Uma hora a falar sobre “Jesus, Natal e merdas…”, em que Alberto João Jardim é retratado como tendo uma “mentalidade de merda”, onde se classifica os críticos da despenalização da morte assistida de “incompetentes” e “pouco inteligentes” ou onde se dedicam alguns minutos a discutir, em tom de graça, várias práticas sexuais usando figuras religiosas, como Virgem Maria ou Jesus Cristo. A coprotagonista deste podcast, Mónica Freitas, é a nova parceira política do Governo PSD/CDS na Madeira.

A recém-eleita deputada pelo PAN, além de fundadora da Associação Womaniza-te, é coautora do podcast, Masturbador Virtual“. Num desses episódios, um especial de Natal, Mónica Freitas diz que Alberto João Jardim tem uma “mentalidade 100% ultrapassada”, refere-se aos que se opõem à eutanásia como “pessoas não inteligentes” e usa linguagem explícita para se referir a práticas sexuais com figuras de presépio.

Confrontada pelo Observador com as declarações que fez durante a gravação do referido episódio, Mónica Freitas diz que o podcast serve para “desmistificar ideias, quebrar tabus e falar com tons de ironia e humor” e frisa: “É um projeto de discussão de ideias, entre duas pessoas, onde nada é tabu”.

“Acham que a Virgem Maria teve um orgasmo?”

Depois de alguma especulação, esta terça-feira foi formalmente anunciada a nova aliança que permitirá a Miguel Albuquerque governar a Madeira com maioria absoluta. Além do CDS (coligação pré-eleitoral), os sociais-democratas tiveram de assinar um acordo parlamentar com o PAN, representado precisamente por Mónica Freitas.

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Aos 27 anos, a assistente social no Instituto de Segurança Social da Madeira mantém um podcast,, ao lado de Filipe Silva, cujo objetivo é ter “dois jovens à conversa sobre sexualidade, igualdade de género, e outros temas sem quaisquer tabus”. No episódio já referido, os dois protagonistas teorizam, por exemplo, sobre a vida sexual de Jesus Cristo e Maria e discutem o que fariam e como fariam se tivessem oportunidade.

Noutro momento da conversa, Filipe Silva diz que Alberto João Jardim, a quem se refere como o “gajo” ou erradamente como “Adalberto Jardim”,  tem uma “mentalidade de merda“. Referindo-se a um comentário que o ex-presidente do Governo Regional da Madeira tinha feito sobre o Pride (um evento comunitário e associativo LGBTI+), Filipe Silva atira: “Quando tens um gajo com esta influência dizer isto são steps back (passos atrás no progresso, em português)”.

“Ya”, começa por concordar Mónica Ferreira. “Há bué pessoal que acha que para seres presidente deves ser uma pessoa com alguma idade porque supostamente é sinónimo de experiência, bagagem profissional… Acho que somos comandados por velhos e já chega. A mentalidade deles está 100% ultrapassada, não vão mudar de mentalidade tão cedo e embora sejamos um país de velhos não precisamos de ser comandados por velhos”, remata.

A conversa vai evoluindo e tocando vários temas. Mónica Freitas chega sublinhar que existe uma “total falta de empatia” por parte de quem é contra a morte medicamente assistida. “Os argumentos usados contra são estúpidos, não são pessoas inteligentes que mereçam gerir este país. Vamos admitir que existem muitos incompetentes onde não deviam estar”, argumenta a deputada do PAN.

Recorde-se que os partidos com quem o PAN vai agora assinar um acordo de incidência parlamentar são maioritariamente contra a despenalização da eutanásia. Ainda que a direção do PSD tenha dado liberdade de voto aos seus deputados na Assembleia da República, Luís Montenegro sempre defendeu um referendo. Miguel Albuquerque, por sua vez, ainda foi mais definitivo: “A lei da eutanásia é inconstitucional”. O CDS é frontalmente contra a eutanásia.

Quem é Mónica Freitas?

Aos 27 anos, Mónica Freitas é a recém-eleita deputada que devolveu ao PAN o lugar que havia sido perdido no Parlamento da Madeira (o partido tinha conquistado um representante em 2011, quatro anos depois candidatou-se em coligação e falhou a eleição em 2019). Depois de Miguel Albuquerque ter ficado a um deputado da maioria absoluta, o PAN tornou-se num trunfo para que a coligação PSD/CDS consiga governar (já que preferiu o partido animalista e ambientalista à Iniciativa Liberal).

Nascida em 1995, é licenciada em Serviço Social pela Universidade de Coimbra. Em entrevista ao Diário de Notícias da Madeira, descreveu-se como detentora de um “espírito muito ativista”, o que a levou a participar “desde muito cedo em vários projetos e programas, não só a nível nacional como internacional”.

Além de ter participado num projeto chamado Girl Effect, que começou na Madeira, em 2014, e ao qual deu seguimento em Coimbra, em 2015, Mónica Freitas fundou, em 2018, a Associação Womaniza-te, que intervém em áreas como a igualdade de género, a violência no namoro/doméstica, a violência de género, a linguagem neutra e inclusiva, o consumo sustentável, os direitos humanos e objetivos de desenvolvimento sustentáveis.

Chegou ao PAN em 2021 por convite e foi eleita deputada graças a uma crise interna que afastou o cabeça de lista Joaquim Sousa e promoveu a número dois. Oficialmente, o partido justificou a decisão com uma “incompatibilidade” dentro da estrutura regional, sem esclarecer qual, e que levou à intervenção da liderança nacional — com Inês Sousa Real a optar por Mónica Freitas a um mês e meio do ato eleitoral.

O objetivo do PAN de eleger um deputado foi cumprido, mas acabou por ir mais longe com a possibilidade de influenciar a governação através do acordo com incidência parlamentar assinado com a coligação PSD/CDS. Durante a campanha, o partido apresentou várias propostas para “pessoas, animais, natureza e autonomia”, com medidas concretas para cada um dos “diferentes problemas da região”.

O que propõe o PAN para a Madeira?

O PAN defendeu a implementação de programas de habitação para jovens em risco de pobreza e a reabilitação de espaços públicos inutilizados para Centros de Juventude, propôs a criação de uma Comissão de Proteção à Pessoa Idosa e a construção e reabilitação de mais lares e residências, um reforço das medidas de apoio a mães e pais trabalhadores com filhas ou filhos com deficiência ou doença crónica ou oncológica e o aumento da licença para assistência a filhos e a redução do tempo de trabalho.

Foi a votos também para a defesa de uma estratégia regional contra todas as formas de discriminação e intolerância e uma gestão mais eficaz da rede de casas de abrigo destinadas às vítimas de violência doméstica e aos seus filhos, mas também sugeriu a implementação de programas específicos na comunidade escolar, voltados para professores e alunos do 1.º ano ao 12.º ano, e a criação de WC privados sem discriminação de género em edifícios públicos.

Na Madeira, e com foco nos animais, o PAN apresentou medidas para alargar a tutela penal a todos os animais sencientes, reforçar o quadro sancionatório, suspender a compra e venda de animais de companhia enquanto existirem para adoção, implementar programas de vacinação gratuita e reduzir o IVA aplicado à alimentação e cuidados médico veterinários.

Ainda antes de ser cabeça de lista do PAN às regionais da Madeira, um comunicado da comissão política do partido na região, da qual Mónica Freitas faz parte parte, criticou Miguel Albuquerque, dizendo que o líder do PSD/Madeira “manifestamente não tem” responsabilidade de Estado.