Os vencedores

Iniciativa Liberal

Mais uma prova de superação da IL. Num contexto particularmente difícil – hegemonia do PSD, Chega como herdeiro natural dos eleitores CDS –, os liberais conseguiram cumprir o objetivo e entrar na Assembleia Legislativa da Madeira. Se Nuno Morna, cabeça da lista do partido, foi o rosto da campanha, não é menos verdade Rui Rocha se empenhou pessoalmente nestas regionais – o seu primeiro desafio eleitoral enquanto líder do partido. O objetivo mínimo — eleger um deputado — foi cumprido. O fim da maioria absoluta PSD/CDS é a cereja no topo do bolo precisamente porque permite aos liberais fazerem parte da equação. Assim queira Miguel Albuquerque.

PAN

A liderança de Inês Sousa Real tem sido marcada por todo o tipo de confusões, psicodramas e críticas internas. As eleições na Madeira foram mais do mesmo: a cerca de um mês da corrida às urnas, o então cabeça de lista, Joaquim Sousa, foi afastado mas não sem antes acusar Sousa Real de tentar fazer dele um capacho. Apesar de tudo, líder e a candidata escolhida, Mónica Freitas, conseguiram não só fazer o PAN regressar ao parlamento regional da Madeira como, e mais importante, acabar a noite com o partido promovido a potencial parceiro de negociações de Miguel Albuquerque. Uma vitória em toda a linha. Tal com acontece com os liberais, a dimensão da vitória dependerá do desenrolar das negociações com a coligação PSD/CDS.

CDU

Nos seus discursos, tanto Edgar Silva como Paulo Raimundo se queixaram de perseguições e injustiças várias sem esclarecerem quem terá cometido essas malfeitorias. De qualquer forma, os comunistas ganharam mais de mil votos entre 2019 e 2023 — Edgar Silva afirmou que a CDU ficou muito perto do segundo mandato, mas, no final das contas, mantém-se com apenas um deputado. O que é certo é que a CDU se fortaleceu. Depois de ter sobrevivido com dificuldades à frente anti-PSD de Paulo Cafôfo em 2019, o PCP recuperou agora vários eleitores que se convenceram que o PS não chega lá.

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Bloco de Esquerda

O BE teve mais 547 votos do que em 2019 e isso foi suficiente para voltar ao parlamento regional. Por isso, obviamente, o partido é um dos vencedores da noite. Mas há três razões que explicam porque é que não foi propriamente um resultado estonteante. Primeira razão: o BE ficou atrás do PAN (a diferença foi de dez votos), sendo apenas o oitavo partido. Segunda razão: entre 2015 e 2019, o BE teve dois deputados e não apenas um, por isso a recuperação é curta. Terceira razão: ao contrário do que Mariana Mortágua afirmou e defendeu na sua declaração, o BE não contribuiu para o fim da maioria absoluta — a maioria absoluta foi perdida à direita, não à esquerda. De qualquer forma, como se costuma dizer, o BE vive para lutar mais um dia.

Juntos Pelo Povo

Nem a zanga entre os irmãos Filipe e Élvio Sousa ameaçou a popularidade de um movimento que nasceu para enfrentar o jardinismo e que sobreviveu para lá dele. O JPP conseguiu mais do que duplicar o número e percentagem de votos e conseguiu eleger 5 deputados, afirmando-se como a terceira força da região. “Precisamos de tempo para maturar como o vinho da Madeira. Ainda vamos ganhar as regionais um dia”, profetizou Élvio Sousa. Não será caso para tanto, mas a vitória é inequívoca.

