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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

O "não é não" chegou à Madeira. Todos juram não querer acordos com Albuquerque, mas ninguém à direita recusa viabilizar governo

Se as promessas forem cumpridas e se o PSD/Madeira ganhar as eleições sem maioria absoluta, Albuquerque vai ser obrigado a avançar com um governo minoritário porque ninguém aceita acordos.

Há oito meses, em plena noite eleitoral da Madeira, o PSD perdia a maioria absoluta e ficava a um deputado de conseguir governar. Chega e Iniciativa Liberal, que acabavam de eleger quatro e um representantes, respetivamente, abriam as portas ao diálogo. Albuquerque fechou-as com estrondo e deu preferência ao PAN. Agora que um processo judicial no qual é arguido provocou uma crise política na Madeira, Miguel Albuquerque está mais isolado do que nunca. À partida, todos recusam acordos pós-eleitorais — mas talvez acabe salvo por um programa de governo viabilizado.

O presidente do PSD/Madeira foi deixando as pistas de que o Chega deixou de ser um problema. As críticas nem sequer desapareceram, Albuquerque apenas foi equilibrando entre o afirmar que “o Chega faz populismo de taberna” e que a “cerca sanitária é uma armadilha do PS”. E quanto mais próximas estão as eleições, menos dúvidas há nas palavras de Albuquerque: “O Chega, como todos os outros partidos do arco constitucional, são partidos reconhecidos pelo Tribunal Constitucional e representam o eleitor e temos de ter a noção que estes dogmas de excluir partidos que representam pessoas do sistema são favoráveis exatamente a essas forças.”

Com Albuquerque sem linhas vermelhas para Ventura, o problema passou a ser o outro lado da parceria. Desde logo quando, no dia 12 de maio, André Ventura disse que “não há acordos com Miguel Albuquerque” e deu a posição do partido como fechada. Mas quatro dias depois Miguel Castro assegurou que “não fecha a porta a ninguém” e admitiu “viabilizar o governo do partido que apresentar as melhores propostas”. O recuo permitiu a Paulo Cafôfo construir a narrativa de que havia um entendimento pré-eleitoral entre PSD, Chega e CDS — o que serviu todo um novo propósito de campanha.

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Em declarações ao Observador, no momento em que André Ventura regressava à Madeira para se juntar à fase final da campanha, Miguel Castro deixou a garantia de que “o Chega fala a uma só voz” e que “concorda plenamente” com o presidente do partido. Falou ao telefone com Ventura após o estalar da polémica e ouviu que as declarações não “comprometem em nada” o Chega. “O que dissemos é que abríamos a porta a um bom programa de governo para a Madeira. Nem Miguel Albuquerque nem Paulo Cafôfo, na minha opinião, têm condições de serem eles a apresentar um melhor programa de governo para a Madeira”, justificou o cabeça de lista do Chega.

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Contas feitas, Miguel Castro resume que “o Chega já disse que vai sozinho, que não faz coligações com ninguém” e que está disponível para viabilizar um programa de governo, aquele que for “mais benéfico para a região”, sugerindo que até pode ser feito através de uma abstenção e não “embarcando com eles”.

Ao lado de Miguel Castro, André Ventura defendeu o candidato e assegurou que está tudo claro: “Com o Miguel Albuquerque não haverá nenhum acordo parlamentar porque nós entendemos que não devia ser candidato e quando se tem princípios e valores não cedemos isso por qualquer circunstancialismo político”, assegurou, frisando que as palavras de Miguel Castro servem o propósito do Chega: “Não a olhar a partidos, mas a propostas.”

O líder do Chega considera que Miguel Albuquerque “não tem as mínimas condições para ser líder de um governo regional”, dizendo que os dados conhecidos até então no processo judicial “não são tranquilizadores para quem defende a transparência e é contra a corrupção”. “O Chega não pode ignorar tudo isto e, perante uma maioria [PSD/Chega], dizer que como é preciso vai fazer um acordo”, reiterou, concordando que o Chega, ainda que fora do Governo Regional, “não será uma força de bloqueio”. Uma decisão sobre a votação de um programa de governo fica para mais tarde, mas a porta está escancarada.

O “não é não” que fez ricochete no PSD… Madeira

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Nem só Luís Montenegro tem direito a “não é não”. Nuno Morna, cabeça de lista da Iniciativa Liberal na Madeira, resolveu citar o líder social-democrata para traçar duas linhas vermelhas: “Com Miguel Albuquerque não é não, com o PS não é não.” “E quando eu digo ‘não é não’ é no sentido de serem estabelecidos acordos, protocolos, acordos parlamentares, acordos de governo, isso é tudo uma impossibilidade com Miguel Albuquerque”, assegurou. Rui Rocha foi exatamente no mesmo sentido para dizer que a IL “não fará nenhum tipo de entendimento com Miguel Albuquerque” e argumentou que “os acontecimentos dos últimos meses mostram que é absolutamente impossível neste momento”.

