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epa10993260 Portuguese president of far-right party Chega, Andre Ventura, speaks at the opening of the 'Identity and Democracy' public meeting in Lisbon, Portugal, 24 November 2023.  EPA/TIAGO PETINGA
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André Ventura admitiu publicamente apoiar Gouveia e Melo e não esconde a admiração pelo almirante

TIAGO PETINGA/EPA

André Ventura admitiu publicamente apoiar Gouveia e Melo e não esconde a admiração pelo almirante

TIAGO PETINGA/EPA

Chega começa a arrepender-se de apoio a Gouveia e Melo

As posições assumidas pelo almirante no passado foram sendo repescadas e começam a causar urticária aos dirigentes do Chega. Sem Passos, com um militar hostil e com Ventura no banco, tudo se complica.

Com Pedro Passos Coelho aparentemente fora da corrida à sucessão de Marcelo Rebelo de Sousa, André Ventura vai alimentando a tese de que Henrique Gouveia e Melo pode ter o perfil ideal para ser apoiado pelo Chega. Percebe-se porquê: a farda do almirante (que representa, no fundo, as ideias de ordem, rigor e autoridade) pode provocar um certo fascínio junto de parte do eleitorado do Chega, sensível à ideia de que é preciso pôr o país na “ordem” e corrigir aquilo que os “políticos” de “sempre” não são capazes de corrigir. Mas a ideia de apoiar Gouveia e Melo está muito longe de ser consensual no partido — sobretudo quando vão sendo recuperadas publicamente algumas das opiniões já assumidas pelo militar.

À cabeça, o facto de Gouveia e Melo já se ter afirmado como sendo do “centro pragmático“. Ou os sucessivos recados contra “certas forças políticas que advogam soluções muito simplificadas mas que podem ser perigosas“. Ou ainda os avisos repetidos contra a ascensão dos “extremismos”. Estas posições estão a provocar alguma urticária no Chega e não causaram boa impressão no núcleo mais próximo de André Ventura. Os dirigentes do Chega ouvidos pelo Observador continuam a querer pagar para ver e, até lá, as ordens são para temperar os ânimos e perceber se Gouveia e Melo merece ou não o apoio do Chega.

Para já, há no partido quem tenha tirado a pinta a Gouveia e Melo e vá sugerindo que o almirante está a preferir as “velhas ideias” para tentar chegar a “todo o lado” em vez de perceber o que “está a acontecer no mundo e na Europa”. “As ideias dele são de um velho discurso que está gasto. Basta ver o que aconteceu nos Estados Unidos com Donald Trump. Gouveia e Melo está com o discurso do centrista, um discurso que funciona cada vez menos”, defende um dirigente do partido. “Não basta ser um tipo alto, que conduziu uma operação logística e fingiu que deu um murro na mesa com o caso da fragata.”

Ventura admitiu "admirar" o almirante, mas tudo isto pode mudar se "Gouveia e Melo continuar a desenvolver muito uma conversa de centrismo". "Não será o que o eleitor do Chega quer. Optar por fazer um discurso centrista e de ressurreição de Freitas do Amaral já não faz sentido. Um discurso 'rigorosamente ao centro' já não serve"

“Não tem lógica apoiar alguém que é contra o Chega”

A ideia de ter um militar de novo em Belém começou por agradar a vários dirigentes do Chega e foi várias vezes assumida por André Ventura. Não só porque uma hipotética vitória de Gouveia e Melo podia ser capitalizada como uma derrota do “sistema”, mas também porque o perfil do militar agrada seguramente a uma parte do eleitorado do partido. Além disso, Gouveia e Melo foi surgindo cada vez mais destacado nas sondagens e isso não é de somenos — ninguém gosta de apostar no cavalo errado.

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Porém, o tal perfil de Henrique Gouveia e Melo, que chegou a ser visto como sinónimo de um certo tipo de conservadorismo que o Chega poderia apreciar, vai motivando algumas reservas à medida que vão sendo recuperadas algumas das posições já assumidas pelo militar. Nas entrevistas que deu nos últimos anos, o ainda Chefe de Estado-Maior da Armada foi deixando algumas sugestões sobre o que pensa e como se posiciona politicamente que, devidamente analisadas, colidem frontalmente com a agenda do Chega.

As reflexões de Gouveia e Melo foram compiladas e refletidas por jornais como o Expresso ou o Diário de Notícias e deixaram vários membros do núcleo mais próximo de André Ventura de pé atrás. Desde logo, o facto de renunciar à grande família da direita: quando desafiado a situar-se politicamente, Henrique Gouveia e Melo não hesitou em descrever-se como alguém do “centro pragmático“, assumindo ser “numas coisas mais à esquerda e outras mais à direita”.

