785kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Costa entra em campanha na Margem Sul. O dilema entre o líder em festa e o primeiro-ministro contido

O líder socialista entrou na estrada eleitoral, mas leva atrelado um primeiro-ministro que não quer que se confunda folgança com folga orçamental. E o aviso foi já deixado em terras comunistas.

Quem subia a escada do barco das sete e pouco da tarde, do Cais Sodré para Cacilhas, parava incrédulo enquanto balbuciava um “boa tarde” e voltava ao “boa tarde” recebido… do primeiro-ministro. Na primeira fila, mesmo em frente dos degraus que levam ao piso de cima do cacilheiro, estava sentado António Costa. Campanha é campanha e, esta sexta-feira, o líder socialista entrou em força: em pouco mais de três horas, correu três câmaras comunistas da margem sul e ainda fez uma perninha em Lisboa, com o conjunto dos autarcas socialistas daquela Área Metropolitana. Um primeiro-ministro em campanha, com boas notícias no bolso (dados económicos da última semana), só tem vantagens? Talvez para os autarcas socialistas a votos. Mas António Costa mostrou que por detrás do sorriso que leva estampado na cara há uma preocupação.

“O problema fundamental é gerir as expetativas. Com os resultados da economia pode-se criar aqui a ideia de que existe uma folga, mas depois há na mesma o problema da dívida“, afirma ao Observador um membro do Governo. Enquanto a campanha corre pelo país, no Parlamento o Executivo negoceia com a esquerda o Orçamento do Estado para o próximo ano.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A saída do lixo, há uma semana, o valor do défice do primeiro semestre, conhecido esta sexta-feira, e a aceleração da economia também no mesmo período são trunfos valiosos de campanha, e criam uma expetativa: não só nos partidos que apoiam o Governo no Parlamento (e em pleno processo negocial), como também nos autarcas do partido de Governo. Há ou não folga para alimentar promessas eleitorais?

António Costa sai do cacilheiro e avança quase a mostrar uma ponta de saudades do ambiente eleitoral. Antes de sair de Lisboa, tinha estado com os autarcas socialistas da Área Metropolitana no Cais do Sodré e começou logo por aqui: “É sempre um gosto fazer campanha eleitoral”. Vai logo direito a quem ali por ali está, na rua em Cacilhas, e rapidamente desaparece no meio das pessoas e dos telemóveis no ar a pedirem selfies.

Ana Catarina Mendes, a secretária-geral adjunta do PS que estava na sua zona de influência, pega ela mesma nos aparelhos e vai disparando fotografias dos eleitores com António Costa que, junto a um quiosque, já vai com uma imperial na mão. Dois goles depois e está dentro de um carro do partido já à espera na outra margem, ainda que o corpo de segurança não deixe esquecer que ali vai o primeiro-ministro.

Este foi sempre um território difícil mesmo para o PS. E estas são as primeiras eleições vistas da Margem Sul em que o PCP viabiliza um Governo socialista. Costa faz o teste, sem criticar os parceiros da “geringonça”. Mesmo estando em campanha, não ataca os autarcas comunistas. Acaba por ser bem recebido na rua.

A primeira paragem é a Costa da Caparica, onde já está tudo preparado para o comício. António Costa chega, ouve a candidata socialista à câmara de Almada, Inês de Medeiros, e depois sobe ele ao palco para a primeira intervenção no período oficial de campanha. Fica ali marcado o ritmo — que se seguirá logo nos comícios seguintes — e pode sintetizar-se assim: júbilo, o caminho do PS deu frutos; calma, há dívida para pagar. Ou seja, não se confunda a folgança, com folga orçamental.

“O diabo não veio, o que saiu foi o lixo”

Folgança s.f. 1. ato de repousar; descanso; folga; 2. folia; festa; grande divertimento (Dicionário da Língua Portuguesa). Comecemos pela parte festiva do PS nesta altura do campeonato. Antes de Costa subir ao palco, no jantar-comício de Setúbal (o segundo deste mini-périplo), a voz-off grita pelo “rosto da confiança”, “o rosto da esperança”, “o rosto da devolução dos rendimentos” e por aí fora.

O líder socialista levanta-se da mesa e sobe ao púlpito e, enquanto no fundo da sala o homem que assa as sardinhas servidas do jantar se livra da água suja do alguidar, no palco, Costa sacode dois pesos: “O diabo não veio, o que saiu foi o lixo“. Uma hora antes, na Costa da Caparica, não houve sardinhada, mas houve a mesmíssima fórmula: “Não, connosco não veio o diabo. Connosco saiu o lixo e estamos a ter o melhor défice do regime democrático”.

ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Depois, em ambas as intervenções, passou às promessas. “O rendimento das famílias vai aumentar com a revisão dos escalões do IRS“, disse em Almada referindo-se concretamente aos rendimentos mais baixos “muito penalizados” pelo aumento deste mesmo imposto. “Vamos combater a precariedade também no setor privados”. “Vamos devolver a perspetiva de carreira às pessoas”.

E em Setúbal, o registo foi o mesmo: “É preciso dar continuidade à política de rendimentos”. “Temos de assegurar que desdobraremos os escalões para os rendimentos mais baixos”. Acontece que tudo isto já está previsto pelo Governo no Programa de Estabilidade — e a ideia é seguir o que lá consta à risca, sem pedidos excecionais de flexibilização de metas à Comissão Europeia, confirmou o Observador junto de um membro do Executivo: “Não é uma questão nesta altura”.

