Somos grandes, sabia? Nós, os portugueses, conseguimos sempre ser do tamanho que os momentos difíceis pedem. Temos as ideias, a criatividade, temos a vontade, temos a garra, para tornar momentos difíceis em oportunidades e fazer história. Conheça três portugueses que se colocaram ao serviço do país, porque estas oportunidades estavam mesmo, mesmo, a pedi-las.

Quando Portugal precisou de vizinhos generosos, o Henrique esteve lá. Com o país prestes a encerrar-se em casa, Henrique Paranhos, mentor da plataforma de voluntariado SOS Vizinho, percebeu que o momento estava mesmo a pedi-las. O projeto foi lançado à distância e em 48 horas: a 13 de março de 2020, dias antes de ter sido declarado estado de emergência em todo o país, nascia esta plataforma de voluntariado de âmbito nacional. Sabemos que não quer regressar a esse momento, mas durante um segundo, pense no caos que vivemos nos dias que antecederam o período de confinamento. Incerteza? Sim. Receio? Sim. Filas de supermercado megalómanas que davam três voltas ao bairro? Sim. O objetivo era prático: apelava à empatia e à generosidade de cada um de nós, no meio de uma pandemia à escala global, e tão simples, como a dúvida que incomodava Henrique. Afinal, como é que os milhares de pessoas que integram grupos de risco em Portugal vão conseguir deslocar-se em segurança para adquirir bens alimentares e de primeira necessidade?

A necessidade estava lá. Da dúvida, nasceu uma ideia criativa, e da partilha dessa ideia nas redes sociais LinkedIn e Facebook, mobilizaram-se remotamente as primeiras 100 pessoas, de Norte a Sagres, que ajudaram a lançar o projeto.

“No andar, no prédio, no bairro, na freguesia. Fazemos chegar bens essenciais a grupos de risco”, lê-se na página de Facebook que marcou o arranque do projeto.

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Se o momento estava a pedir uma iniciativa destas? Henrique explica que o grande sucesso do SOS Vizinho deveu-se ao facto de existir uma necessidade por resolver. Mais recentemente, após a quarentena, começaram a surgir outras necessidades, nomeadamente no setor do turismo, que até hoje ainda é um dos mais afetados. Henrique quis dar apoio às famílias e aos negócios mais pequenos relacionados com o turismo, que noutras circunstâncias estariam a lucrar bastante devido à época alta. Daí surgiu a Outstanding Portugal, uma plataforma online que organiza, em 48 horas, uma escapadinha surpresa em território nacional, numa altura em que os portugueses são aconselhados a não viajar além-fronteiras. “Queremos levar os portugueses a conhecerem maravilhas do seu próprio país”, explica.

Este momento foi do Henrique, que criou dois novos projetos.

Quando Portugal precisou de ficar em casa (e os artistas, de apoio), o João esteve lá, e deu-nos música.

Ainda antes do estado de emergência, o setor cultural foi dos primeiros a ser afetado. Play it safe, Stay home, uma iniciativa lançada no início da quarentena por João Afonso, da promotora musical Gig Club, proporcionou uma agenda de cerca de 60 concertos grátis, caseiros, transmitidos em direto, numa altura em que os ajuntamentos eram proibidos e os eventos culturais foram cancelados em Portugal. Foi uma lufada de ar fresco ver e ouvir os melhores artistas nacionais a cantar-nos das suas casas também.

O momento, que exigiu o nosso recolhimento dentro de quatro paredes, estava mesmo a pedi-las. Não é certamente a mesma coisa do que estar ao ar livre a assistir a um concerto, ou numa sala com uma boa acústica, mas era o que precisávamos. O momento estava a pedir que a rotina da quarentena fosse quebrada, que a boa música nos entrasse casa adentro, e que a alegria de partilhar um momento musical, sozinhos ou com as pessoas com quem vivíamos, nos desse alento para continuar. Incrivelmente curado pela equipa da Gig Club, a programação do “Play it safe, Stay home” incluiu artistas como Surma, The Legendary Tigerman, Noiserv, Samuel Úria, e Valter Lobo.

O apelo solidário não foi esquecido: uma das preocupações deste projeto era ajudar os artistas a ultrapassar esta fase fragilidade e incerteza financeira, e por isso a plataforma tornou possível um sistema de doações durante as atuações em direto, que permitia o público doar uma quantia monetária, que revertia totalmente para os artistas. Mais do que uma plataforma de entretenimento, João Afonso explica que a Play it Safe quis ajudar especialmente na manutenção da saúde mental, do público e dos artistas. Aponte na agenda: para o próximo ano, espere um Festival da plataforma, bem real e ao vivo.

Este momento foi do João, que se reinventou e nos deu música solidária.

Quando Portugal precisou de soluções inovadoras para o teletrabalho, o Fernando esteve lá.

Com o confinamento, viemos para casa. Todos nós conhecemos alguém, que conhece alguém, que durante o período de quarentena repensou o local onde estava a viver — especialmente os amigos que vivem em grandes cidades e que mal podem esperar pelo fim de semana, para deixar os seus bairros movimentados e explorar regiões mais calmas, envolvidas pela natureza. Todos nós conhecemos, também, aquele amigo estrangeiro que há anos nos diz que gostava de vir para Portugal (convenhamos, temos sol, boa comida, boa disposição, e locais incríveis por explorar). Foram os efeitos da pandemia Covid-19 no interior do país que mostraram a Fernando Belezas que estava na altura de pôr as mãos à obra e mudar a perceção que o mundo tem da ruralidade portuguesa: dessa necessidade nasceu a plataforma Rural Move. Portugal estava mesmo a pedi-las. Estava a pedir uma plataforma que atraísse trabalhadores qualificados, portugueses e especialmente estrangeiros, que trabalhem remotamente, para fora dos grandes centros urbanos. No fundo, é um convite: é um convite para deixar a vida agitada da cidade e ganhar alguns anos de vida na calma do campo, onde há menos poluição e recursos mais baratos. São os voluntários da Rural Move que ajudam estes profissionais em todas as questões logísticas da mudança: ora, falamos da casa, do espaço de trabalho, das bagagens.

Este momento foi do Fernando, que viu no interior do país uma oportunidade que estava mesmo a pedi-las.

É o Henrique, é o João, é o Fernando. Eles responderam às necessidades que o momento pediu. Mas podia ser qualquer um de nós. É que quando somos chamados a fazer melhor, porque há quem precise da nossa ajuda, é aproveitar a oportunidade e fazer a diferença.

Na verdade, nós é que estamos a pedir uma grande salva de palmas, pela forma como nos tornámos do tamanho que o país precisou. Parabéns a eles, parabéns a nós, parabéns a Portugal. E brindemos, claro, com Sagres.

Saiba mais sobre o projeto “Portugal Pede Sagres” em https://observador.pt/seccao/observador-lab/portugal-pede-sagres/