As posições e promessas de António Costa nos últimos tempos apontam para um regresso ao passado e não auguram nada de bom. Talvez por se sentir pressionado pelo desconforto interno na ala mais à esquerda do PS pelo (relativamente) centrista relatório “Uma década para Portugal”, António Costa tem-se precipitado numa sucessão de promessas irrealistas e, em alguns casos, irresponsáveis. Sugerir facilidades ao virar da esquina e piscar o olho a alguns dos grupos de interesses com maior peso mediático pode ser uma táctica compreensível se tivermos em conta as dificuldades de afirmação de António Costa como candidato credível a primeiro-ministro, mas são práticas que fazem temer o pior para o período pós-eleitoral.

Neste âmbito, talvez as afirmações mais gravosas tenham sido as feitas relativamente à intenção de bloquear a privatização da TAP, já que não só aumentam a incerteza do processo em curso como prejudicam objectivamente os interesses do Estado português. Ainda assim, do ponto de vista da carga demagógica, a promessa dirigida aos funcionários públicos de repor o horário das 35 horas semanais não fica atrás das declarações sobre a TAP.

Na mesma linha de promessa de facilidades sem sinais de preocupação com os respectivos impactos económicos e sociais, António Costa apontou para a reposição imediata de quatro feriados e reforçou a intenção de aumentar substancialmente o salário mínimo. Mas talvez o mais sinistro indício de regresso ao passado por parte da actual liderança do PS tenha sido o lamentável episódio do SMS enviado por António Costa a João Vieira Pereira, director-adjunto do jornal Expresso, que não pode deixar de fazer recordar o pior das práticas de José Sócrates no que diz respeito ao relacionamento com a comunicação social.

Do lado da maioria, talvez pelas responsabilidades governativas, a situação não é tão gritante, mas ainda assim acumulam-se também ao longo dos últimos meses práticas e sinais preocupantes. Para destacar apenas alguns dos mais graves, basta recordar por exemplo o puro rentismo da nova lei da cópia privada com aprovação forçada pela maioria (mesmo contra o veto presidencial), o galopante saque fiscal “verde” ou a incapacidade governamental manifestada até agora para resistir aos interesses instalados e abrir caminho de forma inequívoca ao funcionamento em Portugal da Uber.

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Conjugando todos estes elementos, fica a imagem de uma triste realidade, resumida de forma arguta por Carlos Guimarães Pinto:

“Durante 3 anos o país foi governado pela Troika. Em 2011 era um país que crescia pouco, estava muito endividado e que se continuava a endividar rapidamente. Três anos depois, o país continuou endividado, mas a dívida (privada e pública) começou a baixar e o país a crescer um pouco mais. Um ano depois da saída da Troika, os partidos do costume já voltaram (de forma mais ou menos transparente) a prometer o tipo de medidas que nos levou à situação de 2011. É um embaraço para nós eleitores e para a classe política em geral que a Troika tenha gerido melhor o país numa situação difícil do que qualquer partido o teria feito. Um ano depois da saída da Troika, é esta a triste lição.”

Se a tendência dos últimos tempos se mantiver, o filme que se perspectiva para depois das legislativas é uma sequela em tons cinzentos do que conduziu ao pedido de resgate em 2011. Tal como acontece na maioria das sequelas, o filme arrisca-se a ser de ainda pior qualidade do que o original, mas num aspecto não devem restar dúvidas: o final será muito semelhante. Caso venha a ser colocado em prática, o guião do regresso ao passado será uma receita para o desastre depois das próximas legislativas.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa