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Medina correu mercados, feiras, arruadas, sempre sem mencionar os partidos da esquerda (nem sequer o parceiro BE)
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Medina correu mercados, feiras, arruadas, sempre sem mencionar os partidos da esquerda (nem sequer o parceiro BE)

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Medina correu mercados, feiras, arruadas, sempre sem mencionar os partidos da esquerda (nem sequer o parceiro BE)

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

O fim de semana de campanha em Lisboa, visto da esquerda: Medina a chamar pelo voto útil, o maior inimigo de PCP e BE

Mercados, ruas, feiras: muita coisa juntou, geograficamente, a esquerda no fim de semana, mas os discursos foram opostos. PCP e BE marcam-se; socialistas ignoram, para atirar a Moedas e bipolarizar.

São todos de esquerda, mas, para quem os vê na rua, as semelhanças quase se ficam por aí. João Ferreira é o mais austero, quase pedagógico — nunca perde uma oportunidade para tentar convencer alguém que passa de uma proposta sua, nunca desiste de um debate com um potencial eleitor. Beatriz Gomes Dias discute menos, cumprimenta toda a gente e sorri enquanto se apresenta, esforçando-se por associar a cara à fotografia que aparece nos panfletos. Fernando Medina não precisa disso: enquanto presidente é o mais reconhecido e também faz por isso — ao incumbente toca sempre fazer mais conversa, mas também ouvir mais queixas.

As diferenças entre os candidatos da esquerda à Câmara Municipal de Lisboa parecem, enumeradas desta maneira, superficiais — mas vão bem para lá de questões de estilo. Durante o fim de semana, o Observador acompanhou as três campanhas de perto e ouviu os três candidatos que ora se apresentam como rivais, ora como potenciais parceiros, dependendo da estratégia (e da proximidade das eleições).

A diferença essencial reside mesmo aí: Beatriz, João e Fernando andaram quase pelos mesmos sítios, mercados e ruas, mas sempre a mostrar que têm objetivos políticos bem diferentes. A primeira e o segundo querem evitar a todo o custo a maioria absoluta do PS; o terceiro apela diretamente ao voto útil, fazendo tudo para bipolarizar a corrida entre si e o PSD (com o sonho da maioria absoluta na cabeça?). Assim, pelo menos até dia 26, cada um segue o seu caminho.

Uma manhã clássica e um recado de Louçã

Para sábado de manhã, os jornalistas estão avisados de que o Bloco de Esquerda terá uma ação de campanha no mercado de Benfica, com um fator de atração especial: a presença do fundador Francisco Louçã. No manual das campanhas políticas, o momento tem todos os ingredientes para ser um clássico: toda a gente sabe que sábado é dia de mercado — dia forte para tentar angariar votos por entre as bancas do peixe e da fruta — e a presença de um convidado especial dá sempre uma força extra a uma campanha. Mas é por a ideia não ser propriamente original que o mercado de Benfica se prepara receber, exatamente à mesma hora, a comitiva de Fernando Medina.

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Louçã no terreno para trazer um shot de notoriedade à campanha do Bloco. “Esta é a Beatriz!”

Com um telefonema pelo meio, as equipas lá se acertam e o Bloco acaba a contornar o mercado pelo lado oposto àquele por que Medina entrará. Os dois partidos foram parceiros durante os últimos quatro anos, mas em fase de campanha, o distanciamento é aconselhado. Não há cumprimentos nem fotografias em grupo. O recado político da manhã bloquista fica a cargo de Louçã e vai direto aos socialistas: “É muito importante que o PS não tenha maioria absoluta para não se esquecerem as políticas sociais”. Mais claro: “O Bloco quer ter um pelouro na base de um acordo que proteja essa governação” — até porque, segundo Louçã, “todos os pontos fracos na governação de Medina foram de pelouros mal geridos ou com proximidade dos grandes interesses”.

A habitação acessível é um tópico agridoce para o Bloco: é uma grande bandeira do partido, mas neste mandato o número de casas ficou muito longe do objetivo. BE culpa o PS

JOSÉ FERNANDES/OBSERVADOR

Missão do PS: bipolarizar. E ignorar a esquerda

Medina quase poderia ter ouvido por si próprio o recado, não fosse a visita ao mercado de Benfica ter sido “de médico”. Com uma agenda frenética — a dos outros partidos deve intensificar-se nesta segunda semana, mas o incumbente já arrancou com um calendário cheio — por essa hora já corre o segundo mercado do dia, o de Alvalade, bem disposto e sempre com um molho de rosas na mão, pronto a oferecer às senhoras.

Se no mercado de Benfica Louçã emprestava a sua notoriedade à campanha de Beatriz, que ainda não tem palco na câmara — já foi eleita na freguesia de Arroios, mas é a primeira candidatura à autarquia — com Medina acontece o contrário: fala com toda a gente, acena de longe e de perto, oferece flores, tira fotos, pede fotos, canta, abraça, avança. A vida de incumbente é, nesse sentido, mais fácil, e Medina sabe disso. “Há quatro anos (nas eleições de 2017) eu só estava na Câmara há dois, ainda não tinha tido nenhuma eleição [Medina ‘herdou’ a autarquia das mãos de Costa, quando este conquistou a liderança do partido]. Agora há uma confiança reforçada e toda a gente nos conhece”.

Medina correu dois mercados numa só manhã. No domingo, foi à feira

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

É exatamente esse valor — o do reconhecimento e da “confiança” — que Medina espera aproveitar nas urnas, no dia 26. Espera ter maioria absoluta? “As maiorias absolutas não se pedem nem se decretam”. Então como é que se chega lá? Ignorando os partidos que as possam anular.

É por isso mesmo que Medina não faz uma única referência à esquerda — PCP e BE até poderão vir a ser parceiros pós-eleitorais, mas o PS não quer falar sobre isso — e aponta todas as baterias à direita, tornando Carlos Moedas o seu único adversário. “Só haverá um governo progressista na cidade se o PS ganhar. Essa é que é a questão. É preciso concentrar os votos [da esquerda] no PS”, reforça.

Medina tem apostado muito no contacto de rua. Dá flores, tira fotos, canta e abraça

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Para os partidos de esquerda, que não chegam a ser nomeados antes de Medina partir para entregar mais rosas e cumprimentos de punho com punho, sobram promessas de “capacidade de diálogo”, mas sempre com a mesma ressalva: no dia 26 “só há uma escolha possível”. É o discurso mais perigoso para a BE e PCP: se a perceção do eleitorado for que a opção é uma vitória de Medina ou uma vitória de Moedas, lá se vão os votos que reforçariam os potenciais parceiros do PS.

Missão do BE: travar Medina

A ideia fica ainda mais clara umas horas mais tarde, quando a comitiva que anda a correr o país com Catarina Martins estaciona em Lisboa, no largo de São Carlos, para um comício alargado a todo o distrito mas com discurso focado nos objetivos políticos para a capital. Se dúvidas houvesse, a líder dissipa-as: “É onde acaba a maioria absoluta do PS que começa a mudança na cidade”, sentencia.

A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Catarina Martins (E), acompanhada pela candidata do BE à Câmara Mumicipal de Lisboa, Beatriz Gomes (D), durante o comício com candidatos autárquicos, no Largo São Carlos, em Lisboa, 18 setembro 2021. No próximo dia 26 de setembro mais de 9,3 milhões eleitores podem votar nas eleições Autárquicas, para eleger os seus representantes locais. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Catarina Martins veio dar força à candidata no comício de sábado e definiu claramente o objetivo na capital: impedir a maioria absoluta do PS

MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

E o que é que o Bloco, por seu lado, promete? Fazer o que ainda “tem de ser feito”, não “desistir”, “avançar” no que o PS travou. Ou seja, continuar a tentar condicionar o PS. Para isso, é imperativo que consiga voltar a influenciar a governação da cidade — até porque, para um partido com zero presidências de câmara, é mesmo essa a maior prova de força autárquica que tem.

