Se a pergunta do título fosse dirigida à situação em França, haveria uma resposta objectiva. Devido a casos de Covid-19 nas escolas francesas, a 4 de Setembro, contavam-se 22 estabelecimentos escolares encerrados. Uma semana depois, a 10 de Setembro, eram 32. E, nas últimas contas (18/09), havia 89 estabelecimentos escolares encerrados — ou seja, apenas 0,15% dos mais de 61 mil estabelecimentos da rede pública. E se a pergunta do título fosse destinada à situação no Reino Unido, haveria igualmente uma resposta concreta: cerca de 99,9% das escolas mantêm-se abertas. Mas os dados vão mais longe e explicam-nos que 900 escolas estatais (4% do total) não estão integralmente abertas (i.e. enviaram alunos ou turmas para quarentena doméstica) — um número que corresponde à contagem da semana passada e que quadruplicou a da semana anterior.
Se alguém colocar a mesma pergunta sobre a situação em Portugal, não encontrará resposta. Pelo menos, não encontrará resposta oficial. Ao contrário dos exemplos acima, onde membros do governo ou autoridades públicas de educação comunicam com transparência e fazem um ponto de situação semanal, não existe esta sistematização da informação no nosso país. Assim, os dados conhecidos referentes ao arranque do ano lectivo neste contexto de pandemia são aqueles que a comunicação social (nacional ou regional) e canais informais vão reportando, com todas as insuficiências desse exercício casuístico, pois imensas situações não chegam ao conhecimento público. Deveríamos então fazer como os franceses e os ingleses? Sim, sem qualquer dúvida. E desengane-se quem classificar esta informação como desnecessária: que o Governo não cumpra este dever de transparência é um erro que poderá custar-lhe caro na própria gestão da pandemia nas escolas.
Primeiro, porque a informação parcial e de má qualidade gera uma percepção pública errada sobre o regresso ao ensino presencial. Neste caso, o melhor travão para os alarmismos corporativos e para os receios das famílias é mesmo disponibilizar informação oficial com transparência. Se partirmos da experiência de França e Reino Unido, os dados mostram que o encerramento de escolas foi residual e que é ainda muito baixo o número de situações onde surgiu a necessidade de quarentenas de alunos e turmas. Ao contrário do que levaria a crer o frenesim noticioso, que diariamente dá nota de encerramentos e turmas enviadas para casa, a situação nas escolas está (ainda) relativamente tranquila. A partilha dos dados por parte do Ministério da Educação teria, certamente, um efeito apaziguador.
Segundo, a partilha de informação sistematizada é parte indispensável da gestão da pandemia em contexto escolar. Sem essa recolha de dados, não é possível avaliar a situação actual das escolas e perceber a sua evolução, compará-la com os indicadores nacionais dos contágios, medir a eficácia dos protocolos sanitários em vigor nas escolas e, por fim, proceder aos ajustes necessários (sanitários ou educativos). E, claro, não se podem escrutinar as opções tomadas. Note-se que, em França, essa utilidade já se manifestou: face à experiência das primeiras semanas de aulas e aos dados obtidos, as autoridades francesas consideraram que o protocolo sanitário nas escolas tinha de ser revisto, nomeadamente em relação às quarentenas. Assim, perante um caso positivo numa turma, em vez de envio automático para casa dos alunos e do professor, a opção passará a ser de os manter na escola — a quarentena apenas será accionada quando existirem três casos na mesma turma. O objectivo das autoridades francesas é evidente: prevenir que as escolas encerrem desnecessariamente, ou que o ensino presencial seja interrompido para milhares de alunos de forma desproporcional.
Em Portugal, quando as quarentenas começarem a suceder-se, inviabilizando, na prática, o ensino presencial, também as orientações sanitárias serão revistas, seguindo o exemplo francês? Com que dados avaliará o Ministério da Educação essa possibilidade? E que informação terão as comunidades escolares (e a sociedade civil) para escrutinar a situação pandémica nas escolas? Nenhuma destas perguntas tem resposta. E esse grande vazio começa a ganhar forma de elefante na sala.
O Governo pediu ao país que o arranque do ano lectivo e o retomar do ensino presencial fossem abraçados com responsabilidade e serenidade por parte das famílias e dos profissionais da educação. Sim, essa mensagem está correcta. Mas contém também uma omissão que faz toda a diferença: se o Governo não comunicar com transparência e não confiar nas famílias e professores, o ambiente nas comunidades escolares será sempre de tensão, ansiedade, receios e desconfiança. Há uns meses, demorou-se muito a gerar o consenso social sobre a necessidade de reabrir as escolas para que as crianças voltassem a ser crianças. Agora, para manter as escolas abertas, tornou-se importante tratar os portugueses como adultos e, com transparência, divulgar os dados sobre o impacto da pandemia nas escolas. Era bom que, desta vez, o Governo não demorasse demasiado tempo para o entender.