No princípio (março) eram as filas. Longas filas à porta de super e hipermercados para encher a despensa perante a grande incerteza que acompanhou o confinamento obrigatório e geral. Aos poucos, com a saída do estado de emergência e o regresso à “nova normalidade”, as filas foram reduzindo, mas ao Observador, a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) garante que essa redução não se deveu a um relaxamento das medidas de segurança, que, assegura, estão a ser cumpridas. “Não só há um controlo como estamos a instalar mecanismos eficazes como colocar semáforos à porta dos estabelecimentos para sinalizar sobre a lotação”, diz o diretor-geral da APED, Gonçalo Lobo Xavier.
No primeiro fim de semana em que grande parte dos super e hipermercados têm de fechar até às 13h00, as cadeias de distribuição não descartam o regresso de filas mais longas e dos ajuntamentos superiores ao normal à porta de algumas lojas — foi esse, aliás, o argumento que levou o Pingo Doce a chegar a anunciar a abertura das lojas às 6h30 (depois recuou). Garantem que vão manter o controlo do distanciamento e de lotação máxima — e nalguns casos haverá um reforço das equipas. Ao Observador, a GNR e a ASAE também já disseram que não vão baixar a guarda e que se podem esperar ações de inspeção nos próximos dias para garantir que as regras estão a ser cumpridas.
Mas como tem sido até aqui? O Observador pediu balanços tanto à ASAE como ao Ministério da Administração Interna (MAI) relativos ao números de inspeções e contraordenações aplicadas em super e hipermercados. Os dados fornecidos apenas permitem ter uma ideia do cumprimento (e incumprimento) das regras na generalidade dos estabelecimentos comerciais — o que incluiu não só super e hipermercados, mas também restaurantes, bares, cafés, entre outros.
Agora sem “equívocos”: o que posso ou não fazer no fim de semana?
Segundo os dados do MAI sobre a atuação da PSP e da GNR, entre o início de outubro e 3 de novembro (período durante o qual vigoraram os estados de contingência e de calamidade), o número de multas aplicadas pelo incumprimento das “regras de ocupação, permanência e distanciamento físico nos locais abertos ao público” mais do que duplicou (para 119) face a setembro (45). Ainda assim, longe das contraordenações de julho (203). Os dados não permitem, porém, concluir se o maior número de multas está ligado a uma intensificação das ações de fiscalização, nem quais os tipos de estabelecimento mais visados.
Já a ASAE remeteu para os dados divulgados em outubro e que permitem concluir que, numa operação efetuada em período de calamidade, foram fiscalizados 1.288 operadores e instaurados 46 processos de contraordenação. Desses processos, 23 estiveram relacionados com o incumprimento das regras da DGS, devido à ocupação, permanência e distanciamento físico nos locais abertos ao público, assim como à falta do uso de máscaras ou viseiras para acesso ou permanência nos espaços e estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços. Mais uma vez, não é possível especificar a que estabelecimentos, concretamente, dizem respeito as contraordenações.
Quer a ASAE, quer a GNR vão continuar a fazer ações inspetivas. Ao Observador, a GNR diz que “continuará a desenvolver a sua atividade operacional” e que o patrulhamento será “orientado para a visibilidade policial nos locais de maior circulação e propícios ao ajuntamento de pessoas, bem como os que normalmente são alvo de ações de fiscalização, como os estabelecimentos comerciais“.
Campanhas prolongadas ou equipas reforçadas. Como se preparam os hipers para as novas restrições
Ao Observador, Gonçalo Lobo Xavier diz não ter conhecimento de contraordenações aplicadas a super e hipermercados e assegura o cumprimento das regras. “Há seguranças ou colaboradores que contabilizam, muitas vezes de forma discreta, o número de clientes que entram” nas lojas, afirma. A APED tem pedido um aumento do limite de lotação permitida nos estabelecimentos comerciais, que atualmente é de cinco clientes por 100 metros quadrados, “o rácio mais baixo da Europa”, assegura.
Embora critique medidas que, como a que começa a ser aplicada este sábado em vários concelhos, limitam os horários de abertura — porque “provavelmente, levará a maiores aglomerados de pessoas” — Lobo Xavier saúda que se tenha chegado ao compromisso de antecipar em duas horas, para as 8h00, a abertura dos estabelecimentos comerciais. E adianta que “a maioria dos retalhistas” têm “estendido os dias de campanhas” promocionais, para que não se concentrem nos próximos dias, motivando ajuntamentos.
