Recapitulemos o que consta sobre o assassino de Orlando. As redes sociais mostram-no em poses narcisistas; a ex-mulher lembra um marido misógino, violento e pouco religioso; os colegas de trabalho retiveram a sua propensão para o racismo e a homofobia. O que é que um indivíduo assim procurou no jihadismo? Muito provavelmente, a adrenalina da transgressão e o poder sobre os outros. Teria o jihadismo a mesma atracção para este viciado em selfies se consistisse em movimentos derrotados?

O jihadismo tem certamente complexas histórias regionais na Ásia e em África. Mas do ponto de vista dos seus recrutas ocidentais – 4000, segundo algumas estimativas –, “jihadi cool” é um ângulo relevante. Para milhares de jovens como Omar Mateen, a guerra santa não é a experiência religiosa da tradição, mas a possibilidade de encarnar o matador do jogo de vídeo, o vilão do filme de super-heróis, o mauzão do gangsta rap. A jihad proporciona-lhes selfies imponentes, e não é por acaso que os jihadistas ocidentais deixam rastos tão grandes nas redes sociais. Como se combate um fenómeno destes? Não é argumentando: é privando-o de coolness. É associando-o à impotência e à futilidade. É por isso que a sua derrota militar é fundamental.

Não é possível, a menos que o Ocidente realize finalmente o pesadelo policial de Orwell, controlar toda a gente e prevenir todas as iniciativas. É necessário dissuadir os potenciais recrutas da jihad. Mas isso não se faz pelo expediente de discursar solenemente sobre a democracia, ou ensinar tolerância nas escolas. Tudo isso irá apenas acumular-se na pilha de coisas que o jihadista despreza. Ser mal visto é algo que o jihadista suporta bem. O que ele não suportará é fazer figura de falhado.

A Al-Qaeda deixou de ser cool quando Bin Laden foi morto. Porque o jihadi cool só funciona com carrascos impunes na brutalidade com que, de bandana e cartucheira, desafiam todos os poderes e passam todos os limites. No Médio Oriente, segundo uma sondagem recente, a simpatia juvenil pelo Estado Islâmico – sempre minoritária — diminui. Por horror aos seus crimes? Certamente, mas também por horror aos seus insucessos no campo de batalha. A derrota estraga todas as marcas.

Há demasiada gente no Ocidente convencida de que o jihadismo é uma reacção às injustiças do planeta, e de que, portanto, será preciso corrigir a última imperfeição do mundo, antes de conseguir disputar recrutas ao califa. Mas Omar Mateen, misógino, racista e homofóbico, não parece o tipo de jovem idealista pressuposto por essa teoria. Talvez não seja preciso tanto esforço para mudar o mundo. Quando os combatentes do Estado Islâmico não tiverem tempo para degolar e tirar selfies, por estarem demasiado ocupados a fugir e a esconder-se, não haverá provavelmente tantos Omar Mateen disponíveis para matarem ou para se fazerem explodir em nome do califa.

Mas qual é a probabilidade de as potências ocidentais se empenharem na humilhação militar da jihad em África e na Ásia — numa campanha que servisse, não para inaugurar democracias, não para levantar Estados, mas para demonstrar decisivamente que os jihadistas estão destinados a perder? A reacção ao massacre de Orlando não permite ilusões. Se os políticos americanos não conseguem sequer chegar a um acordo acerca do problema, que insistem em definir em termos rigorosamente paroquiais (a venda de armas?, os imigrantes?), como esperar que se entendam sobre uma solução? Ninguém se atreverá a ir além da esporádica operação de drones. Para uns, porque mais do que isso seria imperialismo; para outros, porque as populações locais não merecem. Haverá, assim, que continuar a confiar nos labirintos das guerras regionais para reduzir o Estado Islâmico e os seus clones. Os selfies da jihad não vão acabar tão depressa.

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