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"Full Circle": as regras do thriller televisivo, segundo Steven Soderbergh

Este artigo tem mais de 6 meses

O realizador americano revela finalmente o seu melhor trabalho televisivo até ao momento. “Full Circle” é fruto de uma colaboração com o argumentista Ed Solomon e está disponível na HBO Max.

Claire Danes e Zazie Beetz, duas das protagonistas de "Full Circle"
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Claire Danes e Zazie Beetz, duas das protagonistas de "Full Circle"

Claire Danes e Zazie Beetz, duas das protagonistas de "Full Circle"

Hoje com 60 anos, Steven Soderbergh podia muito bem relaxar sem se entusiasmar a chafurdar em géneros. Recusa estar parado, fica-lhe bem. Também fica bem olhar para 1991, ano de “Sexo, Mentiras e Vídeo”, e imaginar o futuro que o realizador teria. Contrariando qualquer estereótipo, definiu uma certa ideia, uma certa linguagem de cinema independente e continuou por aí — com desvios, na maioria assinaláveis. E nem precisamos de falar da sua fase de Óscares, com “Erin Brockovich” ou “Traffic”. Lembremos “Ocean’s”, que relançou um género e deu-nos esperança nos sortidos de mega-estrelas na mesma produção; assinalemos a forma como inscreveu Channing Tatum num postal de homem-capaz com os melhores abdominais do cinema, ao mesmo tempo que dele fez um símbolo da crise financeira, em “Magic Mike”.

A televisão entrou mais a sério no currículo de Soderbergh há cerca de dez anos, com “The Knick”, embora antes já tivesse mexido uns cordelinhos em “Unscripted” com o seu amigo George Clooney, entre muitas outras coisas. Em “Mosaic” (2018) procurou salvar a memória de uma certa Sharon Stone com a colaboração de Ed Solomon. A dupla colou e voltaram a colaborar em “Full Circle”, série cujos dois primeiros episódios já estão na HBO Max e que chegarão em dose dupla nas próximas duas semanas. Seis episódios que formam o enredo de um policial, um thriller, com referências ao universo sobrenatural ou será que é um drama familiar? Uma incógnita, ou melhor, uma experiência.

O que a dupla Soderbergh (realização) e Solomon (argumento) faz é pegar em arquétipos de personagens e metê-los na confusão. “Full Circle” arranca como um furacão, apresenta deliberadamente informação vaga nos primeiros minutos, lança muitas personagens, cria um cenário de crise e espera que o espectador acredite que tudo o que ali está irá fazer sentido. Nas mãos de outros seria um caos, mas a dupla sabe contar histórias e executá-las. E esta fixa a atenção muito cedo, mesmo que não se esteja a perceber muito bem o tipo de informação que está a ser jorrada.

[o trailer de “Full Circle”:]

Eis o que se passa, apresentando os dados de uma forma muito simples: há alguém com a intenção de raptar um adolescente, tudo porque tal ação aparentemente criminosa irá restaurar uma certa ordem das coisas. É aqui que parecemos estar perante algo místico, mas não é o caso e importa sobretudo perceber como tudo isto irá sendo desmontado. O rapto acontece, mas raptam o miúdo errado (há toda uma série de detalhes macabros aqui). O ato falhado prolonga-se e torna-se imperativo lidar com a situação, perceber quais as razões que levaram ao rapto e ao erro, tudo com o apoio da investigação de uma dupla de polícias.

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O que parece um ensaio sobre como sobreviver a um erro — e viver depois disso — vai-se transformando num elaborado retrato da Nova Iorque atual, das diferentes culturas que ali se cruzam e  das diferentes formas de estar na cidade. Contribui para isso um vasto número de personagens que, de de início, pode parecer exagerado, mas ao terceiro episódio percebe-se que as peças vão mudando de local no tabuleiro para contar a história que realmente importa.

No elenco, Zazie Beetz, Claire Danes, Jim Gaffigan, Timothy Olyphant e CHH Pounder brilham, servem a contenção com que Steven Soderbergh filma para devolver aos ecrãs uma Nova Iorque que hoje raramente se vê: uma cidade que é só uma cidade, onde gente vive, anda e trabalha. Pode soar a coisa pouca, mas Nova Iorque é hoje mais um postal ou uma ideia que serve a ficção audiovisual: “City On Fire”, série recente da Apple TV+, alimentava-se precisamente disso, da ideia da cidade a renascer pós-11 de setembro.

“Full Circle” é a obra mais bem conseguida nesse campo em mais de uma década. Tivesse estreado antes, era bem possível que víssemos Claire Danes ou Jim Gaffigan entre os nomeados para os Emmys deste ano.

Soderbergh procurou construir uma cidade viva, uma em que as personagens possam encontrar-se. O círculo que é referido no título não é necessariamente metafórico, nem é só um círculo: há aquele que a personagem de CHH Pounder pretende reabilitar com o rapto do adolescente, mas também há aquele que a série procura ao querer dar uma história que faça sentido e que envolva todas aquelas personagens, que pouco parecem ter em comum ou algo que as ligue. O fenómeno de juntar as personagens não segue a filosofia do “ó que giro, estamos todos ligados”, antes procura satisfazer uma verdadeira necessidade do enredo da série. A rapidez do primeiro episódio cria a oportunidade para que sigamos juntando as pontas soltas ao longo dos episódios seguintes.

“Full Circle” é conceptual, tal como “Mosaic” o era. Só que, desta vez, ao entregarem-se ao thriller, Soderbergh e Solomon conseguem estruturar a história numa base mais firme: há códigos, regras de conduta, mesmo que tudo vá acontecendo por uma ordem inesperada. A ideia de lançar em blocos de dois episódios é ótima, servindo bem a estrutura narrativa dos três atos. Por exemplo, o corte de ritmo entre os dois primeiros episódios e o terceiro só faz bem para a digestão da série, sai-se da vertigem de um acontecimento limite – o rapto – para um jogo mais cerebral entre as personagens: é ao terceiro que se começa a perceber que as aparências iludem e que o rapto não era aleatório nem inocente. Se gosta do Soderbergh dos riscos, “Full Circle” é a obra mais bem conseguida nesse campo em mais de uma década. Tivesse estreado antes, era bem possível que víssemos Claire Danes ou Jim Gaffigan entre os nomeados para os Emmys deste ano.

 
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