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Magnitude 8.9 Earthquake And Tsunami Devastate Northern Japan
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Central nuclear de Fukushima Daiichi depois do sismo e tsunami de 2011

DigitalGlobe via Getty Images

Central nuclear de Fukushima Daiichi depois do sismo e tsunami de 2011

DigitalGlobe via Getty Images

Fukushima: Japão vai libertar águas radioativas da central nuclear no oceano Pacífico. O que está em causa?

Especialistas dizem que a contaminação será mínima, mas os pescadores estão preocupados o negócio e as pessoas com a segurança alimentar. Ambientalistas dizem que o oceano já tem pressão suficiente.

A 11 de março de 2011, ainda de madrugada em Portugal, um sismo de magnitude 9 na escala de Ritcher — uma das maiores alguma vez registadas — atingiu o nordeste do Japão. O tsunami que se seguiu matou mais de 18 mil pessoas e destruiu a central nuclear de Fukushima Daiichi, naquele que foi considerado o maior acidente nuclear desde Chernobil, em 1986.

Em janeiro deste ano, o Japão anunciou que vai começar a libertar as águas radioativas tratadas no oceano Pacífico e têm-se sucedido as manifestações populares e críticas por parte dos países vizinhos, como a China e a Coreia do Norte. Mas a Agência Internacional de Energia Atómica (IAEA, na sigla em inglês) manifestou apoio ao plano japonês, dizendo que as medidas tomadas pelo país estão “de acordo com os padrões de segurança internacional” e terão um “impacto radiológico insignificante na população e no meio ambiente”. Afinal, o que está em causa com estas descargas?

epa10308364 Director General of the International Atomic Energy Agency (IAEA) Rafael Mariano Grossi attends a press conference during an IAEA Board of Governors meeting at the IAEA headquarters of the UN seat in Vienna, Austria, 16 November 2022. The regular IAEA Board of Governors meeting takes place from 16 to 18 of November 2022.  EPA/CHRISTIAN BRUNA
Credibilidade e confiança dependem na disponibilização de informação. E isso é o que esta página da IAEA dedicada à monitorização [da descarga] vai fornecer.
Rafael Grossi, diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atómica (IAEA)

Como se processará a descarga das águas da central nuclear?

Tendo em conta os protestos e insegurança demonstrados pela população no Japão e nos países vizinhos, o diretor-geral da IAEA, Rafael Grossi, explicou, num vídeo, como se processará a descarga das águas tratadas e como será monitorizada essa descarga. Em comunicado, a agência disse que vai acompanhar em permanência as condições de segurança associadas ao processo, que poderá demorar décadas.

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As descargas, que tiveram início esta quinta-feira pelas 13 horas locais (5 horas em Lisboa), podem ser monitorizadas em tempo real na página da IAEA, com base nos dados fornecidos pela empresa que gere a central de Fukushima Daiichi, a Tokyo Electric Company Holdings, Incorporated (TEPCO). Existem seis pontos de monitorização onde uma luz verde ou vermelha indicará se os níveis estão dentro dos padrões de segurança ou não. O interesse em monitorizar os níveis de radiação gama prende-se com o facto de os raios gama terem uma grande capacidade de penetração e, por isso, causarem danos significativos nos seres vivos.

O primeiro posto de controlo funciona, mais ou menos, como detetores de radiação que nos habituamos a ver nos filmes e documentários e que vão apitando mais rápido à medida que nos aproximamos da fonte de radiação. A medida deste detetor indicará quantos decaimentos foram contados em cada segundo, ou seja, quantos átomos se desintegraram, emitiram radiação e foram captados pelo detetor. Este tipo de medição voltará a ser realizada no sexto e último posto de controlo, antes da descarga no mar.

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A segunda estação de monitorização mede a velocidade, em metros cúbicos por hora, a que a água de descarga corre pelas tubagens antes de ser diluída pela água do mar que entra no sistema para esse efeito. O terceiro e quarto controlos medem, respetivamente, a intensidade de radiação (como no primeiro controlo) da água do mar e o fluxo a que a água do mar entra no sistema. Para se ter uma ideia, às 16 horas (em Lisboa) de quinta-feira, o caudal da água de descarga era de 19 metros cúbicos por hora e o da água que entrava do mar para diluição era de 15.147 metros cúbicos por hora (equivalente a 15 milhões de litros por hora).