Missão do PCP: atacar os dois vizinhos

O PCP não anda longe. Por entre mercados, arruadas e comícios, o dia vai avançando e são horas do pôr do sol — na agenda oficial da CDU, de um “sunset” — no miradouro de São Pedro de Alcântara. É ali que João Ferreira se encontra com umas quantas dezenas de jovens da ‘jota’ comunista ou pelo menos próximos dela para falar de Cultura e ouvir um momento de rap protagonizado por GDM, que também atuou, há dias, na Festa do Avante!.

Mas isso não quer dizer que não haja tempo para a política: Ferreira não só nunca se esquece, quando fala dos últimos anos, de apontar responsabilidades também ao BE — é preciso lembrar aos eleitores de esquerda que o outro potencial parceiro do PS também falhou nos objetivos de habitação acessível, por exemplo — como lança uma farpa ácida no meio desta intervenção, já quase sem sol ao fundo. “Peguem no acordo de governo — foi esse o nome que lhe deram –, que encontrarão facilmente — se não o tiraram já — na internet. Não foi por falta de recursos que não se fez mais”.

Ferreira é o mais pedagógico: não desiste das conversas e nem pensar em oferecer brindes (ou flores). Prefere descrever as propostas em detalhe

JOSÉ FERNANDES/OBSERVADOR

O PCP não esclarece exatamente que tipo de acordo quererá — Ferreira diz que quer assumir pelouros, Jerónimo já veio recusar acordos formais com o PS — mas de uma coisa tem a certeza: é preciso travar uma maioria absoluta socialista, por um lado, mas também a influência bloquista na câmara, por outro.

No domingo, a esquerda volta a estar próxima — geograficamente falando, claro. Na feira do Relógio, na zona de Marvila, Beatriz Gomes Dias anda acompanhada de Mariana Mortágua e Luís Fazenda — o segundo fundador a dar-lhe força neste fim de semana — a dar panfletos e a repetir o mantra do costume: o acordo de 2017 só foi possível porque “o PS não teve maioria absoluta”.

Medina fará exatamente o mesmo percurso, nem duas horas depois. E Ferreira anda por Marvila, pelas ruas dos bairros, a recolher queixas sobre a habitação municipal e a gestão da Gebalis e a contrariar quem lhe diz que “vocês” são todos iguais. “Vocês é muita gente”. De quem é que se quer distanciar? Da gestão de PSD e CDS, claro, mas também da do PS, “nos últimos anos com a ajuda do Bloco de Esquerda”. “Estiveram no poder e tiveram muito dinheiro, mas fizeram pouco”. Conclusão? “Temos de pôr nome às coisas” — aos partidos — “se não somos sempre enganados…”.

JOSÉ FERNANDES/OBSERVADOR

Parceiros? Só depois de contar os votos

Para os vizinhos da esquerda, o dia está arrumado a partir da hora de almoço; só Medina segue, enérgico, para as ações da tarde. Debaixo de sol quente, apanha o barco — um cargueiro tradicional do Tejo — e enche-o de ‘jotas’ para fazer, qual guia turístico de microfone na mão, um apanhado da obra socialista na zona ribeirinha da cidade. Mais uma vez, os nomes do Bloco de Esquerda — mesmo tendo sido parceiro de governo na cidade — e do PCP não passam nem uma vez pela boca de Medina.

Golfinhos e uma vista “apaixonante”. No Tejo, Medina fez de guia turístico e atirou contra a direita

As balas são todas disparadas contra a direita, em tom irónico: lembra as críticas à transformação do que era um parque de estacionamento no que é hoje o Terreiro do Paço, os ataques à taxa turística (as famosas “taxas e taxinhas” contra as quais o então ministro António Pires de Lima bradava), as propostas “diametralmente opostas” sobre habitação — embora a habitação acessível seja um dos tópicos em que tanto esquerda como direita se põem de acordo quanto ao falhanço dos objetivos de Medina.

Seja como for, se BE e PS não deixam passar uma ação sem falar do PS, Medina faz o contrário: atira a Moedas e concentra-se em bipolarizar a corrida. No final da viagem, abandona o barco satisfeito e sozinho (Rui Tavares até estava sentado dois lugares ao lado, mas segue à frente). Se terá companheiros de viagem à esquerda no caso de ser reeleito no dia 26, só depois se saberá — até porque só depois de os votos estarem nas urnas terá interesse em falar sobre o assunto.

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