1. Para uma pessoa de direita e pró-americana, como eu, a presidência de Trump é dolorosa. Demasiado dolorosa. Apesar de todas as explicações, a questão central não desaparece: como foi possível um indivíduo como Donald Trump chegar à Casa Branca? Ao contrário de outros, não acho que Trump seja uma ameaça existencial para a democracia americana. As comparações com o presidente russo, Putin, são disparatadas. Vêm de mundos completamente diferentes. Trump era um empresário do ramo imobiliário. Putin veio dos serviços de inteligência soviéticos. Trump não tem experiência política. Putin está na política russa desde a década de 1990. Trump não entende o mundo nem a tradição da política externa Americana. Putin conhece muito bem as relações internacionais e tem uma estratégia diplomática para a Rússia. Os tiques autoritários de ambos ajudam a criar a confusão. Mas também aqui há diferenças fundamentais. Trump revela o autoritarismo de um “self-made” empresário que detesta ser contrariado, mas preside um país com uma antiga e forte tradição democrática e liberal. Putin é um ditador sem escrúpulos num país sem tradições democráticas e sem instituições fortes.
Trump é no entanto perigoso para os Estados Unidos. Como presidente comporta-se como se ainda estivesse à fente das suas empresas. Rodeia-se de familiares e de amigos e não admite ser contrariado. Confunde os seus interesses empresariais com a presidência do seu país. Não respeita a independência das autoridades judiciais, tem sido incapaz de construir uma relação eficaz com o Congresso, ameaça a independência da Reserva Federal e trata os serviços de informação como se fossem a sua segurança privada. Ainda não consegui notar nada de positivo desde que se mudou para Washington. Trump não goza das competências mínimas para ser presidente dos Estados Unidos. Uma desgraça. Como pergunta o editor da “Bloomberg Businessweek”, “você contrataria Trump para dirigir a sua empresa?” Julgo que, depois de pouco mais de três meses na Casa Branca, ninguém o faria.
Os republicanos estão perante uma escolha entre duas más opções. Se continuam a apoiar Trump, tudo pode acontecer. Internamente, atropelos de todo o tipo às regras fundamentais da democracia americana. Externamente, decisões perigosas para a segurança internacional e prejudiciais para a economia global. A maioria dos republicanos não consegue aceitar o protecionismo comercial de Trump, nem a diplomacia errática em relação à Russia e à China. Quatro anos de Trump podem causar danos muito graves à economia e à diplomacia norte americana. Mas antes disso, Trump pode causar uma derrota ao partido republicano nas eleições de 2018 para o Congresso.
A outra opção, para os republicanos, será apoiar o impeachment contra Trump. Juntar-se aos democratas para depor Trump, seria uma decisão muito difícil para o partido republicano. Mas poderá ser inevitável. As consequências, contudo, serão imprevisíveis, sobretudo para a economia global. Ninguém sabe como reagiriam os mercados a um processo de impedimento contra o presidente americano. Mas pelos sinais que temos e pelas discussões entre as instituições financeiras, os mercados provavelmente reagiriam de um modo negativo. Os líderes europeus, apesar da antipatia que sentem contra Trump, estão nervosos com a possibilidade de um impeachment nos Estados Unidos. Sabem que o processo poderia prejudicar a economia europeia, logo agora que dá sinais de recuperação.
2. A segunda maior democracia do hemisfério ocidental, o Brasil, conhece uma nova grave crise política, depois do impeachment contra Dilma Rousseff há menos de um ano. O novo presidente, Michel Temer, está a ser investigado pelo Supremo Tribunal de Justiça por actos de corrupção. Temer chegou ao Palácio do Planalto há cerca de dez meses. Dificilmente celebrará um aniversário como presidente. Depois do que aconteceu no final desta semana, Temer parece condenado politicamente. O seu partido, o PMDB, começa a interrogar-se sobre a capacidade de Temer para resistir. O segundo maior partido da coligação, o PSDB, discute o fim do apoio a Temer. Neste momento, tudo indica que os partidos da maioria procuram uma alternativa a Temer. Quando a encontrarem, ele sai.
A eleição indirecta de um novo presidente no Congresso será a solução mais provável, por várias razões. A impossibilidade constitucional de realizar eleições directas é a razão mais forte. A realização de eleições presidenciais este ano exige uma emenda constitucional, a qual só poderá ser aprovada com uma maioria qualificada. Neste momento não há uma maioria no Congresso a favor da alteração da Constituição. No meio do maior caso de corrupção da história do Brasil, que afecta todos os partidos, ninguém quer eleições antecipadas.
Uma eleição directa para a presidência do país seria a solução ideal, e ainda poderá ser a única saída para esta crise. A dimensão da crise política e económica pede um presidente com uma forte legitimidade política. Essa legitimidade e essa força só se conseguem com eleições directas. Mas os partidos tudo farão para impedir essa solução. Nem Lula, à frente nas sondagens, pediu eleições antecipadas na sua primeira declaração pública desde que Temer foi acusado. Defendeu, pelo contrário, um processo de impeachment contra Temer. Os partidos brasileiros sabem que, nesta altura, quando nenhum partido escapa às acusações de corrupção, eleições antecipadas os fariam perder o controlo do processo político. Por isso, só o farão se não tiverem alternativa. Com eleições ou sem eleições directas, para bem do Brasil, Temer deveria abandonar a presidência rapidamente.