Coisa diferente pode ser o passo seguinte, já que os liberais não antecipam chumbar um programa de governo apenas por ser apresentado por Albuquerque, se os resultados ditarem este cenário. Em declarações ao Observador, Morna antecipou ainda que é possível um voto favorável no programa de governo se for  “profundamente reformista” e espelhar “pelo menos aquelas medidas matrizes que identificam o liberalismo”. Uma abstenção é mais difícil, porque olha para a opção como “último recurso”, mas também não a coloca de parte para casos de dúvidas.

O “amor acabou”, mas há espaço para conversar

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Já para o CDS, oito meses depois das legislativas em que era parceiro de coligação do PSD, de ver o entendimento rasgado no meio da crise política e de estar correr em pista própria e com uma equipa renovada, “o amor acabou”. José Manuel Rodrigues, cabeça de lista dos democratas-cristãos na Madeira, conta ao Observador que “nada será como antes na relação entre o CDS e o PSD”. E acusou o ex-parceiro de ter usado o PSD como uma “espécie  de muleta” — “Eu acho que o casamento entre o CDS e o PSD foi um casamento de conveniência para o PSD.” Mais do que isso, considera que ao contrário do CDS que “se preparou para este ciclo político”, sugere que “outros continuam a viver numa bolha, indiferentes àquilo que se passou”.

Perante o cenário dos últimos meses, o líder do CDS deixa duas garantias: “O CDS não fará acordos de coligação de governo com nenhum partido, mas está disposto, obviamente, a falar com todos os partidos no Parlamento Regional para termos um governo minimamente estável e que possa apresentar um orçamento rapidamente à Assembleia Legislativa e para que esse orçamento seja aprovado.”

Ainda se recorda dos tempos em que o CDS deu a mão ao PSD, em 2019, e deixou o PS sem saída. Aliás, essa é uma das mágoas de Paulo Cafôfo que podia ter chegado ao poder nessa altura. Mas cinco anos depois, tem dúvidas de que “o PS seja a alternativa ao PSD”. Porém, enquanto “partido responsável”, reiterou que está disposto a aprovar um programa de governo de um executivo minoritário — e depois continuar com uma avaliação decreto a decreto.

O Chega como arma de arremesso

O debate em que Miguel Castro disse que não fechava as portas a ninguém serviu para alimentar uma tese avançada, logo ali, por Paulo Cafôfo — que disse ser a prova de que existia um acordo pré-eleitoral escondido entre PSD, Chega e CDS — e também para que a direita fizesse uma colagem entre Albuquerque e Ventura: “Votar no Chega é votar no PSD” — para capitalizar os votos dos descontentes com o PSD/Madeira ao dizer que estão juntos.

“Não haja dúvida nenhuma de que se Miguel Albuquerque, que já disse que não tem linhas vermelhas para o Chega… se tiver a necessidade, para salvar a sua pele, de fazer um acordo com o Chega, vai fazê-lo por mais que André Ventura diga que jamais, que nunca fará”, disse Paulo Cafôfo em entrevista ao Observador, certo de que Albuquerque vai precisar de Ventura e que o Chega não lhe vai virar as costas.

Todos à direita — mesmo o próprio Chega — acusam o candidato socialista de estar a mentir. O partido de André Ventura há muito que é uma linha vermelha para os liberais e também José Manuel Rodrigues, do CDS, explicou ao Observador que só quem vence pode decidir sobre acordos, garantindo que se ganhar não fará “nenhuma coligação” com o Chega — mas “se o Chega for necessário para uma maioria parlamentar, [fará] um entendimento parlamentar”.

Rui Rocha recuperou mesmo a expressão das “forças vivas” usada por André Ventura para dizer que essas forças, na Madeira, “começam a dar sinais muito claros de que há essa disponibilidade para entendimento do lado do PSD e do Chega”. A IL acredita tanto nesta versão que Nuno Morna assumiu ao Observador que ficaria “surpreendido” se, no cenário em que PSD e Chega conseguem uma maioria, não assinarem um acordo. “Tenho a certeza que neste momento as coisas já estão congeminadas.”

Iniciativa Liberal e CDS vão usando as declarações de André Ventura para dizer que vai “mudando de discurso” e “andando na corda bamba” e para apelarem ao eleitorado de direita, crentes de que PSD e Chega têm mesmo um acordo e que, dependendo dos resultados, podem acabar por conseguir uma maioria que deixe de fora todos os outros partidos, seja ela um acordo de governo ou um acordo parlamentar. Por enquanto, as juras de amor terminaram e apenas há nãos para Albuquerque. Contudo, os trunfos da responsabilidade continuam a ser jogados e isso pode mesmo valer a Albuquerque um seguro de vida no governo.

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