Cativações, aplicação da condição de recursos nas pensões não contributivas e um exercício de revisão da despesa e da receita. É assim que o Governo promete à Comissão Europeia que vai reduzir o défice estrutural no próximo ano, sendo que o nível das cativações ainda não está fechado. As receitas com o perdão fiscal, execução da garantia sobre o BPP (Banco Privado Português) e o reembolso dos CoCos (instrumentos de dívida usados para ajudar os bancos), e o encaixe que resultar da venda de ativos do Novo Banco e Banif vão servir para reduzir a dívida pública.

A Comissão Europeia publicou o relatório enviado pelo Governo com o Programa de Parceria Económica, um dos documentos que Portugal tem de produzir por se encontrar na vertente corretiva do Pacto de Estabilidade e Crescimento, onde enumera as reformas estruturais que o Governo pretende levar a cabo para corrigir os desvios nas contas públicas de forma efetiva e duradoura.

No documento, o Governo explica como pretende reduzir o défice e os riscos para essas contas, em 2016 e em 2017, e no documento uma das novidades é onde vai ser aplicado o dinheiro que espera receber com medidas como o programa de pagamento extraordinário de dívidas ao fisco e à segurança social que as Finanças apelidam de PERES (Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado).

Segundo o Governo, o PERES vai gerar cerca de 100 milhões de euros ao ano ao longo de onze anos que espera receber com este perdão fiscal vão para abater dívida pública. Em causa estão cerca de 1.100 milhões de euros, de acordo com a estimativa “conservadora” — assim foi descrita na carta de Lisboa a Bruxelas — mas cujo maior impacto deverá ser sentido ainda este ano, por via do pagamento extraordinário das dívidas com perdão de custas e juros até 20 de dezembro.

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Na conta a abater à dívida pública, também irão entrar os 450 milhões de euros da garantia do Estado dada aos bancos que financiaram o Banco Privado Português, e que o Governo espera recuperar no próximo ano, assim como os cerca de 750 milhões de euros de investimento público feito no BCP, via Cocos, e que terá de ser reembolsado em 2017. Já 950 milhões de euros de Cocos subscritos na Caixa Geral de Depósitos vão ficar no balanço do banco, como parte do plano de recapitalização. A confirmarem-se estas receitas, isto daria para abater cerca de 2300 milhões de euros à dívida pública.

O Governo espera ainda usar as receitas da venda de ativos do Novo Banco (NB) e do Banif para o mesmo fim, mas para estes ainda não há estimativa oficial de receitas.

O Banco de Portugal quer fechar a alienação do total ou de uma parte do Novo Banco até final do ano, que foi o compromisso assumido com a Comissão Europeia. Para além das ofertas vinculativas, que devem abranger 100% do capital e deverão ser entregues até 4 de novembro, o plano de venda aposta em paralelo numa segunda via que passa por vender a maioria do capital, mas não a totalidade, ao fundo chinês Minsheng Financial como o primeiro passo para a prazo se realizar uma dispersão em bolsa da instituição. O produto da venda do NB será usado pelo Fundo de Resolução para amortizar o empréstimo de 3900 milhões de euros concedido pelo Estado para financiar a recapitalização do Banco Espírito Santo.

Como se reduz o défice de 2016

Não é propriamente novo que o caminho, mas o Governo assume, uma vez mais, que para cumprir as metas exigidas por Bruxelas transformará em cortes permanentes pelo menos 445 milhões de euros que estavam cativados, ou seja, dinheiro dos orçamentos dos serviços previstos no Orçamento do Estado, mas que só podiam ser gastos com autorização do ministro das Finanças.

O objetivo? “Garantir uma correção duradoura do défice excessivo, de acordo com as decisões relevantes ou recomendações ao abrigo do procedimento por défice excessivo, implementando as medidas estruturais necessárias e usando os ganhos não previstos para reduzir o défice e a dívida”.

Como vai ser conseguido? 445 milhões de euros das cativações já garantidas, mais 666,2 milhões que ainda podem ser tornados cortes definitivos e com o congelamento aplicado às despesas com consumo intermédio (excluindo os gastos com as PPP — Parcerias Público Privadas).

Quais são os riscos para a meta? Os resultados piores que o esperado do veículo que está a gerir os ativos do Banif, Oitante, e a não concretização das concessões da Silopor (silos portuários de cereais) e IP Telecom (rede de fibra ótica da Infraestruturas de Portugal) planeadas no orçamento deste ano. Outro dos riscos em cima da mesa é menor consumo privado e inflação, que resultam em receitas fiscais abaixo do esperado. Isso já aconteceu e resta saber qual será o seu impacto total em 2016.

Como se reduz o défice de 2017

Os ingredientes usados são muito semelhantes. Para atingir a meta de redução do défice estrutural em 0,6 pontos percentuais, que Portugal acordou com a União Europeia, as cativações continuam a ser a principal arma, mas não será certamente a única, ainda que todas elas estejam por detalhar.

O objetivo? “Conseguir um ajustamento orçamental anual de pelo menos 0,6% do PIB”.

Como vai ser conseguido? Cativações transversais nos orçamentos dos Ministérios, cujo nível o Governo diz que ainda vai ser definido durante os trabalhos de discussão do Orçamento do Estado para o próximo ano. O que o Governo já está a contar é ter o contributo da aplicação da condição de recursos na atribuição de novas pensões não contributivas e também com o resultado das revisões da despesa e da receita. A revisão da despesa que o Governo vai ter de fazer, com o objetivo de alcançar poupanças permanentes para o orçamento, tem de estar pronta em fevereiro do próximo ano.

Quais são os riscos para a meta? A conjuntura externa. Só e apenas. O Governo não enumera mais um único risco ou desafio que possa colocar em causa o cumprimento da meta em causa.

Salário mínimo: Novo aumento depende da avaliação do impacto

O aumento do salário mínimo, implementado logo nos primeiros meses de governação foi uma das medidas que mais reserva suscitou nas instituições internacionais que controlam as finanças de Portugal. O Governo queixa-se aliás da perceção errada a nível internacional, que descreve como o maior desafio à implementação desta medida de reforço da competitividade.

Disto isto, um futuro aumento do salário mínimo nacional em 2017, como têm exigido as centrais sindicais, não é uma certeza para o executivo. Vai depender da discussão com os parceiros sociais e com os resultados da avaliação trimestral que tem vindo a ser feita ao impacto económico do aumento do salário mínimo para 530 euros este ano. O próximo relatório será conhecido em dezembro.