Os vencidos

António Costa

Em 2019, envolveu-se diretamente na campanha regional da Madeira, teceu loas ao candidato socialista e chegou mesmo a apadrinhar a inscrição de Paulo Cafôfo, então independente, nas fileiras do PS. Quase resultava: nunca como há quatro anos os socialistas estiveram tão perto de roubar a Madeira ao PSD. Era de prever que tentassem outra vez em 2023, com renovada confiança. Mas tudo se esfumou. Este domingo, o partido, que apostou num quase desconhecido Sérgio Gonçalves, perdeu em toda a linha, foi varrido dos quatro concelhos que tinha conseguido pintar de rosa nas últimas regionais e despediu-se de oito deputados. Uma hecatombe, portanto. António Costa, que quase nem pôs os pés na campanha, deixou João Torres, secretário-geral adjunto do partido, assumir as dores do PS. Na hora da derrota, vestindo o fato de primeiro-ministro, emitiu um comunicado carregado de cinismo em que desejava a continuação de um bom trabalho a Albuquerque – sabendo que o madeirense jurara demitir-se se perdesse a maioria, coisa que manifestamente não fez. Fraco consolo. O PS desistiu por completo destas eleições, os eleitores fizeram-lhe a vontade e Costa, enquanto líder do partido, é o responsável máximo pelo falhanço.

Luís Montenegro

Crescentemente encharcado em suor, parecendo um veado encadeado pela luz dos faróis de um carro, Luís Montenegro falou aos jornalistas na Madeira usando uma retórica que foi descolando da realidade a cada minuto que passava: apesar da perda da maioria absoluta, falou em “vitória em toda a linha” e insistiu que se tratava de “uma noite de alegria”. Pior: numa frase que deveria trazer ensaiada, afirmou que estas eram as primeiras eleições da sua liderança, o que, segundo ele, dá “PSD-1, PS-0; Montenegro-1, Costa-0”. Tentou, assim, tornar nacional uma eleição regional, o que deve ter feito levantar os sobrolhos de todos os defensores da autonomia madeirense. Luís Montenegro decidiu levar para a Madeira toda a direção do PSD, para tentar fazer passar uma eventual maioria absoluta da Madeira para o continente — agora, tem que fazer de conta que tudo se passou como planeado.

O sobrevivente

Miguel Albuquerque

Passou grande parte da reta final da campanha a dramatizar e a prometer que se demitiria se falhasse a maioria absoluta. Ao longo de todo o dia, como iam relatando os enviados do Observador, os ventos pareciam correr de feição, as sondagens ajudavam e não faltavam sorrisos no quartel-general da coligação PSD/CDS. A maioria estava no bolso, venha daí o champanhe. Correu mal e confirmou-se o pior dos cenários que as sondagens admitiam – a vitória do PS nunca foi sequer uma hipótese. Depois de há quatro ter perdido a maioria absoluta, desta vez nem o CDS foi suficiente. Ia nascendo o pesadelo da crise interna, mas era tudo uma questão de semântica: afinal, Miguel Albuquerque nunca quis ser tão definitivo sobre o seu futuro e sempre havia margem para negociar com outros partidos. Venceu o pragmatismo. Em rigor, o presidente do Governo Regional da Madeira sai destas eleições com dois parceiros possíveis, Iniciativa Liberal e PAN, e mais do que confortável para dispensar o Chega. Tem tudo para continuar no poder por mais quatro anos.

E o nim

André Ventura

O Chega passou de 619 votos em 2019 para 12.028 agora — mas não conseguiu ser o terceiro partido mais votado, ficando atrás do Juntos Pelo Povo. Conseguiu ajudar a tirar votos e um mandato ao PSD — mas não foi suficiente para afastar Miguel Albuquerque, que se transformou, durante a campanha, num inimigo declarado de André Ventura. E elegeu quatro deputados — mas, mesmo com um grupo parlamentar, falhou a tentativa de se tornar indispensável para a formação de uma maioria de governo. O PSD não precisa do Chega para governar e, com IL e PAN, até tem dois apoios que pode ir alternando durante os próximos quatro anos. Isto quer dizer que o Chega tem votos e deputados, mas não tem força. Está entre o sim e o não — é um nim.