Vamos imaginar uma reunião do núcleo duro de Pedro Nuno Santos no Rato. Estão a discutir o enorme dilema que o PS enfrenta no Outono. O partido quer votar contra o orçamento “da direita”, mas não quer eleições antecipadas. Os socialistas querem deixar de estar na defensiva e querem passar ao ataque contra o governo. Lembram-se, assim, da auditoria da IGF à TAP. Permite atacar o governo, voltando aos tempos de Passos Coelho (a actividade preferida do PS), pelo caminho também atingem Maria Luís Albuquerque e, sobretudo, preparam o caminho para liderar a oposição à privatização da TAP.

Não sei se no núcleo duro de PNS estará alguém que trabalhou com ele no Ministério das Infraestruturas, com a responsabilidade directa pela TAP. E se esse alguém é uma pessoa com coragem para falar com franqueza nas reuniões do núcleo duro. Vamos imaginar que existe essa pessoa no núcleo duro de PNS. Ela diria: “Camarada Pedro Nuno, nós sabemos que a TAP foi vendida por 10 milhões de euros e não por 226 milhões de euros.” (Ou seja, David Neeleman pagou 10 milhões ao estado português com um governo da AD, e recebeu 55 milhões do estado português com um governo socialista, quem é o verdadeiro amigo de Neeleman?).

Vamos continuar com a assessora corajosa de PNS: “Camarada Pedro Nuno, em 2015, a TAP estava FALIDA. Nós sabemos isso.” Num verdadeiro assomo de coragem, acrescentava: “Em parte estava falida porque perdeu cerca de mil milhões de euros num negócio ruinoso no Brasil, feito durante um governo socialista. Se não tivesse perdido mil milhões de euros, não teria sido vendida por 10 milhões.”

Vamos ainda imaginar que essa assessora entende as questões financeiras (não é o PS agora o partido das contas certas?), e explicava à maioria dos outros membros do núcleo duro: “Os chamados fundos da Airbus, os 226 milhões de euros, foram uma espécie de empréstimo de um credor da companhia porque acreditou no plano de negócios (acho que no Rato não devem usar o termo ‘business plan’) dos novos proprietários da TAP, mas não acreditava na gestão do Estado português. Fazem-se centenas de negócios assim na Europa todos os anos.”

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Um outro membro do núcleo duro de PNS perguntou: “Mas porque razão o Passos vendeu a TAP ao americano e não a uma companhia europeia?” A assessora foi obrigada a responder: “Porque a TAP estava falida e nenhuma companhia séria na Europa a queria comprar.”

Um terceiro membro do núcleo duro levantou uma nova questão: “Mas os gajos da direita não tinham nada que vender a TAP ao americano quando o governo deles estava a chegar ao fim.” A assessora, com uma honestidade que deixou os seus camaradas perplexos, respondeu: “O Passos sabia que o Costa, com o apoio do PCP e do Bloco para formar governo, nunca iria privatizar a TAP e quis resolver o problema. Além disso, a troika tinha exigido a privatização da TAP.”

A assessora que também gostava de provocar foi mais longe: “Camaradas, a verdade é que em 2015 nenhuma companhia queria a TAP, mas depois da privatização, agora as três maiores companhias aéreas europeias querem comprar a TAP.” Aí, virou-se para PNS e disse: “Pedro sabes isso, tivemos reuniões com essas companhias.”

PNS teve a última palavra: “Tudo isso é verdade, mas nós estamos aqui a fazer política. A verdade não interessa, o que interessa é a narrativa que vamos construir. A TAP vai servir para atacar o governo, porque os gajos estão a encostar-nos à parede com a merda do orçamento e eu estou farto.”

“Além disso”, continuou PNS, “uma coisa é ser ministro, outra coisa é ser o líder da oposição. Como ministro, tinha de privatizar a TAP. Mas agora, como líder da oposição, vou ser contra a privatização.”

PNS virou-se então para o assessor de imprensa e disse-lhe: “Telefona ao nosso pessoal nas redações e diz que a TAP foi comprada com o seu próprio dinheiro, ataquem o governo e a Maria Luís, e peçam a demissão do Pinto Luz.”

O pessoal de esquerda nas redações, obviamente, obedeceu. Assim se faz “política” e “jornalismo” em Portugal.