Japan’s Tokyo Electric Power Company is transmitting data from various points of the controlled discharge of ALPS-treated water into the sea.

Esquema simplificado do processo de descarga das águas da central nuclear de Fukushima, com indicação dos pontos de controlo (I a VI) e respetivas medições às 16h00 de Lisboa, de 24 de agosto de 2023

Adriana Vargas Terrones/IAEA

O processo de diluição que serve sobretudo para minimizar o impacto do trítio, um isótopo radioativo de hidrogénio (3H) que não é possível eliminar pelos métodos de tratamento existentes. No quinto posto de controlo é medida a concentração deste elemento que o Japão espera que esteja sempre abaixo dos 1.500 becquerel por litro — 207 Bq/l, às 16 horas. “Esta concentração está muito abaixo do limite de concentração de 60.000 Bq/l estabelecido pelo regulador japonês para as descargas e dos 10.000 Bq/l constantes nas orientações de qualidade da água potável da Organização Mundial da Saúde”, refere o site da IAEA.

A água tratada já diluída fica num tanque até ser transportada ao longo de um tubo de um quilómetro que descarregará a água dentro do limite de proteção, uma área com 1,5 quilómetro de raio onde a pesca está proibida desde a construção da central, que ficou completa em 1971.

Porque é que as águas precisam de ser descartadas?

Aquando o sismo de 2011, três dos seis reatores nucleares estavam fora de atividade para manutenção e os outros três foram desligados imediatamente depois do terramoto. Apesar de desligados, o arrefecimento destes reatores tinha de continuar, o que foi conseguido com recurso a geradores de emergência. O problema foi o tsunami, que os muros da central nuclear não conseguiram travar e cujas ondas desligaram os geradores de emergência. Os três reatores derreteram com o calor que ainda emanava do sistema, houve explosões, a água que estava dentro da central, o oceano e o ambiente circundante ficaram contaminados com elementos radioativos.

Depois do incidente, a central nuclear de Fukushima Daiichi cessou a atividade a título permanente. A empresa TEPCO tem desde então tentado conter a contaminação radioativa, eliminar a radioatividade existente e desmantelar aquela que era uma das maiores centrais nucleares do mundo em segurança. Mas para dar continuidade ao processo precisa de eliminar mais de um milhão de toneladas de água contaminada.

Está previsto que, no início de 2024, a central nuclear deixe de ter capacidade de armazenamento para toda a água proveniente da chuva, água subterrânea e água usada para arrefecer os reatores nucleares, que já atingiu um total de 1,33 milhões de toneladas de água (cerca de 500 piscinas Olímpicas). Se a água não for retirada de forma controlada, pode haver haver fugas acidentais dos tanques, alertaram o governo japonês e a empresa.

Aldeia na zona perigosa de Fukushima aberta mais de 11 anos depois do acidente nuclear

A área circundante tem sido gradualmente descontaminada e considerada segura: dos 1.650 quilómetros da província de Fukushima que ficaram inacessíveis depois do acidente nuclear, apenas 337 quilómetros quadrados permanecem inabitáveis. Mas as descargas de água, assim como o desmantelamento completo da central, deverão prolongar-se por várias dezenas de anos.

Como é que as águas são tratadas?

Depois do desastre de 2011, que expôs os núcleos radioativos dos reatores da central nuclear, todas as águas que entram em contacto com os destroços ficam contaminadas com elementos radioativos e são armazenadas em tanques — e é a capacidade destes tanques que está a atingir o limite.

Mesmo antes de serem armazenadas, as águas são sujeitas a um processo de filtração (ALPS, Advanced Liquid Processing System) que elimina a maior parte da contaminação radioativa: 62 radioisótopos, ou seja, átomos com núcleos instáveis e que libertam energia radioativa. Os filtros têm materiais aderentes que retêm estes elementos radioativos com exceção do trítio — um átomo de hidrogénio que, em vez de um protão no núcleo, tem um protão e dois neutrões.