O Observador contactou várias cadeias de distribuição para perceber se vão ser tomadas novas medidas neste e nos próximos fins de semana para fazer face às novas restrições. Dos que responderam, só a Auchan admitiu abertamente esperar uma afluência “maior”, pelo que vai fazer um “reforço de equipa”. Já o controlo das entradas e saídas será “como tem sido feito até aqui: através da equipa de segurança no local e do Centro Nacional de Segurança da Auchan que, através de um sistema central interno de vigilância, garante que a ocupação máxima das lojas é respeitada, assim como o cumprimento das regras de segurança”.
O Lidl também diz que o controlo não vai sofrer alterações — é feito com a ajuda de um “contador automático de presenças, que indica se é possível entrar ou não”. Nas lojas sem esse contador, o controlo, assegura fonte oficial, é feito por um segurança. No El Corte Inglés há igualmente um “sistema automático de controlo do número de entradas e saídas” que “permite, em cada momento, saber exatamente o número de pessoas que se encontram no nosso espaço”. “O número de pessoas dentro da loja é permanentemente monitorizado pelo que não haverá possibilidade de enchentes.”
O Continente, por sua vez, frisa que nas áreas de atendimento ao balcão ou nas caixas de pagamento foram delineados “no solo indicadores de espera por forma a garantir a distância de 2 metros entre as pessoas, para além da colocação de barreiras de acrílico nas caixas e balcões de atendimento ao cliente”. E a Mercadona também garante que tem reforçado a “segurança nos seus supermercados para melhor controlar a lotação e cumprimento das mesmas”.
Governo apoia “a fundo perdido” as perdas dos restaurantes, mas não diz quanto prevê gastar
O Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal (CESP) diz, porém, que as medidas nem sempre são cumpridas, e que há situações em que as empresas não são capazes de evitar ajuntamentos, por exemplo, em secções específicas ou junto às caixa de pagamento.
“A nossa preocupação é como é que as empresas vão cumprir as limitações impostas pelo governo sem atropelar os direitos dos trabalhadores”, afirma Célia Lopes, dirigente do CESP. A sindicalista diz que o Minipreço já anunciou que vai transferir os trabalhadores das lojas maiores para as que têm uma área inferior a 200 metros quadrados (e que podem manter-se abertas após as 13h00), o que, para a sindicalista, leva ao “cruzamento de equipas” e “não cumpre as regras da não transferência de local de trabalho“. O Observador questionou o Minipreço sobre esta situação, mas ainda não obteve resposta.
1.705 foram multados por consumirem álcool na rua
Na lista de motivos de contraordenação enviada pelo MAI ao Observador, o desrespeito pelas regras de permanência e distanciamento físico nos estabelecimentos é apenas o quarto incumprimento que mais multas suscita. Em primeiro lugar, estão as multas aplicadas a quem consome álcool na via pública (uma medida alargada a todo o país no final de junho) — foram 289 entre o início de outubro e 3 de novembro, ainda assim uma redução face a setembro (387). O número mais elevado foi em julho — 755. Além disso, 112 estabelecimentos comerciais ou áreas de serviço foram, desde junho, multados por venderem bebidas alcoólicos fora das horas permitidas.
Os dados permitem ainda concluir que tem aumentando o número de multas relacionadas com o incumprimento dos horários de funcionamento (por abrirem antes ou fecharem depois da hora) — foram 573 desde junho. De junho a 3 de novembro, foram ainda aplicadas 412 contraordenações a pessoas que não usaram máscara ou viseira nos transportes públicos e 628 por não o fazerem em salas de espetáculos, estabelecimentos públicos, entre outros. O uso da máscara tornou-se obrigatório na via pública, sempre que não é possível manter o distanciamento social, a 28 de outubro, pelo que os dados ainda não contemplam esta situação. Já os transportes públicos foram alvo de 83 multas por não cumprirem a lotação máxima.
Ao todo, entre 19 de março, início do primeiro estado de emergência e 3 de novembro foram efetuadas 182 detenções por desobediência à obrigação de confinamento obrigatório, foram encerrados 3.205 estabelecimentos e suspensa a atividade de 232.