O alvo caiu: Luísa Maia Gonçalves diretora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) foi afastada. O parecer negativo do SEF à nova Lei de Estrangeiros nascida de um projecto do BE colocara Luísa Maia Gonçalves (nomeada já por este governo para aquelas funções) na lista daqueles que Costa teria de sacrificar para continuar a ser primeiro-ministro.

A opinião dos técnicos deu lugar à agenda ideológica e a discordância passou automaticamente a desobediência. Por isso não interessa nada que o SEF tenha razão nos aviso que fez: a lei que permite autorização de residência com “promessa de contrato de trabalho” faz disparar os pedidos de visto no SEF. Só entre 11 e 18 de Setembro, deram entrada 4.073 novos pedidos de visto.

O que conta é ter alguém naquele lugar que equilibre as contas do deve e haver de António Costa com aqueles que viabilizam o seu governo.

Não duvido por isso que nos próximos tempos assistiremos ao afastamento de vários quadros da administração pública e à crucificação mediática de algumas instituições e pessoas. Nem vai ser necessário manifestar discordância como fez a ex-directora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Basta por exemplo questionar a razoabilidade da obrigatoriedade agora instituída para as empresas com sete ou mais trabalhadores – estamos a falar do café da esquina! – de implementarem um código de conduta para proibir o assédio (legislação deste tipo só pode sair da cabeça de quem nunca trabalhou a não ser no ramo do controlo da vida dos outros!) Ou por exemplo não mostrar entusiasmo na aplicação da atabalhoada mudança legislativa que legalizou as barrigas de aluguer cujo voluntarismo foi tal que agora, como lembra o antigo presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, Miguel Oliveira da Silva, as comissões de ética de diversos hospitais confrontam-se com consequências em que ninguém parece ter pensado.

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O que conta é que quanto menos ganham nas urnas, mais o BE e o PCP exigem em contrapartida a Costa.

Tudo isto leva-me a uma pergunta: como acabará o governo de António Costa? Não, não estou a falar sobre os cenários possíveis para o momento da ruptura – virá esta a tempo de António Costa ser candidato às próximas presidenciais? Vão os maoistas e os trotsquistas aglutinados no BE usar a estratégia adoptada em Novembro de 1975 por Cunhal e deixar pendurados na rua os camaradas de há minutos?

Mas não, não é isso. Ou não é apenas isso. Independentemente do final do governo de António Costa passar por estes ou outros cenários, a realidade é muito mais complexa e leva-nos a uma pergunta que nunca tem uma resposta tranquilizadora: como é que a extrema-esquerda vai deixar o poder?

É dos manuais a agressividade que os radicais mostram quando percebem que podem chegar ao poder: como esquecer o nível chocarreiro que em Novembro de 2015 atingiu uma exasperada Catarina Martins que a cada minuto em que Cavaco Silva não indigitava Costa como primeiro-ministro via um obstáculo entre si mesma e o poder?!

Mas ensinam também os manuais e a vida que a tenacidade desses mesmos radicais redobra quando temem perder o poder. Por isso não posso deixar de sorrir quando constato que o país publicado acredita que um belo dia António Costa ou o PS se poderão desembaraçar facilmente destas funestas companhias. Ou porque já não precisam delas. Ou porque as trocam por Assunção Cristas ou Rui Rio, agora que Passos saiu de cena.

Desde que nos idos de 2015 vingou em Portugal a tese da vacina que não lia tal dislate ou produto da má fé. Para quem não recordar a tese da vacina lembro que sustentavam os autores da mesma que Costa devia ser primeiro-ministro quanto antes apesar de ter perdido as eleições porque assim mais rapidamente os portugueses ficariam esclarecidos sobre os desmandos da extrema-esquerda. Os autores desta tese sanitario-política esqueciam ou não queriam lembrar que se a extrema-esquerda é eficaz na hora de conquistar poder é ainda mais aguerrida na hora de o defender: mal se viram senhores da situação, os donos da indignação e da rua retiraram-se dos piquetes, pararam de gritar, deixaram de sentir fome e já têm dinheiro para medicamentos. De ambulâncias não precisam mesmo quando estas estão paradas. A cada dia aumenta o preço do silêncio que viabiliza o sucesso de Costa. E que faz dele um líder carismático e ganhador, Que todos os dias anuncia um plano e repõe direitos.

Como sairemos disto? Provavelmente com uma fuga em frente. Uma fuga que a precipitada saída de Passos veio tornar possível. Que fuga é essa? A regionalização. Costa quer fazê-la e graças a ela espera prolongar a sua vida como vencedor. Rio também aposta na regionalização e espera que ela o reforce enquanto líder.

A regionalização não resolve nenhum dos problemas que já temos e cria outros que bem podíamos dispensar.

PS. O processo-golpe que está a ter lugar na Catalunha é um bom exemplo de como as velhas tácticas dos radicais se adaptaram aos novos tempos: a sua presença nas instituições não serviu para os tornar tolerantes mas sim para mais eficazmente imporem os seus ditames de uma forma que os votos que receberam nunca permitiria. A outra conclusão a tirar de tudo aquilo que está a acontecer em Espanha é que quando o centro perde o rumo crescem os radicais. O que está a acontecer em Espanha só é possível porque o PSOE se entregou nas mãos dos que gostavam de ser o Podemos. Assim, o mesmo país que venceu a ETA graças ao Pacto de Ermua, que uniu socialistas e populares no combate aos terroristas, agora não consegue uma estratégia comum para tratar de Puigdemont na Catalunha.