No penúltimo frente-a-frente na Rádio Observador, os únicos destas eleições europeias, o debate mostrou as posições bem divergentes do liberal Cotrim de Figueiredo e do comunista João Oliveira em várias matérias — ambos até concordam, mas por razões opostas. Desde a possibilidade de taxa mínima de IRC para as multinacionais, uma ideia que já chegou a ser avançada pelo Parlamento Europeu, às regras de recuperação económica da UE, incluindo o mecanismo de recuperação e resiliência e os PPR, até às políticas para a habitação, que os liberais não tinham no manifesto eleitoral por acharem que “é uma competência sobretudo nacional”, mas para as quais, com aplausos do cabeça de lista da CDU, Cotrim levou novas ideias. No final, a discussão aqueceu com o tema que mais parece queimar os comunistas: a Ucrânia: já depois de Cotrim de Figueiredo ter defendido que a paz não é possível neste momento, porque isso seria capitular perante Putin, João Oliveira respondeu “não” à pergunta se um acordo de paz implicaria ceder os terrenos ocupados e reclamados pela Rússia. Ouviu-se depois o liberal fala de “utopia” e discurso “Miss Mundo”, enquanto o cabeça de lista da CDU voltava a evocar o Papa Francisco.
Os frente-a-frente na Rádio Observador, os únicos nestas europeias terminam na próxima quarta-feira, dia 29, às 19h00, com o sétimo debate: será entre o cabeça de lista da AD, Sebastião Bugalho, e o cabeça de lista do Livre, Francisco Paupério. Pode consultar o calendário completo dos frente-a-frente já realizados aqui.
Também esta sexta-feira haverá o último debate a quatro nas televisões. Será na TVI, entre Marta Temido (PS), Sebastião Bugalho (AD), Catarina Martins (Bloco) e Fidalgo Marques (PAN). Segue-se o debate a oito, nas televisões, dia 28, terça-feira. E depois, também o debate a oito, nas rádios.
Quem esteve melhor? Ao longo destes dias, um painel de avaliadores do Observador dará notas de 1 a 10 a cada um dos candidatos nos frente-a-frente da Rádio Observador. O mesmo modelo que temos usado, e vamos manter, neste último debate a quatro das televisões e que se estenderá ao debate a oito, quer das televisões, quer das rádios. A média surge a cada dia, no gráfico inicial, onde pode ver a classificação geral e saber quem tem estado melhor e quem lidera.
[Já saiu o segundo episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio.]
Quem ganhou o frente-a-frente da Rádio Observador, Cotrim de Figueiredo ou João Oliveira?
Carlos Diogo Santos — João Oliveira teve hoje a sua melhor prestação no frente-a-frente com João Cotrim Figueiredo. Depois de vários debates em que a saída do Euro e a guerra na Ucrânia — neste caso a falta de clareza sobre a posição que tem sobre estes temas — foram pontos difíceis para o candidato da CDU, esta sexta-feira, Oliveira foi claro sobre o que defende sobre o IRC para as grandes empresas e sobre como vê os problemas na Habitação. E sobretudo, deu um passo em frente na posição sobre a guerra na Ucrânia: defende um caminho para a paz que não passe pela cedência de território. Será isso possível? Não. Mas apoiar a ideia de que a Ucrânia não deve perder território para que a guerra acabe é um passo gigante. Cotrim Figueiredo vinha como sempre bem preparado, foi claro sobre o que pensa para a Europa em quase todos os temas. Mas só ganhou pelo contra ataque final, em que desafiou o oponente a falar de vários temas incómodos, quando bem sabia que este já não tinha tempo para responder. Ou seja, Cotrim soube usar bem a estratégia de Bugalho, que no frente a frente anterior o encostou à parede da mesma forma. Ao cair do pano.
Pedro Jorge Castro — Cotrim recorreu à táctica que Bugalho tinha usado com ele no frente-a-frente da véspera e, mesmo no fim do debate, desferiu os ataques mais duros contra João Oliveira, referindo-se ao seu discurso de Miss Mundo sobre o caminho (improvável) para a paz na Ucrânia e desafiando-o a assumir-se contra o euro. Não tem novidade, mas é eficaz num contexto destes e já não haveria hipótese de o candidato da CDU rebater como deve ser, indo além da acusação de o ex-líder da IL estar a usar “tácticas de um cartilheiro de futebol” nos programas mais extremados das televisões. No resto, houve bastante equilíbrio. Os indecisos próximos da IL talvez não tenham percebido a ausência da habitação nas 9 páginas do manifesto. Os indecisos que estarão perto do PCP aguardarão para ver desenvolvimentos e explicações sobre a nova posição face à guerra na Ucrânia. João Oliveira mostrou-se bastante combativo, melhorando a performance face aos primeiros debates desta campanha, e dando boa réplica a Cotrim de Figueiredo. Dá quase sempre faísca entre estes dois e nisso este frente-a-frente não desiludiu.
Miguel Pinheiro — Neste frente-a-frente, obviamente, ninguém ia convencer ninguém. Mas foi interessante perceber que liberais e comunistas concordam em muitas coisas — pelas razões opostas. Por exemplo: são os dois contra a imposição por parte da UE de uma taxa mínima de tributação das multinacionais — os liberais porque querem taxar menos: os comunistas porque querem taxar mais. São duas visões muito distintas do mundo, tanto no confronto como na concordância. Por isso, foi um debate que ia seguindo empatado e, previsivelmente, assim deveria terminar. Mas, a dada altura, João Oliveira decidiu fazer uma coisa rara em política: aceitou responder com um “sim” ou um “não” a uma pergunta de “sim” ou “não”. Pergunta: “Uma paz imediata implica a cedência dos territórios invadidos à Rússia?” Resposta: “Não.” Isto levanta toda uma outra série de questões que até agora não estavam a ser discutidas, como esta: o PCP considera que o Donbass e a Crimeia são território ucraniano ou russo? Na vida, há surpresas boas e surpresas más. Esta surpresa de João Oliveira desequilibrou o debate a favor de Cotrim Figueiredo.
Rui Pedro Antunes — João Cotrim Figueiredo e João Oliveira fizeram ambos um debate competente e que, de alguma forma, não desiludiu o respetivo eleitorado. Não pode haver comunista desiludido pela forma como o seu candidato atacou o “liberalismo”, nem liberal a sentir-se defraudado pela forma como o seu cabeça de lista “malhou” no comunista. João Oliveira foi eficaz ao aproveitar a ausência da habitação do programa da IL para as Europeias e ainda acrescentou que não havia também qualquer referência a salários — o que Cotrim foi contestou. Já Cotrim Figueiredo não perdoou na parte da Ucrânia, classificando a posição da CDU como uma utopia naïf. Apesar disso, houve uma evolução da posição comunista nesta área: João Oliveira defendeu a integridade territorial da Ucrânia. No fim do debate, João Cotrim Figueiredo desferiu uma série de ataques, já com João Oliveira sem possibilidade de responder. “Assumam que não gosta da UE, nem do euro, nem defendem o apoio ao povo ucraniano”. Mesmo de rajada, e sem hipótese de contraditório, a frase de Cotrim não deve fugir da realidade. Mesmo com golpes duros, ninguém venceu por KO.
Quem ganhou os três frente-a-frente desta quinta-feira na Rádio Observador
Frente-a-frente do Observador. Quem ganhou, Francisco Paupério ou Tânger-Corrêa? Veja as notas