Rajoy à frente, PSOE em segundo, Podemos em terceiro, Ciudadanos em quarto. Tudo na mesma? Não, tudo diferente, e quem vos disser que está tudo na mesma, mente ou não percebe nada. É um facto, nenhum partido voltou a obter maioria absoluta, e as velhas incompatibilidades não foram abandonadas na noite eleitoral. Talvez os protagonistas da política de Espanha estejam tentados a portar-se da maneira como se portaram nos últimos seis meses; mas a política de Espanha, ao contrário dos seus protagonistas, mudou. A dinâmica é outra.

O que aconteceu em Espanha foi mais uma derrota humilhante das expectativas dos círculos políticos-mediáticos, como no referendo do Reino Unido. Todos aguardavam a ascensão do Unidos Podemos, que ia ultrapassar o PSOE e forçá-lo a afogar-se numa maioria liderada por Pablo Iglesias. Não aconteceu nada disso. Pedro Sanchez, como lhe competia, deu ao PSOE o seu pior resultado de sempre. Mas Pablo Iglesias conseguiu fazer pior, perdendo, na sua aliança com os comunistas, cerca de um milhão de votos. O Podemos fez campanha cheio de arrogância e de basófia, como o BE na sua convenção deste fim de semana. Mas não conseguiu ultrapassar o PSOE, nem sequer formar maioria de governo com o PSOE. É o grande derrotado destas eleições. Perdeu estas eleições e muito provavelmente perdeu também a sua oportunidade.

O fiasco do Podemos deixou Sánchez disfarçar o seu próprio insucesso, proclamando vitória no pequeno campeonato regional onde o PSOE ainda consegue jogar: o campeonato da “esquerda”. Para se salvar, Sánchez promoveu assim o Podemos a seu inimigo principal. O PSOE, segundo Sánchez, seria o único partido à esquerda com “um projecto para Espanha”.

Derrota do Podemos, derrota do PSOE, derrota também do Ciudadanos, esta segunda volta das eleições legislativas de Dezembro tiveram porém uma vitória: a vitória do PP de Mariano Rajoy, que aumentou votos, aumentou mandatos, e ganhou em quase todas as províncias. Tal como noutros países europeus, a direita reformista em Espanha resistiu muito melhor aos populismos e aos radicalismos do que a esquerda dos interesses, representada pelo PSOE. Neste momento, não há alternativa ao PP, a não ser que Sanchez resolva negar a Espanha e aceitar uma coligação com o Podemos e os separatismos. O único governo de Espanha passa pelo PP.

Os líderes do PSOE e dos Ciudadanos têm meios para voltar a negar um governo à Espanha. Mas desta vez fá-lo-iam em perda, ao contrário de Dezembro. O vento está contra eles, e contra a soberba com que os radicalismos julgaram que, agora, tudo lhes pertencia. Não pertencia. Os eleitores começam a cansar-se da política conduzida por ex-bolseiros deslumbrados. Uma terceira volta das eleições talvez seja o epílogo das suas férias grandes.

Provavelmente, nunca será fácil determinar o efeito do Brexit nestas eleições. Mas quem sabe? O recreio político em que a Europa tem vivido, a namorar com nacionalismos e com populismos, pode ter acabado. Até ao Brexit, esses devaneios não tinham tido grandes consequências. Mesmo na Grécia, o Syriza significou apenas mais uma bancarrota e mais um pacote de austeridade. A União Europeia, com o seu poder financeiro e a sua aparente determinação em manter-se unida, parecia cobrir todas as brincadeiras, mesmo as mais arriscadas. No fim, lá vinha uma troika com mais dinheiro, ou uma cimeira com mais concessões. Era possível pôr a boina do Che Guevara ou a boina da Milícia de Vichy sem ter de pagar por isso. Os referendos com que o PASOK e o Syriza jogaram na Grécia deram ideia que nunca nada aconteceria. A “crise do sistema” era pouco mais do que um divertimento mediático. Com o Brexit, viu-se pela primeira vez que algo podia acontecer. Talvez a sanidade não tenha voltado ao continente. Mas a partir da semana passada, a loucura passou a ter um preço.

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