No debate com Luís Montenegro, esta segunda-feira, na RTP, André Ventura defendeu a ideia de que os inspetores da Polícia Judiciária podem ter filiação partidária. O líder do Chega defendeu que as regras que se aplicam aos profissionais da PJ, no que toca à ligação a um partido, são as mesmas que vigoram para os magistrados (uma declaração que o Observador já verificou). Luís Montenegro contestou o argumento — não fica claro se o líder do PSD se refere apenas aos magistrados ou também aos inspetores da PJ. “Só se tiverem a sua atividade suspensa”, diz Montenegro, entre acusações mútuas de desconhecimento da lei. Ventura tem razão?

Vamos ver o que diz a lei. O Código Deontológico dos Trabalhadores das Carreiras Especiais e Subsistentes da Polícia Judiciária, aprovado a 1 de setembro do ano passado — e pela primeira vez introduzido neste corpo de profissionais — estabelece, no artigo 9.º as regras relativas a “incompatibilidades e impedimentos” destes profissionais. Os inspetores da PJ “devem evitar situações de conflito de interesses, ainda que potenciais ou aparentes, suscetíveis de comprometer a sua lealdade, respeitabilidade e honorabilidade ou a dignidade e o prestígio da instituição”, refere o artigo, sem determinar, de forma taxativa, qualquer impedimento de filiação, mas determinando o dever de “evitar situações de conflito” — situações que poderiam resultar, eventualmente, de uma ligação a uma força política.

Mas, explica ao Observador a presidente da Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (ASFIC), Carla Pinto, esta legislação deve ser lida de forma conjugada com outra lei: a Lei dos Partidos Políticos.

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Nessa outra peça legislativa, o artigo 21.º diz respeito às “restrições” à atividade política e partidária. E, ali, consagra-se especificamente, logo no número 1 do artigo, que “não podem requerer a inscrição nem estar filiados em partidos políticos”, além dos militares ou agentes militarizados dos quadros permanentes em efetividade de serviço, “os agentes dos serviços ou das forças de segurança em serviço efetivo”. Uma limitação que se aplica aos inspetores da Polícia Judiciária, profissionais de um serviço de segurança com responsabilidades na investigação judiciária.

Ao mesmo tempo, e de forma complementar, a Lei da Segurança Interna refere, no artigo 25.º, que “as forças e os serviços de segurança são organismos públicos, estão exclusivamente ao serviço do povo português, são rigorosamente apartidários e concorrem para garantir a segurança interna”. O artigo especifica cada uma das forças e serviços a que se aplica e, na alínea c) do número 2, é mencionada expressamente a Polícia Judiciária.

“Nós investigamos responsáveis políticos, ministérios e essa atividade é incompatível” com a pertença a um determinado partido político, defende Carla Pinto. “Temos um dever de isenção, um regime de exclusividade que mais ninguém tem”, sublinha a presidente da ASFIC em declarações ao Observador.

No mesmo debate, André Ventura ainda defendeu que os inspetores da PJ “podem fazer greve”. Neste ponto, o líder do Chega estava correto. O Estatuto Profissional do Pessoal da Polícia Judiciária garante, no artigo 23.º, respeitante à “atividade sindical”, que “os trabalhadores das carreiras especiais têm o direito de organizar e desenvolver livremente a atividade sindical na PJ, nomeadamente o direito à greve, nos termos da Constituição e da lei”.

Conclusão

Ao contrário do que alegou André Ventura no debate frente a Luís Montenegro, a filiação partidária de elementos que prestam serviço nos serviços de segurança, como é o caso da Polícia Judiciária, não estão autorizados manter uma filiação partidária, em nome da isenção e idoneidade das funções que exercem. Podem, sim, desenvolver atividade sindical e fazer greve.

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