Desta vez, o terrorismo atingiu São Petersburgo num dia em que Putin, Presidente da Rússia, se encontrava de visita à segunda capital do país e à sua terra natal. Um desafio que Moscovo não quer ligar à sua intervenção na Síria, embora tudo aponte para isso.

O chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov ficou indignado e considerou “cínicas” e “vis” as tentativas de alguns órgãos de informação e de alguns “funcionários do Pentágono” de ligarem o acto terrorista em São Petersburgo uma vingança pela política da Rússia na Síria.

“Considero que isso, em geral, é indigno de políticos e espero que, na situação actual, quando o terrorismo ameaça todos os países sem excepção, não haja padrões duplos, os políticos devem manifestar responsabilidade neste sentido”, frisou ele.

Ora, como é sabido, os atentados terroristas, não acontecem por acaso e sem razão e, por conseguinte, é necessário determinar os autores e os objectivos. A julgar pelo que já foi apurado e anunciado pelas autoridades russas, a acção em São Petersburgo foi obra de extremistas islâmicos. O autor, sendo cidadão da Rússia, é originário da Quirguízia, país da antiga URSS onde a maioria da população é muçulmana. Além disso, são cada vez conhecidos factos que ligam o jovem a grupos extremistas internacionais, nomeadamente aos que combatem na Síria.

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A aviação russa tem realizado numerosíssimas operações contra grupos que combatem o regime de Bashar Assad, incluindo o DAESH, e, não obstante todos os desmentidos de Moscovo, os bombardeamentos provocam graves “danos colaterais”. Também não é segredo para ninguém que os grupos extremistas sírios tentam recrutar combatentes entre as comunidades muçulmanas que vivem na Rússia.

Na Síria, do lado da oposição combatem vários milhares de guerrilheiros que vieram da Rússia e de antigas repúblicas soviéticas onde a população muçulmana é maioritária. Muitos regressam a casa bem treinados e com sede de vingança.

Nas ruínas da União Soviética surgiram vários Estados onde a maioria da população é muçulmana. Depois da crise económica, social e política que atingiu e atinge países como a Quirguízia, Uzbequistão, Tadjiquistão, milhões de habitantes foram à procura de trabalho e de melhor vida nas grandes cidades russas.

A esmagadora maioria está ocupada em trabalhos difíceis como construção civil, limpeza de ruas, casas, etc., tendo dificuldade em integrar-se na sociedade russa. No fundo, tal como em França ou na Bélgica, os grupos extremistas recrutam militantes também entre esses imigrantes.

Se a versão da ligação do acto terrorista de São Petersburgo à actuação da aviação russa e da intervenção de Moscovo em geral na Síria é “cínica” e “vil”, como afirma Lavrov, coloca-se a questão: qual será a verdadeira razão?

Será que têm razão aqueles que afirmam que o acto terrorista foi realizado pelos serviços secretos para afastar a atenção dos russos da luta contra a corrupção ou contra as dificuldades económicas e sociais no país?

Será que têm razão os que dizem que tudo foi organizado para justificar a tomada de medidas repressivas mais duras contra a oposição e travar a onda de protesto iniciada a 16 de Março com as manifestações em Moscovo e noutras cidades russas?

Não ouso acreditar que o cinismo do Kremlin tenha ido ainda mais além do que o comentário do seu ministro dos Negócios Estrangeiros. Mas não seria má ideia investigar porque é que a segurança do metropolitano de São Petersburgo falhou, como foi possível, com tantas câmaras de vigilância e detectores de metais, um terrorista colocou duas bombas em duas das estações centrais. Será que o que deveria ter sido investido na modernização dos sistemas de segurança no metro, foi desviado para outros lados?

Ao envolver-se cada vez mais na guerra na Síria e noutros conflitos no Médio Oriente e no Norte de África, Vladimir Putin sabia que iria sujeitar todo o seu país a novos perigos, principalmente ao terrorismo islâmico, por isso não se compreende as declarações do ministro Lavrov.