ALPS is a pumping and filtration system, which uses a series of chemical reactions to remove 62 radionuclides from contaminated water. However, ALPS is not able to remove tritium from the contaminated water.

As águas contaminadas são filtradas no sistema ALPS antes de serem armazenadas

METI & TEPCO/IAEA

O trítio é um isótopo relativamente raro, mas existe naturalmente no ambiente devido à colisão dos raios cósmicos com as moléculas presentes na atmosfera. O trítio tem um tempo de meia vida de 12,32 anos, ou seja, qualquer quantidade de trítio será reduzida a metade nesse espaço de tempo — por comparação, o isótopo de urânio-235 usado nas centrais nucleares para produzir energia tem um tempo de meia vida de 700 milhões de anos. Adicionalmente, o trítio não consegue penetrar na pele e só constitui perigo para os humanos se inalado ou ingerido em doses elevadas, refere a IAEA.

A água tritiada (3H2O) é tecnicamente muito difícil de separar da água normal (H2O), especialmente quando em muito baixas concentrações. Por isso, a sua descarga no ambiente já é efetuada por outras centrais nucleares com regularidade, esclarece a IAEA. “A maioria das centrais nucleares de todo o mundo libertam no ambiente, rotineiramente e com segurança, água tratada contendo baixas concentrações de trítio e de outros radioisótopos, como parte de suas operações normais.”

“Gostaria de reiterar que a libertação de trítio das instalações nucleares para os cursos de água foi e é realizada em todo o mundo, sem qualquer evidência de implicações ambientais ou para a saúde humana”, disse Tony Hooker, diretor do Centro para a Investigação, Educação e Inovação em Radiação da Universidade de Adelaide (Austrália), citado pelo Science Media Center (SMC) do país.

Quais são os riscos?

A Agência Internacional de Energia Atómica tem acompanhado a preparação da libertação das águas de Fukushima desde que esta ideia foi lançada, em 2021. A agência criou um grupo de trabalho multinacional e, em julho desde ano, divulgou um relatório em que considerava que as descargas iriam cumprir as normas de segurança internacionais, assegurando que as descargas controladas e graduais no oceano, conforme planeadas, teriam um impacto mínimo no ambiente e nas pessoas.

“O principal problema com a libertação das águas tratadas é que soa mal. Mas efetivamente não é”, disse Nigel Marks, professor de Física e Astronomia na Universidade Curtin (Austrália), citado pelo SMC Austrália. “Descargas semelhantes aconteceram em todo o mundo ao longo de seis décadas e nada de mal alguma vez aconteceu.” O professor usa um exemplo: o oceano Pacífico terá 8.400 gramas de trítio, enquanto a central de Fukushima libertará o equivalente a 0,06 gramas por ano. A quantidade de trítio ingerida através de peixes e mariscos capturados ao largo da costa, seria uma quantidade equivalente a uma dentada numa banana, acrescenta.

Governo japonês garante que descargas de água da central de Fukushima “são seguras”

A dose faz o veneno e este vem em doses mesmo muito pequenas, como lembra Gerry Thomas, antigo conselheiro da IAEA em relação a Chernobil e Fukushima, num comentário enviado ao SMC Reino Unido. O trítio estará altamente diluído, muito abaixo da recomendação da OMS para a água potável, e mesmo esta recomendação é muito cautelosa, diz: “Há cada vez mais evidências de que estes níveis baixos de radioisótopos não têm efeitos prejudiciais para a nossa saúde, nem afetam as outras criaturas que habitam o nosso planeta”.

Gerry Thomas apresenta um exemplo: “Beber dois litros de água contaminada ao nível mais alto permitido pela OMS todos os dias durante um ano resultaria numa dose de 0,1 milisievert [unidade que mede o impacto da radiação ionizante], aproximadamente o equivalente a duas semanas de radiação natural que acontece, normalmente, em muitos países”.

