A presidência portuguesa do Conselho da UE teve o grande mérito de fazer avançar muitos dossiês legislativos, “fechando” mesmo alguns bloqueados há anos, considera o embaixador Pedro Lourtie, que destaca também a celebração da cimeira social.

Num balanço do semestre, o representante permanente adjunto de Portugal junto da UE considera que a presidência foi “muitíssimo bem-sucedida em todas as áreas”, ainda que em muitos casos graças a um trabalho árduo “que não está nas primeiras páginas dos jornais todos os dias”, e condicionado, sobretudo nos primeiros meses, pela pandemia da Covid-19, que forçou a que muitas negociações decorressem por videoconferência.

Apontando que cada liderança rotativa do Conselho da UE tem de lidar com muito trabalho legislativo, Lourtie aponta que “o que a presidência portuguesa conseguiu fazer nestes seis meses foi pegar nos vários dossiês em todas as áreas ministeriais e fazer avançar, e mesmo aprovar, muitos dos dossiês legislativos, alguns deles em cima da mesa do Conselho, com dificuldades negociais, há muitos anos”.

“Isto é um trabalho que se faz a todos os níveis. Fez-se a nível político, sem dúvida alguma, porque é a nível político que estes dossiês são aprovados, mas fez-se também a nível técnico, com a tentativa de propostas de compromisso que conseguissem ultrapassar as divergências que existiam, falando com todos os Estados-membros”, explica.

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Segundo o diplomata, “uma das características da presidência portuguesa” foi considerar “importantes” todos os Estados-membros, envolver os 27 nas discussões, o que na sua opinião “deu resultados muito positivos”, e é algo de que Portugal se “deve orgulhar”.

“Eu lembro-me da proposta sobre a transparência fiscal das grandes empresas multinacionais, que tinha sido apresentada em 2016 pela Comissão Europeia no seguimento do escândalo dos ‘Panamá Papers’. A presidência portuguesa conseguiu, no espaço de seis meses, uma posição do Conselho aprovada por uma maioria, e depois começar as negociações com o Parlamento Europeu e, com um espírito extremamente construtivo entre a presidência portuguesa e a equipa negocial do PE, concluir esta proposta, que será uma pequena revolução ao nível da transparência fiscal das grandes empresas multinacionais”, destacou.

Segundo o ‘número dois’ do Comité de Representantes Permanentes (Coreper) de Portugal junto da UE, “este é um excelente exemplo do tipo de trabalho” que a presidência portuguesa conseguiu fazer, “em todas as áreas”, aprovação de legislação que se aplicará a todos os cidadãos, e que faz avançar a agenda ambiental, a agenda climática, a agenda digital e a agenda social da UE”.

Este não é um trabalho que aparece de um dia para o outro, é um trabalho que tem de ser preparado. Aliás, uma boa parte deste trabalho começou a ser preparado antes da presidência”, insistiu o embaixador Pedro Lourtie.

“Começou a ser visível a agenda que íamos ter em cima da mesa, sabíamos quais eram as prioridades políticas que tinham sido definidas pelo Governo português e, com base nisso, começámos a preparar estas propostas”, apontou, voltando a dar como exemplo o trabalho preparatório que viria a permitir o acordo em torno da diretiva que obrigará as multinacionais a divulgar onde obtêm lucros e onde pagam impostos.

Uma dificuldade acrescida, admite, foi o facto de a presidência portuguesa, tal como as duas anteriores — croata, no primeiro semestre de 2020, e alemã, no segundo — ter decorrido ainda sob o signo da Covid-19, o que, “nomeadamente nos primeiros meses, obrigou a que a grande maioria das reuniões e das negociações se fizesse por videoconferência”, ainda que o comité de representantes permanentes nunca tenha deixado de se reunir presencialmente. “Foi difícil, mas acho que conseguimos ultrapassar bem essas dificuldades logísticas causadas pela pandemia”, diz.

Quanto aos grandes eventos da presidência, Pedro Lourtie elege a cimeira social do Porto como o maior momento do semestre.

Sim, do ponto de vista político não há dúvida nenhuma que foi aquele que marcou a agenda europeia e aquele que traz um traço mais distintivo da presidência portuguesa para a agenda europeia. A cimeira social o que faz é que recoloca no centro das várias políticas o pilar europeu dos direitos sociais, o plano de ação para a sua implementação, e de facto é a presidência portuguesa que faz isso com a iniciativa da cimeira social, em conjunto obviamente com o presidente do Conselho Europeu e a presidente da Comissão Europeia”, diz.

Já sobre dossiês que deixam alguma frustração, o diplomata aponta o da proposta legislativa sobre coordenação dos sistemas de segurança social. “Nós tínhamos desejado terminá-lo, mas as negociações com o Parlamento Europeu são assim, neste momento não estavam reunidas as condições, e por isso não foi possível, apesar de todos os esforços da presidência portuguesa, reconhecidos por toda a gente, Estados-membros e Comissão Europeia”, conclui.

Portugal encerra a presidência semestral do Conselho da UE na quarta-feira, 30 de junho, passando o testemunho à Eslovénia.