Estou condoído com as dificuldades que António Costa tem atravessado para compor e recompor o seu Governo. Tem sido um vai-vem de Ministros e Secretários de Estado, um entra-e-sai de governantes, uma lufa-lufa de substituições que atordoa o mais pacato dos espectadores!

Eu ainda não me tinha pronunciado sobre o tema porque estava falho de ideias acerca da estabilidade e da pacificação no seio do Executivo para partilhar com António Costa, talvez porque tenha demorado a compreender o padrão – mas creio que agora percebi.

A pobre Constança não foi despedida apenas por incompetência da própria e pela pressão do Presidente da República, não! Azeredo Lopes não foi substituído por se ter esquecido de trancar a porta do paiol, nada disso! E nem Adalberto nem Leitão Marques eram maus funcionários nem costistas não-praticantes! O problema foi essencialmente outro e foi no programa da Cristina que me apercebi dele – António Costa é um homem de família.

Ser um homem de família – sublinhe-se bem – é uma enorme qualidade e dentro de certos parâmetros um comportamento a defender e preservar. Significa que cuidamos dos nossos em primeiro lugar, que pomos todos os interesses em posição subordinada aos do nosso núcleo mais próximo e quer dizer que iremos sempre amar e defender o nosso contingente mais íntimo contra tudo e contra todos – incondicionalmente.

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E foi assim que me ficou claro, subitamente, que o Primeiro-Ministro é, para além do seu núcleo familiar stricto sensu, também o pater familias do Governo socialista, o bom chefe de família que em tempos servia de padrão-ouro à avaliação que os juristas faziam do carácter dos homens e da rectidão dos seus intentos. Portanto, muito consequentemente, tem chamado para junto de si os mais amigos e os respectivos agregados familiares, polvilhando o Governo de cabritas, vitorinos, vieiras da silva e incontáveis outros ramos do imenso tronco cor-de-rosa – Pedro Nuno e a sua mulher são as mais recentes aquisições familiares.

Se Mário Soares foi o Presidente-Rei, António Costa, dilecto discípulo e herdeiro em linha directa do estilo, do optimismo e da bonomia revelou-se agora o Primeiro-Ministro-Rei, chamando o seu reduto doméstico a participar no governo dos súbditos – um nepotismo cor-de-rosa instalado e a preparar a sucessão dinástica.

Pois bem. Se o programa da Cristina me revelou o homem e o seu carácter, outros programas revelaram-me a solução – refiro-me a “Quem quer casar com o agricultor” e “Quem quer casar com o meu filho”.

É chegado o momento de propor uma nova maneira de escolher governantes – um reality show em que o Primeiro-Ministro, assessorado pelos seus mais próximos, testa as qualidades e aptidões de cada candidato a Ministro, Secretário de Estado, chefe de gabinete e por aí fora. Frente a frente num sofá, com luz intimista e um ambiente acolhedor será difícil não acertar em cheio naqueles que virão a revelar-se os melhores para o governo de Portugal!

Por exemplo: chega o candidato a Ministro da Educação e a mulher de Costa dispara, bloquinho na mão e óculos na ponta do nariz: “Então diga-me lá: teve matemática até que ano? Sabe resolver equações com duas incógnitas? Como contaria o tempo de serviço dos professores?”. E responde o candidato, sorriso nervoso e olhando a câmara de soslaio: “eh pá, essa agora é que eu não esperava”…

Vem depois o putativo titular da pasta da Administração Interna e pergunta a nora de Costa: “O menino andou nos escuteiros? Sabe dar quantos nós? E queimadas, sabe fazer com segurança?”.  O candidato treme de nervos e balbucia que “já foi há muito tempo que por lá passei, mas que é uma escola de virtudes, isso é…”.

No programa seguinte, testa-se as habilitações da futura Ministra da Saúde. Questiona Siza Vieira: “A senhora candidata licenciou-se em que ano? E em que dia concluiu o curso, num dia útil ou num Domingo? Na sua juventude frequentava acampamentos do Bloco? Considera os médicos e os enfermeiros como parte do problema ou da solução?” A candidata diz, timidamente, que o Bloco nunca a atraiu muito e Costa sorri, confiante.

Entra de seguida o pretendente a Secretário de Estado da Energia e atira Pedro Nuno: “O senhor sabe a diferença entre corrente contínua e corrente alterna? E sabe o que é uma instalação trifásica? E o seu inglês técnico, de que nível é?”.

O candidato, aproximando-se o final do programa, explica em voz baixa que não, não percebe muito dessas coisas, mas tem tido umas explicações caseiras com o seu primo de apelido Vieira da Silva, que é muito habilidoso.

Antes do fade-out, Costa é filmado de cima a pôr um OK no nome do último candidato – e a piscar o olho a um Pedro Nuno triunfante.

Claro que estas ideias não serão úteis na eventualidade (em que alguns acreditam) de já ser esta a metodologia seguida hoje em dia nas escolhas para o Governo…