O Ministério da Economia, Comércio e Indústria (METI) do Japão também tem reforçado que o trítio, em baixas concentrações, está presente na natureza, tal como na água da torneira, na chuva e no corpo humano, e que a quantidade descarregada no mar pela central será 40 vezes inferior ao limite máximo legal estabelecido pelo governo japonês para a água potável. Na verdade, há mais trítio na chuva de um ano do Japão do que aquele que será libertado no mar no mesmo período.

"O governo japonês e a IAEA podiam ter transformado uma situação desafiante numa oportunidade para explorar e desenvolver melhores abordagens aos desastres nucleares do que o despejo nos oceanos."
Roberto Richmond, diretor do Laboratório Marinho de Kewalo na Universidade do Havai

Porque é que se contesta a medida do governo japonês?

Um dos argumentos usado contra a descarga das águas tratadas da central nuclear é de que o trítio bioacumula na cadeia alimentar, ou seja, cada animal acumularia toda a concentração de trítio existente nos animais que ingeria e os animais no topo da cadeia alimentar, como os humanos, seriam os que mais acumulariam esse elemento radioativo. Mas Garry Thomas, antigo professor de Patologia Molecular no Imperial College de Londres, afirma que “não há evidência científica que prove” esta alegada bioacumulação.

“Quem se opõe à descarga sugeriu alternativas irrealistas e reuniu uma série de contra-argumentos, mas nenhum deles resiste ao escrutínio científico”, acusa Nigel Marks, que antes trabalhou para a Organização Australiana de Ciência e Tecnologia Nuclear (ANSTO). O professor reforça que a descarga no oceano é a única opção exequível.

Roberto Richmond, diretor do Laboratório Marinho de Kewalo na Universidade do Havai, não partilha desta opinião e critica a decisão tomada pelo governo japonês e apoiada pela IAEA, num comentário ao SMC Austrália. “Ambos podiam ter transformado uma situação desafiante numa oportunidade para explorar e desenvolver melhores abordagens aos desastres nucleares do que o despejo nos oceanos.” Para o biólogo, a decisão “viola o espírito da Década do Oceano e o recentemente aprovado Tratado para Proteger o Alto Mar, [ambos] das Nações Unidas, bem como os direitos das comunidades indígenas do Pacífico”.

A Greepeace do sudeste asiático também critica a decisão de despejar as águas num ecossistema já de si frágil e sujeito a muitas pressões, acusando o processo de filtração de falhas, conforme cita o jornal The Guardian. Shaun Burnie, especialista da organização ambientalista, diz que se trata de uma violação dos “direitos humanos das pessoas e comunidades de Fukushima, de outras províncias vizinhas e de toda a região Ásia-Pacífico”.

Protestos em Tóquio e importação de marisco proibida pela China após libertação das águas residuais da central nuclear de Fukushima

A China, que já não importava peixe e mariscos de algumas zonas do Japão por causa do acidente de 2011, agora anunciou a proibição de todas as importações de alimentos marinhos japoneses. Hong Kong, que também é um importante comprador de peixe e marisco japoneses também se opõe às descargas e vai condicionar a importação dos alimentos.

A Coreia do Sul também tinha deixado de comprar peixe e mariscos nas regiões do Japão mais afetadas pela contaminação causada pela destruição da central. Recentemente, o governo sul-coreano passou a aceitar a ocorrência das descargas, algo que não é bem visto nem pelos partidos da oposição, nem pela população, que se mostram preocupados com a segurança alimentar.

As comunidades de pescadores do Japão também estão contra a descarga de água da central nuclear. Masanobu Sakamoto, que coordena a Federação Nacional de Associações Cooperativas de Pesca, diz que, ainda a descarga possa ser cientificamente segura, os danos reputacionais podem ser enormes. Para compensar estes danos ou quaisquer perdas financeiras, o governo japonês preparou um pacote de ajuda de 30 mil milhões de ienes (cerca de 190 milhões de euros), de acordo com a agência de notícias Kyodo.

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