O Commerzbank, um dos bancos que nos últimos meses vinha mostrando ser um dos mais otimistas para Portugal, olhou para o programa de governo do Partido Socialista, eventualmente apoiado pelos partidos à esquerda, e decidiu escrever aos seus clientes um relatório intitulado “Portugal. A próxima Grécia?“. A conclusão? Há “diferenças importantes” a assinalar, mas o fator crucial será o Banco Central Europeu (BCE).
“Se este catálogo de medidas for aplicado, isso significará, sem dúvida, uma mudança radical na política económica, após quatro anos de reformas e austeridade”, afirma o economista Ralph Solveen. “O primeiro declínio do rácio de dívida pública, registado este ano, para cerca de 128% do PIB, poderá revelar-se um episódio esporádico”, acrescenta o analista do banco alemão no relatório a que o Observador teve acesso.
Este é o mesmo banco de investimento que há alguns meses escrevia que Portugal tinha tanto potencial económico quanto Espanha, com o bónus de que tinha menos risco político. E, antes, o mesmo banco alemão dizia que Portugal estava “a mostrar o caminho” para outros países no que dizia respeito às reformas estruturais na economia.
Perante a incerteza política com a provável queda do governo liderado pela coligação PSD-CDS, Ralph Solveen diz que um governo alternativo seria “muito instável“, pelo que deverá haver novas eleições já em 2016, antecipa o banco.
Bruxelas não irá aceitar programa do PS, diz Commerzbank
O Commerzbank olha com receio para “mudança radical da política económica” que representa o programa que deverá servir de base a uma eventual governação socialista. Mas “é difícil avaliar até que ponto estes planos irão, mesmo, ser implementados”.
“Afinal de contas, não haverá uma coligação formal entre os Socialistas e os outros partidos. E quando começar a haver discussão sobre a execução do programa, as velhas diferenças deverão ressurgir muito rapidamente”, assinala Ralph Solveen.
“O Orçamento para 2016 que ainda não foi preparado terá de ser aceite pela Comissão Europeia, o que significa que o défice orçamental ficará abaixo dos 3% pelo menos no papel“, antecipa o Commerzbank. Por essa razão, “é improvável que todas as intenções [previstas no programa] sejam concretizadas”, ou seja, o banco alemão indica que a Comissão Europeia irá forçar alterações no programa de governo.
As diferenças entre Portugal e Grécia
O Commerzbank mantém um otimismo relativo de que as tensões elevadas que existiram em relação à Grécia, desde o início de 2015, não irão repetir-se em Portugal. Porque há algumas diferenças que, na visão do banco alemão, são importantes.
“Ao contrário do que acontece na Grécia, o eventual novo governo será liderado pelo partido de centro-esquerda e apenas apoiado pelos partidos da extrema-esquerda” que, como recorda o Commerzbank, defenderam várias vezes a saída da NATO e da zona euro. Dada a posição secundária destes partidos no eventual governo, “estas exigências não deverão refletir-se em decisões políticas concretas”, acredita o Commerzbank.
Outra diferença, importante pelo menos no imediato. “Portugal não está dependente de desembolsos da troika, porque o programa foi concluído”. Ainda assim, as avaliações regulares de monitorização por parte da troika podem passar a conter críticas a Portugal, admite o Commerzbank. Além disso, há uma almofada de liquidez que ajudará a superar um possível agravamento das condições de mercado que não seja mais do que transitório, nota o banco alemão.
Crucial: O que vai fazer o BCE?
Apesar de todos os receios, mais ou menos gravosos, o Commerzbank está relativamente confiante de que os juros da dívida de Portugal não irão subir muito mais do que já têm subido nas últimas semanas. Tudo depende do que fizer o BCE, instituição que se prevê que poderá reforçar os estímulos monetários por via de mais compras de títulos de dívida pública da zona euro.
“Enquanto o BCE continuar a comprar obrigações de Portugal e garantir, implicitamente, que essas obrigações serão pagas, o risco de uma subida dos prémios de risco deverá continuar a ser limitado”, confia o banco de investimento alemão.
“As coisas podem complicar-se, contudo, se a agência de rating DBRS retirar o rating de qualidade que tem para Portugal”, diz o Commerzbank. É já na próxima sexta-feira, dia 13, que a DBRS se pronuncia, mas o banco alemão acredita que, no máximo, a perspetiva do rating pode cair para negativa, de estável, “pelo que o BCE deverá continuar a comprar”.
O Observador entrevistou há duas semanas a analista da DBRS responsável pelo rating de Portugal. Leia mais sobre essa entrevista e a perspetiva dos investidores aqui.