À primeira vista, pode parecer bizarro; depois, faz sentido: na noite da sua reeleição, Donald Trump definiu o eleitorado que votou nele como “o partido do senso comum” (common sense). Como? Trump, representante do senso comum? Sim, o representante daqueles que sabem que a entrada ilegal e súbita de milhões de pessoas num país destruirá a sua coesão social. Ou que desautorizar e tirar meios à polícia é apenas um meio de abandonar as cidades ao crime. Ou que há diferenças biológicas entre homens e mulheres, e que deixar homens competir em provas desportivas femininas acabará por vedar o desporto de alta competição às mulheres. Sim, isto era senso comum. Deixou de o ser desde que as esquerdas ocidentais adoptaram o wokismo como religião, e os novos beatos se dedicaram a cancelar quem pensa de maneira diversa. Trump foi o voto que restou a todos aqueles que, apreciando ou não a personalidade do candidato e algumas das suas opções políticas, o viram como uma barreira à insensatez woke.

A esquerda americana renunciou ao senso comum, mas não esperava perder as eleições.  Julgou que lhe bastava a técnica soviética de chamar “fascistas” aos adversários. Acreditou que a sua candidata, sendo mulher e negra, iria, apesar da manifesta falta de outras qualidades, cativar os votos de todas as mulheres e de todos os negros. Mas a esquerda americana perdeu. Vão agora as esquerdas perceber que o velhinho labéu de “fascista” não dispensa bons argumentos? Vão perceber que o cansado apelo identitário não compensa a falta de um líder competente?

Não vão perceber. Na década de 1990, alguns líderes da esquerda ainda não tinham rompido com o senso comum, e outros, após o descalabro da União Soviética, estavam disponíveis para o readoptar. Tivemos assim Bill Clinton ou Tony Blair. Em 2024, porém, as esquerdas ocidentais estão capturadas pelo radicalismo woke. Há um ou outro dirigente que reage. Por cá, um exemplo é o presidente socialista da câmara municipal de Loures, Ricardo Leão. Mas a fúria com que os seus camaradas se empilharam para o afastar prova que não há, à esquerda, espaço para uma liderança livre da peculiar obtusidade woke.

As sociedades do Ocidente estão a ser subvertidas pela imigração ilegal, constrangidas pelo despesismo do Estado e decorrente inflação, e ameaçadas por potências anti-ocidentais. É possível encarar movimentos políticos como o encabeçado por Trump como a manifestação de um genuíno cuidado com a preservação da vida segura, próspera e justa que é viável no Ocidente. Mas para as esquerdas woke, são apenas a irrupção da ignorância e do preconceito. Por isso, acreditam que não devem debater com eles, mas apenas estigmatizá-los: fazer as pessoas envergonharem-se de ter aquelas preocupações e opiniões. Eis porque se permitiram ignorar que 70% dos americanos dizem que o país está num mau caminho. Depois da derrota, admitem apenas, cheias de condescendência, que os eleitores não compreenderam que a economia americana já estava melhor.

A maioria das populações ocidentais volta-se naturalmente para quem expressa cuidado com a defesa do seu modo de vida. Não são as esquerdas. Não é também aquela parte das direitas que se convenceu que o wokismo veio para ficar e que se julga muito esperta por ter deixado de saber o que é uma mulher. Foi assim que nos EUA um empresário comprometido em controvérsias que, no passado, teriam afundado qualquer candidatura, acabou por ser eleito triunfalmente. Era o candidato que falava pelo senso comum, sem medo e com eloquência. Nada disto é misterioso. Mas eles nunca vão perceber.

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