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Investigadores acolhem recomendação de medicamento para Alzheimer: "Grande sucesso" para a medicina e sinal de "esperança" para pacientes

Quatro meses depois de rejeitar o Lecanemab, a agência opta por uso mais restrito e recomenda a aprovação da Comissão Europeia. Poderá ser o primeiro tratamento para a doença na UE, mas tem riscos.

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Universal Archive/Universal Imag

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“É a primeira vez na história da humanidade que podemos alterar a evolução natural do Alzheimer.” É assim que Juan Fortea, cientista do Instituto de Investigação de Sant Pau (Barcelona) e autor de uma extensa pesquisa em doenças neurológicas, reage à decisão do regulador europeu do medicamento de recomendar o uso do Lecanemab para combater o Alzheimer. Há apenas quatro meses, a mesma agência tinha rejeitado o fármaco, que em testes clínicos reduziu o declínio mental dos pacientes em 27%, mas numa reviravolta decidiu esta semana recomendar o seu uso à Comissão Europeia. Se aceite, será o primeiro medicamento na União Europeia contra a doença que provoca demência.

A comunidade científica e médica está a celebrar a decisão. “Fiquei muito feliz por terem reconsiderado”, admite Juan Fortea ao Observador. O investigador defende que, ainda que não seja uma cura para o Alzheimer, é um “primeiro passo” na luta contra a doença e deve ser “acolhido como um grande sucesso para a medicina”: “Não estou a exagerar.” É também uma fonte de esperança para os pacientes, diz, explicando que muitos já lhe perguntam pelo medicamento e que, por esta altura, ainda é preciso gerir as expectativas.

Os pacientes já nos perguntam pelo medicamento e é preciso ajustar as expectativas. Mas traz esperança. É a primeira vez que alteramos a história natural da doença”, destaca.

Se a recomendação da Agência Europeia do Medicamento (EMA, na sigla em inglês) for aceite pela Comissão Europeia e amplamente adotada pelos Estados-membros, o Lecanemab apenas será usado para tratar doentes numa fase inicial de Alzheimer. Além disso, só estará disponível para pacientes que possuam uma ou nenhuma cópia do gene ApoE4, que está associado ao início mais precoce da doença. Isto porque, como mostraram os ensaios com o fármaco, quem possuiu duas cópias deste gene tem maior probabilidade de sofrer efeitos secundários graves, como inflamação cerebral e hemorragia.

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Rob Howard, professor na University College London, antecipa por isso que para já não serão muitos os pacientes a receber este medicamento na UE. “O tratamento provavelmente só terá benefícios nos estágios iniciais da doença e muitos pacientes interessados descobrirão que a sua doença está muito avançada para terem hipóteses de tratamento”, reconhece o investigador do Reino Unido, onde o fármaco foi aprovado este verão em condições muito semelhantes às recomendadas pensadas para a UE.

Benefícios na abrandamento da doença “superam” os riscos

A recomendação do Comité de Medicamentos Humanos da EMA à Comissão Europeia foi tornada pública esta quinta-feira. É uma evolução face à decisão de julho, em que rejeitaram o uso do fármaco da Eisai-Biogen numa população alargada de pacientes na fase inicial de Alzheimer. “Primeiro, consideraram os ricos e benefícios em todos os pacientes com a doença. Aqueles com duas cópias do gene ApoE4 pareciam ter menos benefícios do tratamento”, recorda Rob Howard.

Esse grupo acabou por ser excluído no processo de decisão que levou à recomendação do fármaco. Para os restantes pacientes com Alzheimer, que mostrem um declínio cognitivo leve e em fases iniciais, a agência reconhece que “os benefícios no abrandamento da progressão dos sintomas da doença superam os riscos”.

“Esta decisão dá esperança aos milhões de doentes da União Europeia e às suas famílias que aguardavam por uma opção de tratamento eficaz”, afirmou na quinta-feira a responsável de desenvolvimento da Biogen, Priya Singhal, citada pela agência Reuters.

Juan Fortea foi um de vários investigadores que imediatamente se mostraram contra a decisão inicial da EMA. “Sentimos que, sim, a eficácia era modesta, mas simultaneamente robusta e que os efeitos secundários eram geríveis“, sublinha. Por essa altura, o Lecanemab (comercializado como Leqembi) já estava a ser usado em países como os Estados Unidos, Japão, China e Israel.

