Durante largos meses, Pepe tinha um objetivo paralelo além dos compromissos do FC Porto: conseguir uma preparação que lhe permitisse marcar presença na fase final do Campeonato da Europa. Na hora da verdade, mais uma vez lá estava ele. Quando veste a camisola de Portugal, o central torna-se quase um Super Homem que não tem limites, numa história de superação que começou há quase década e meia no Mundial de 2010. Aí, Carlos Queiroz optou por chamar 24 e não 23 jogadores, deu uma oportunidade para o jogador poder fazer uma recuperação relâmpago após ter sido operado aos ligamentos cruzados do joelho e “admitiu” que Pepe falhasse os dois primeiros encontros da fase de grupos para poder estar apto para jogar contra o Brasil e foi também titular nos oitavos diante da Espanha, ambos como médio defensivo. Foi no limite mas deu.

Pepe tem uma relação verdadeiramente especial com a Seleção. Nascido em Maceió, no Brasil, o central foi contactado em 2006 pelo então selecionador Dunga para poder ser chamado pela primeira vez à canarinha mas acabou por declinar essa abordagem como já tinha feito antes perante a possibilidade de fazer os Jogos de 2004, explicando que iria dar entrada com o processo de naturalização por Portugal. Aí, a Seleção já tinha falado com o jogador que, não esquecendo também a ajuda que teve nos primeiros tempos no país, quando foi jogar para o Marítimo, mostrou total abertura ao convite. De forma natural, depois de uma lesão que fez com que não defrontasse a Polónia, o central estreou-se pelo conjunto nacional em novembro de 2007, na qualificação para o Campeonato da Europa de 2008, diante da Finlândia (e no Estádio do Dragão).

40 anos, 40 histórias: Pepe, o central com nome de astrónomo que entre excessos fez do futebol uma ciência

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A partir daí, fase final e Pepe andaram sempre de mãos dadas. O jogador pode ter saído do FC Porto para o Real Madrid, pode de seguida ter rumado à Turquia para representar o Besiktas e pode ter voltado depois aos azuis e brancos. Pode ter conseguido várias conquistas coletivas e individuais entre outros momentos mais baixos como as lesões graves ou o castigo de dez jogos da Liga após pontapear um adversário no chão. Pode ter travado lutas complicadas com momentos mais delicados em termos físicos ao longo da época antes de chegar ao verão. O que aconteceu sempre? Recuperou. Sacrificou-se. Deu tudo. Entrou. Nos Europeus de 2008, 2012, 2016 e 2020, nos Mundiais de 2010, 2014, 2018 e 2022, na Liga das Nações de 2019. Não falhou nem uma, ficando nos momentos memoráveis que coincidiram com as conquistas de 2016 e 2019.

[Já saiu o sexto e último episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio, aqui o segundo, aqui o terceiro, aqui o quarto episódio e aqui o quinto episódio.]

Este ano, mais do que nunca (ou melhor, talvez ao nível de 2010), a presença de Pepe esteve em risco. Aliás, o central falhou algumas concentrações da Seleção já com Roberto Martínez no comando da equipa, chegando à fase final da temporada com o último encontro oficial a 21 de abril. Foi chamado na mesma, esteve a fazer um programa específico para mitigar essa falta de competição ao longo de quase um mês e meio, jogou com a Rep. Irlanda em Aveiro no derradeiro particular de preparação, sofreu uma entrada na primeira parte que deixou todos de mãos na cabeça, aguentou e seguiu mesmo com a comitiva para a Alemanha.

Depois de se ter tornado o jogador mais velho a marcar na Liga dos Campeões e a jogar uma fase a eliminar da competição (além de ter também o mais velho a marcar no Campeonato pelo FC Porto), Pepe tinha mais um recorde para bater a nível de seleções: ao defrontar a Rep. Checa na primeira jornada do Euro-2024, o defesa tornou-se o mais velho de sempre a jogar na competição, superando o recorde que pertencia ao antigo guarda-redes húngaro Gabor Kiraly (aquele que defendia sempre de calças cinzentas) e que esteve no jogo dos oitavos do Euro-2016 com 40 anos e 86 dias. Pepe tem 41 anos feitos no final de fevereiro…

O feito acaba por surgir numa altura de completa indefinição no futuro do jogador, ainda para mais depois de André Villas-Boas ter confirmado que o FC Porto não conta com o seu capitão para o futuro… como atleta. “Foi uma conversa privada, naturalmente não a queria tornar pública. O que transmiti ao Pepe, de certa forma, e que é de bom senso comum, é que todo o seu futuro está intimamente ligado ao FC Porto, seja do ponto de vista emocional ou seja até do ponto de vista profissional. Sobre a sua continuidade enquanto jogador do FC Porto, isso não irá acontecer, foram-lhe bem explicadas as razões pelas quais não poderá acontecer. No entanto, temos o máximo de respeito pela sua carreira”, assumiu em entrevista ao Now, deixando aberta a porta para outros cenários, seja numa parte mais técnica, seja mais ligado ao dirigismo.

Pepe ainda não tomou qualquer decisão nem espera fazê-lo durante este Europeu. O central sabe que os seus limites físicos estão a ser atingidos mas não colocou completamente de parte a hipótese de fazer ainda mais uma época como jogador, sendo o Médio Oriente e mais concretamente a Arábia Saudita a possibilidade mais forte nesse cenário. Em paralelo, e se decidir mesmo terminar a carreira, Pepe poderá também optar em não seguir no FC Porto, tirando um período sabático para decidir depois o melhor a fazer na vida pós-jogador, algo que já tinha sido também abordado com o ex-presidente portista, Pinto da Costa.