O advogado que representa os proprietários de habitações no ZMar Eco Experience vai avançar com uma ação contra a requisição civil do Governo, que prevê alojar naquele espaço do concelho de Odemira doentes com Covid-19 que não tenham um local para cumprir o isolamento — como acontece a dezenas de imigrantes que trabalham naquela zona.

Segundo Nuno da Silva Vieira, em declarações à Rádio Observador, há “um vício” na fundamentação do despacho que aprova a requisição civil. Isto porque o Governo diz que esta medida foi tomada depois de não ter sido alcançado um acordo com a administração daquele empreendimento turístico, mas o advogado garante que não houve sequer discussão sobre isso.

“A requisição civil do Governo não está bem feita”, afirma o advogado.

Vieira afirma que o administrador de insolvência do espaço foi, de facto, contactado por e-mail pelo Ministério da Economia, que terá dado conta das suas intenções de ali alojar doentes com Covid-19. No entanto, o administrador terá respondido que esse plano não seria viável, uma vez que no local não existe uma plano anti-incêndio, não há sequer extintores (e as casas são em madeira) e há muito que não há funcionários a trabalhar no espaço. “Admito que a partir daí tenha havido uma ou duas chamadas, e refiro-me à parte turística”, disse.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Não vamos permitir a transferência de pessoas”. Zmar avança com processo contra Governo

É que no ZMar existem 260 casas, mas 160 são de particulares. E como a requisição civil visa todo o empreendimento há famílias que temem ser postas fora de casa, para que as suas habitações sejam entregues a doentes de Covid.

Odemira. Sem acordo, Governo avança com requisição civil do Zmar, mas proprietários dizem que “ninguém vai sair das suas casas”

Depois da ação que deverá ser interposta no Tribunal Administrativo, o advogado admite avançar, também, com pedidos de indemnização.

As declarações do advogado surgem depois de o presidente da Câmara de Odemira anunciar que a partir desta segunda-feira começam a ser colocados doentes com Covid-19 naquelas casas.”Nós não vamos aceitar, mas o ZMar tem 80 hectares e não podemos tapar todas as entradas”, admite o advogado, temendo que não exista sequer um plano que permita a coabitação de proprietários e de doentes, uma vez que existem zonas comuns, como as casa de banho, e, volta a sublinhar, nem existem funcionários para a sua manutenção.

Um problema de imigração antigo e uma requisição polémica. Seis respostas sobre o que se passa em Odemira

“Compreendemos que o Governo queira agir com força. Mas isso será um segundo atentado. Vamos agir em conformidade”, diz o advogado, que considera que a própria GNR terá dificuldade em agir, colocando famílias fora de casa ou “em perigo a coexistir ao lado de doentes”. “Isto é kafkiano”, considera o advogado que já este fim de semana tentou um contacto com o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, sem para já ter qualquer resposta.

Entretanto, esta segunda-feira de manhã, e sem que até ao momento se tivesse concretizado qualquer manobra para proceder ao realojamento de infetados naquele espaço, Nuno da Silva Vieira anunciou à Rádio Observador a marcação para esta tarde de uma reunião entre proprietários do Zmar, responsáveis pela gerência e Luís Menezes Leitão, o bastonário da Ordem dos Advogados, que já tinha manifestado a sua preocupação sobre a requisição civil feita pelo Governo.

“A requisição, ainda que temporária, de casas de habitação, obrigando à sua desocupação pelos proprietários para permitir a sua ocupação por terceiros”, pode vir a “constituir uma lesão de direitos humanos”, considerou este sábado o bastonário, em comunicado enviado à Lusa. À Rádio Observador, esta segunda-feira, a caminho de Odemira, Luís Menezes Leitão reiterou a preocupação com as ações iminentes que, reiterou, violam a Constituição portuguesa, desde sábado, com o fim do estado de emergência, de novo reposta. “Ninguém pode entrar no domicílio de outra pessoa sem o seu consentimento, exceto com ordem judicial”, garante o bastonário. “Ora, existindo um despacho do Governo que decreta a requisição civil de casas de habitação, isso é algo que pode colocar problemas sérios e por isso, sabendo que está um colega advogado a tratar do assunto, eu próprio combinei com ele deslocar-me a Odemira para ver a situação que está a ocorrer.”

Oiça aqui as declarações de Luís Menezes Leitão:

Ordem dos Advogados: “Requisição só é possível pela via judicial”

Atualizado segunda-feira de manhã, com a informação da reunião entre proprietários e bastonário da Ordem dos Advogados e as declarações de Luís Menezes Leitão