O fármaco foi desenvolvido em conjunto pela Biogen (Estados Unidos) e a Eisai (Japão) e ajuda a eliminar as placas de beta-amilóide, uma proteína que ao acumular-se no cérebro leva à perda de neurónios. Em 2022, num ensaio clínico com 1.795 pessoas de diferentes países e que se prolongou durante um ano e meio, conseguiu reduzir a velocidade do declínio mental dos doentes com Alzheimer. A quebra foi de 27%, quando comparada com os doentes que receberam um placebo. A diminuição foi descrita como “modesta”, mas ainda assim histórica, uma vez que, até esse momento, todas as investigações para curar, tratar ou retardar o Alzheimer tinham falhado.

Nova esperança para doentes com Alzheimer. Medicamento reduz quase 30% do declínio nas capacidades mentais

O cientista do Instituto de Investigação de Sant Pau destaca que, desde que os resultados foram apresentados, foi possível aprender muito mais sobre o fármaco. “Agora, há milhares de pessoas que receberam o medicamento nos Estados Unidos e no Japão”, destaca, referindo que os resultados de novos estudos nessas populações que foram apresentados há duas semanas na conferência Clinical Trials in Alzheimer’s Disease, em Madrid, são promissores.

“Foi reconfortante ver que na vida real, nos EUA e Japão, não tivemos mais problemas de segurança do que nos ensaios clínicos. É que havia a preocupação de que ao trazer isto para a prática clínica poderíamos ter mais problemas”, explica.

Mais consultas, análises e exames. E também custos

Quando surgiram os primeiros resultados do Lecanemab, o fármaco foi considerado um avanço significativo. “Parece importante e histórico. Isto vai encorajar-nos a sentir um otimismo real de que, um dia, a demência poderá ser derrotada e até curada”, reconhecia Rob Howard já em 2022, em declarações à SkyNews. Ainda assim, há vários desafios associados ao medicamento a superar, destaca agora o professor da University College London ao Observador.

Por um lado, os riscos de inflamação cerebral e hemorragia, que ainda assim são mais comuns em pacientes com os dois genes ApoE4, tornam necessária “uma monitorização mais próxima”, destaca. Na prática, significa que podem ser necessárias mais consultas médicas, mais análises ou exames, como ressonâncias magnéticas, o que exige uma maior resposta dos hospitais. Isso, explica, traduz-se numa segunda consequência: os custos.

Patients With Alzheimer's Disease In Hangzhou

VCG via Getty Images

“Não são só os custos farmacêuticos ou os custos do medicamento, é toda a infraestrutura que é preciso construir”, corrobora Juan Fortea. O investigador espanhol acrescenta que há a preocupação de que os custos médicos com a doença aumentem de forma dramática“.

Se for concedida uma autorização de introdução no mercado, há também toda uma questão burocrática ao nível dos Estados-membros da UE. Decisões sobre os preços e comparticipações serão definidas por cada país tendo em conta a sua realidade específica. Uma tarefa que, alertam os investigadores ouvidos pelo Observador, será desafiante.

A recomendação da EMA surge ano e meio depois da aprovação do Lecanemab nos Estados Unidos. O regulador norte-americano, porém, optou por um uso mais alargado e permite o tratamento em doentes com dois genes ApoE4. O Reino Unido tornou-se no verão o país mais recente a aprovar o fármaco, excluindo essa população, como a UE deverá fazer.

Para Juan Fortea, este é um claro sinal do atraso na UE. “Há um grande risco de ficarmos para trás no desenvolvimento de medicamentos e na luta contra o Alzheimer”, avisa. O investigador espanhol defende que é preciso apostar mais na investigação, agora que entramos no “século XXI da neurologia”. “Se olharmos para áreas como a oncologia, há cerca de 40 anos estavam na posição em que estamos hoje, a começar com fármacos modestos e com vários efeitos secundários. Os tratamentos evoluíram e mais de metade dos cancros podem ser curados”, refere.

O investigador não tem dúvidas de que o mesmo vai acontecer no campo das doenças neurodegenerativas, incluindo o Alzheimer. “Estamos apenas no início e a minha expectativa é a de que nas próximas décadas seja possível mudar o prognóstico destas doenças”, sublinha.

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