O ministro brasileiro da Saúde foi convidado “como académico” para uma conferência na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, escolhendo abordar o combate do Brasil à Covid-19, depois de o parlamento lhe imputar a prática de crimes.

Em comunicado publicado na página oficial da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (FMUL), na qual se citam esclarecimento do diretor da instituição, o professor Fausto Pinto, a faculdade justifica o convite ao ministro da Saúde brasileiro, Marcelo Queiroga, como sendo de âmbito académico a “um médico cardiologista, ministro da Saúde dum país amigo”.

“Vem visitar a nossa Faculdade, pelo que foi convidado, como académico, a proferir uma conferência, tendo escolhido o tema que entendeu. A Universidade será sempre um espaço aberto, sem tabus ou preconceitos”, lê-se no comunicado, publicado no site da FMUL na sequência de vários contactos da comunicação social a questionar a confirmação da presença do ministro brasileiro.

Marcelo Queiroga é um dos visados pela investigação da comissão parlamentar de inquérito que ao longo dos últimos meses avaliou falhas e omissões na ação do Governo brasileiro na gestão da pandemia de Covid-19, havendo a recomendação para que seja indiciado por dois crimes — prevaricação e epidemia com resultado de morte, sendo que neste último a moldura penal varia entre os quatro e os 15 anos de prisão, consoante se prove ou não a intenção de provocar a morte.

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A visita do ministro brasileiro a Portugal — mas também ao Reino Unido, onde se desloca para visitas às universidades de Cambridge e Oxford e outras instituições, prevendo-se também a assinatura de protocolos — foi notícia na imprensa brasileira, com o jornal O Globo a questionar a Universidade de Lisboa sobre a manutenção do convite depois de terem sido conhecidas as conclusões da investigação da comissão parlamentar de inquérito (CPI).

Marcelo Queiroga profere na próxima terça-feira, na Aula Magna da Universidade de Lisboa a conferência “As ações do Brasil no enfrentamento da Covid-19”, agendada para as 12h00.

O jornal brasileiro recorda que o governante brasileiro por diversas vezes se manifestou contra o uso obrigatório de máscara.

Refere também que a CPI concluiu que o ministro praticou os crimes referidos por ações como omissão e comportamento dúbio sobre a recomendação do uso da cloroquina, contribuindo para a desinformação da população brasileira.

A CPI da pandemia, que ao longo de seis meses investigou alegadas falhas e omissões do Governo brasileiro na gestão da Covid-19, apresentou na quarta-feira o seu relatório final, em que pediu o indiciamento do Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, por nove crimes, assim como de outras pessoas, incluindo ministros e três filhos do chefe de Estado.

A Bolsonaro foram atribuídos os crimes de prevaricação, charlatanismo, epidemia com resultado morte, infração a medidas sanitárias preventivas, emprego irregular de verba pública, incitação ao crime, falsificação de documentos particulares, crime de responsabilidade e crimes contra a humanidade.

Na véspera da apresentação do texto, foram retiradas as acusações relativas aos crimes de homicídio qualificado e genocídio contra indígenas. As propostas não receberam apoio de outros membros do comando da comissão e havia dúvidas quanto à caracterização das condutas.

O documento apresentado pela CPI deverá ser votado na próxima semana.

Face às acusações, Bolsonaro afirmou que ele e o seu Governo não têm culpa de “absolutamente nada” em relação ao agravamento da pandemia no país, que já matou mais de 603.855 mil brasileiros e infetou outros 21,6 milhões.

Organização “indignada” com convite a ministro brasileiro para conferência em Lisboa

O Coletivo Andorinha, que representa brasileiros em Portugal, manifestou esta sexta-feira “indignação” com o convite ao ministro da Saúde do Brasil. Numa nota esta sexta-feira divulgada, o Coletivo Andorinha – Frente Democrática Brasileira em Lisboa questiona a decisão do diretor da FMUL, Fausto Pinto, sobre o convite, considerando que o anúncio da conferência, “após a divulgação do relatório final da CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a pandemia da Covid-19]” causou “estarrecimento”.

Dirigindo-se ao diretor da FMUL, o Coletivo Andorinha disse que os seus membros, “como grande parte da comunidade internacional” estão “preocupados, para não dizer indignados”, com a divulgação da visita e da conferência intitulada “As ações do Brasil no enfrentamento da Covid-19”, marcada para a próxima terça-feira, na Aula Magna da Universidade de Lisboa.

Atualizado às 23h57, com reação da organização “coletivo Andorinha”.