 "Não, connosco não veio o diabo. Connosco saiu o lixo e estamos a ter o melhor défice do regime democrático", atirou Costa na Costa da Caparica.

Ou seja, Costa não está a prometer nada de novo. Está a embrulhar o que já tem previsto, com os bons resultados económicos e orçamentais para pedir o voto no PS. A contenção tem uma razão. A folga orçamental conseguida tem um destino. E é aqui que entra a segunda parte do dilema de Costa nestas eleições.

Líder socialista travado pelo primeiro-ministro

O que se fez até aqui é para continuar, sem desvios de qualquer espécie. É que António Costa continua pressionado pelas metas europeias e isso nota-se a cada intervenção. Quando, em Setúbal, falou na saída do país do Procedimento por Défice Excessivo, o líder socialista que ia lançado na ladaínha de feitos da governação do PS, foi travado pelo primeiro-ministro que há em si. “É essencial assim continuarmos, a ter finanças públicas mais sólidas que permitam aos portugueses poupar milhões de euros de juros aos serviço da dívida”.

"Com os resultados da economia pode-se criar aqui a ideia de que existe uma folga, mas depois há na mesma o problema da dívida", diz um membro do Governo.

E não era a primeira vez que o dizia. Também na Costa da Caparica já tinha avisado que o caminho de controlo das contas públicas é para continuar. “Repusemos os salários, horários e feriados e continuamos a ter o défice mais baixo da nossa democracia”. E logo a seguir: “Essa continuidade tem de prosseguir no Orçamento do Estado do próximo ano”.

O discurso eleitoral está definido. Nesta parte concreta, tem peso especial ali, no concelho dominado pelos comunistas desde o 25 de abril, os mesmos comunistas que estão sentados à mesa das negociações do Orçamento. “Devemos fazer a gestão orçamental com equilíbrio”, previne António Costa.

Na primeira fila das plateias (no caso de Setúbal, na mesa central do largo da cidade onde se serviram sardinhas assadas) estiveram não só os candidatos às câmaras e freguesias, mas também os socialistas de relevo com ligações históricas ao distrito: esteve a secretária-geral adjunta, Ana Catarina Santos, mas também governantes, como o ministro Adjunto Eduardo Cabrita, o ministro do Planeamento e Infraestruturas, Pedro Marques, e, central nesta altura, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. António Mendonça Mendes responsável pela pasta desde a tumultuosa saída de Fernando Rocha Andrade, que é também líder da Federação Distrital do PS em Setúbal. António Mendes é central nesta altura, porque é o homem que tem sob a sua responsabilidade o desenho de uma das medidas centrais no próximo Orçamento: a revisão de escalões do IRS.

"Devemos fazer a gestão orçamental com equilíbrio", previne António Costa.

Mendonça Mendes, ainda assim, passa mais discreto do que Pedro Marques que, enquanto no jantar de Setúbal os convivas socialistas se arrumavam nas mesas com lugares e pratos ainda disponíveis, era puxado pelo ombro por um local que lhe cochichava um pedido sobre uma qualquer “ligação” na terra. Com a mãos nos fundos comunitários, o ministro é um alvo recorrente dos autarcas. Sobretudo em período eleitoral.

Nos comícios, o pedido maior é o de António Costa que quer tirar destas eleições uma leitura nacional, para reforçar o poder negocial do Governo no tempo que resta de mandato — afinal sempre está em bastiões de um dos seus parceiros no Parlamento. “É importante dar força ao PS a meio de uma legislatura em que prometemos e cumprimos”. “Dar força ao PS é eleger autarcas do PS”, reforçou para não deixar margem para dúvidas.

E, neste ponto, a dramatização típica de campanha atinge o pico em Setúbal: “Apelo à mobilização, o nosso grande adversário é a abstenção. São os que acham que não vale a pena ir votar porque o PS já ganhou, ou os que acham que o voto não muda nada ou porque o PS não ganha no seu concelho. Não nos basta as sondagens para ganharmos estas eleições“.

Na gaveta só ficam mesmo as críticas de outros tempos. Há precisamente dois anos, o líder socialista fazia campanha para as legislativas. Apesar de, nessa altura, ter deixado para outros camaradas de combate os discursos mais duros com os partidos à esquerda do PS, também ele foi apanhado em críticas aos partidos a quem pouco mais de um mês depois havia de pedir a mão para um acordo parlamentar. Mas agora os tempos são outros e nem uma vírgula de crítica autárquica se ouve, do líder socialista, em relação a quem governa as terras por onde passou e que escolheu para entrar nesta campanha.

Assine o Observador a partir de 0,18€/ dia

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Vivemos tempos interessantes e importantes

Se 1% dos nossos leitores assinasse o Observador, conseguiríamos aumentar ainda mais o nosso investimento no escrutínio dos poderes públicos e na capacidade de explicarmos todas as crises – as nacionais e as internacionais. Hoje como nunca é essencial apoiar o jornalismo independente para estar bem informado. Torne-se assinante a partir de 0,18€/ dia.

Ver planos