O mesmo almirante chegou a defender, numa entrevista ao Correio da Manhã, que “tem de haver uma classe média forte, para afastar as pessoas dos extremismos“. Ao Diário de Notícias, Gouveia e Melo acrescentou ser “perigoso” haver “certas forças políticas que advogam soluções muito simplificadas e que podem ser muito atraen­tes em termos mediáticos, mas que podem ser perigosas depois em termos de execução”. O militar nunca falou do Chega em concreto, mas é para todos evidente que pensava no partido de André Ventura como o exemplo daquilo que é preciso combater e contrariar.

“A fazer fé nos resumos desse artigos, e se alguns daqueles pensamentos ficarem comprovados quando começar a posicionar-se publicamente, as coisas complicam-se um bocado”, reconhece uma fonte ouvida pelo Observador. “Não tem lógica apoiar alguém se defender o contrário do que o partido defende em várias questões e em algumas das nossas principais bandeiras”, assinala-se. Aliás, os artigos em causa até apanharam alguns dirigentes de surpresa, apesar de serem um resumo de afirmações que já tinham sido feitas no passado. “Antes dessa história, diria mesmo que era uma boa aposta, agora não sei, vamos ter de esperar para ver.”

A mesma fonte próxima de Ventura explica que Gouveia e Melo começou por ser encarado como uma possível “hipótese” se a opção estratégica encontrada fosse “apostar num candidato que não fosse do partido”. Ora, tudo isto pode mudar se “Gouveia e Melo continuar a desenvolver muito uma conversa de centrismo“. “Não será o que o eleitor do Chega quer. Optar por fazer um discurso centrista e de ressurreição de Freitas do Amaral já não faz sentido. Um discurso ‘rigorosamente ao centro’ já não serve”, explica.

Mais do que isso, mesmo que a “independência e equidistância” até possa ser vista “com bons olhos” por alguma parte do eleitorado e até por responsáveis do partido, comenta outro alto dirigente, é “evidente” que há temas a ser tidos em conta, que vão desde a imigração, às vacinas e a questões sociais. Os posicionamentos que vai mostrar podem “influenciar” e disso não há dúvida. Ainda assim, no núcleo duro há quem ainda esteja crente que Gouveia e Melo “não se vai afastar do Chega” ou “quanto muito pode não se colar” — o que dependendo do pensamento e da forma como se vier a posicionar pode ser suficiente, mais ainda se as opções escassearem.

Dentro desse mesmo núcleo próximo de Ventura há quem tenha mesmo acreditado que esta podia ser a solução certa, que Gouveia e Melo captaria o eleitorado do Chega se aparecesse com um discurso a dizer “vamos meter isto na ordem“, que a “Presidência da República não serve só para tirar selfies ou que o país está a ir num mau caminho”. Ora, continua o mesmo dirigente do Chega, insistir num discurso sobre centro-moderado “não só faz comichão ao partido, como aos eleitores em geral”.

“É tempo de comparar as opções. Com Passos fora e se o almirante não for aquilo que pensávamos vamos ter de repensar. O ideal seria arranjar um candidato que desse para apoia. O contrário seria queimar a imagem de André Ventura. Não havendo mesmo mais ninguém… [Avança Ventura] em último caso”, nota um elemento do núcleo mais próximo do líder

Vacinas, o “handicap de sempre” do almirante

Tudo somado, se for de facto este o registo de Gouveia e Melo, será difícil ao partido apoiar o almirante. Aguarda-se, no mínimo, uma leitura mais fina das palavras do militar e das próximas entrevistas do ainda Chefe de Estado-Maior da Armada para perceber o que realmente pensa Gouveia e Melo. Sobre imigração, por exemplo, o discurso do militar está longe de estar inteiramente alinhado com o de Ventura.

Na já citada entrevista ao Correio da Manhã, Gouveia e Melo disse que Portugal “precisa de uma política de atratividade para desenvolver a economia” e “uma política humanitária para receber aqueles que estão em muitas dificuldades no resto do mundo”. “A questão é o que é que o almirante vai dizer sobre a entrada de pessoas no nosso país. Nós queremos uma imigração regulamentada e Gouveia e Melo? É isso que quer ou quer manter a política das portas escancaradas?”, devolve um dirigente do Chega.

À ideia do “centro programático” e às dúvidas sobre a posição na imigração, soma-se um tema sensível: as vacinas. Gouveia e Melo ficou reconhecido depois de ter liderado parte do processo de vacinação durante a pandemia de Covid-19. Mas há uma parte do eleitorado do Chega que sempre se assumiu anti-vacinação. O partido olha para isso de várias formas, mas o tema sempre foi visto como uma dificuldade teórica em justificar um apoio à candidatura Gouveia e Melo.

