma maneira que o Monte do Templo em Jerusalém para as pessoas que professam o Islão e o Judaísmo. Hoje e para sempre a nossa atitude para com isso será precisamente esta”.

E deixou uma crítica à União Europeia no espírito do neoconservadorismo russo: “Se para uma série de países, o orgulho nacional é um conceito há muito esquecido e a soberania um luxo demasiado, para a Rússia, a soberania estatal real é uma condição absolutamente essencial para a sua existência”.

Por isso, embora tenha afirmado que não tenciona acabar com as relações com com os Estados Unidos e a UE, que não se vai envolver numa corrida aos armamentos, deixou claro que não tenciona fazer cedências na política externa, nomeadamente no que respeita à Ucrânia. Por exemplo, Putin considera que a UE não deveria ter assinado o Acordo de Parceria com Kiev sem consultar o Kremlin.

Putin voltou a acusar o “estrangeiro” de querer desintegrar a Rússia “segundo o cenário jugoslavo” e apoiando o separatismo no dia em que a guerrilha independentista chechena lançou um ataque contra o centro de Grozni, capital da Chechénia, cuja envergadura não se via há muito.

Pode tratar-se de mera coincidência, mas sem dúvida que deveria ser um sinal preocupante para o Kremlin, que apoia, com armas e homens os separatistas na Ucrânia.