“Sempre foi o handicap do almirante”, reconhece um destacado dirigente do Chega, ainda que tenta desdramatizar com um “vale o que vale”. “Sabemos que no partido há algum eleitorado anti-vacinas e para essas pessoas o almirante é a personificação das vacinas. Contudo, sabemos que é militar e que se limitou a cumprir ordens, o que pode servir de argumento”, explica a mesma fonte, sublinhando que essa percentagem do eleitorado — os antivacinas — talvez seja pequena e que não pesaria assim tanto na decisão de o apoiar.

No mesmo dia em que falou na possível candidatura de Passos, Ventura colou-se a Gouveia e Melo

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Foi Ventura que falou em Gouveia e Melo

Para lá da questão das vacinas, há um sinal importante que o partido de André Ventura aguarda com redobrada atenção: o posicionamento de Gouveia e Melo face a um eventual apoio Chega à sua candidatura. É preciso perceber se o almirante é mais um a traçar um cordão sanitário em relação a Ventura. “Nesta fase, um candidato tratar o Chega como outro qualquer partido já é positivo”, vai notando fonte do Chega ao Observador.

Mas a tentativa de Ventura em colar-se a Gouveia e Melo é há muito uma evidência. No dia em que Pedro Passos Coelho apresentou o livro “Identidade e Família”, André Ventura fez questão de estar presente e de abrir caminho para um eventual apoio à candidatura do antigo primeiro-ministro. Nesse mesmo dia, sem meias palavras, o líder do Chega reconheceu que Passos “reúne condições como poucos para ser candidato a Presidente da República”. Todavia, Ventura não ficou por aí. “Há outros nomes que também se têm perfilado e que são nomes a ter em conta, como é o caso do almirante Gouveia e Melo”, fez questão de acrescentar o líder do Chega.

Criado o facto político, André Ventura não mais deixou de falar de Gouveia e Melo como eventual hipótese para o Chega. Excluída a hipótese de apoiar um “candidato do sistema“, como é o caso de Luís Marques Mendes, como Pedro Passos Coelho a ser insistentemente dado como autoexcluído de qualquer corrida presidencial, solução Henrique Gouveia e Melo começou a ganhar mais força. Mais do que isso: em entrevista à CNN, o líder do Chega chegou a confessar ter “alguma admiração” por Gouveia e Melo.

Apesar de tudo, só existe uma figura que recolheria um consenso praticamente generalizado no Chega: Pedro Passos Coelho, de quem Ventura não se cansa de repetir de que é “amigo“. Um dos destacados dirigentes do Chega ouvidos pelo Observador comenta mesmo que o antigo primeiro–ministro seria uma “hipótese sólida e séria” que eliminaria praticamente por completo a opção de o Chega avançar em nome próprio. “Não diria o mesmo sobre o almirante Gouveia e Melo. Nem pouco mais ou menos”, faz questão de frisar a mesma fonte.

Há uma parte do eleitorado do Chega que sempre se assumiu anti-vacinação. O partido olha para isso de várias formas, mas o tema sempre foi visto como uma dificuldade teórica em justificar um apoio à candidatura Gouveia e Melo. “Sempre foi o handicap do almirante”, comenta um dirigente do Chega

Ventura pode ser última hipótese

Não é o cenário ideal para o Chega, mas pode mesmo ter de acontecer. André Ventura tem repetido que está “muito focado em ser primeiro-ministro” e não tem demonstrado especial interesse em voltar a ser candidato à Presidência da República. Mas a verdade que é se o almirante der um chega para lá a Ventura e se Pedro Passos Coelho de facto ficar fora da corrida, o Chega terá de encontrar uma solução — e Ventura não tem sido particularmente feliz em inventar candidatos, como se viu nas eleições europeias ou nas últimas autárquicas.

O exigente calendário eleitoral dos últimos anos obrigou os partidos a meses de estrada, pelo que no Chega se dispensava entrar numas eleições para fazer número quando o foco é mesmo fazer oposição ao Governo de Luís Montenegro. Mais a mais, uma fonte próxima do líder do Chega entende que o “ideal” para o partido seria arranjar um candidato alternativo que evitasse desgastar, mais uma vez, a imagem de Ventura.

“É tempo de comparar as opções. Com Passos fora e se o almirante não for aquilo que pensávamos vamos ter de repensar. O ideal seria arranjar um candidato que desse para apoia. O contrário seria queimar a imagem de André Ventura. Não havendo mesmo mais ninguém… [Avança Ventura] em último caso”, explica um dirigente do partido. Sem Passos, com Gouveia e Melo a fugir do Chega como o diabo foge da cruz, o plano A e B vão à vida. Há sempre o plano original — Ventura —, mas o bom senso manda poupar o líder. Baralhando e dando de novo: o Chega pode ter de começar a pensar num novo plano para Belém.

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