Mesmo três anos depois de decretada a pandemia devido ao Covid-19, continuam a surgir publicações nas redes sociais sobre o assunto, principalmente sobre vacinas. Desta vez trata-se de uma publicação viral que alega que o Supremo Tribunal norte americano terá “anulado a vacinação universal” e considerado que a vacina do tipo “mRNA altera o ADN humano e agora são transumanos”.

O texto da publicação não tem qualquer referência à fonte original de informação, limitando-se a uma imagem com alguns parágrafos sobre o tema com o título “Supremo Tribunal dos Estados Unidos anula vacinação universal”. A publicação não nomeia diretamente a vacina contra a Covid, mas é a ela que se refere, chamando-lhe “vacina mortal” e dizendo mesmo que “viola a proibição de manipulação genética do Tratado de Nuremberga de 1945”.

O Código de Nuremberga foi criado em 1947, na sequência do julgamento de crimes de guerra cometidos durante a Segunda Guerra Mundial que ocorreu no Tribunal Militar Internacional localizado naquela cidade alemã entre 1945 e 46. Entre os julgados estavam médicos acusados de experiências em seres humanos nos campos de concentração nazis. O Código veio fixar os princípios éticos a seguir em procedimentos e investigações médicas, nomeadamente o consentimento voluntário obrigatório das pessoas que a elas se submetem. Não existem referências a “manipulação genética” no Código de Nuremberga, que não versa sobre esse assunto concreto.

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As questões de modificação genética estão reguladas em legislações nacionais, com cada país a decidir sobre os seus limites. No caso português existem normas fixadas na lei sobre Informação genética pessoal e informação de saúde que proíbe, por exemplo, “qualquer intervenção médica que tenha por objetivo a manipulação genética de características consideradas normais, bem como a alteração da linha germinativa de uma pessoa.”

No caso da vacina contra a Covid, a publicação que aqui analisamos alega que as vacinas contra a Covid-19 do tipo mRNA (casos das vacinas Moderna ou Pfizer), “alteram o ADN humano”. Esta mesma afirmação já foi verificada pelo Observador em outubro de 2020, numa altura em que estavam a ser desenvolvidas as primeiras vacinas contra a doença que fez a OMS decretar a pandemia (que ainda está em vigor). Nessa altura, o fact check publicado já classificava a informação como falsa, explicando que as vacinas do tipo mRNA não eram sinónimo de alteração do ADN humano. É certo que foi a primeira vez que foi testada em humanos uma vacina com recurso a esta tecnologia, no entanto, o código que é modificado é o de uma molécula da bactéria e não do ser humano.

Fact Check. Vacina mRNA para a Covid-19 altera ADN humano?

Quanto à alegada decisão do Supremo Tribunal dos EUA, não existem registos de que tenha anulado a vacinação universal. O que existiu foi uma decisão sobre a pretensão do presidente Joe Biden de obrigar a vacinação de pessoas que trabalhassem em grandes empresas, com mais de 100 trabalhadores.

Os juízes do Supremo norte americano chumbaram a proposta de Biden, alertando que, “embora o Congresso tenha dado à Administração de Saúde e Segurança Ocupacional o poder de regular os perigos nos locais de trabalho, não deu o poder de regular a saúde pública em geral”. A decisão dizia ainda que “exigir a vacinação de 84 milhões de americanos simplesmente porque trabalham para empresas com mais de 100 funcionários encaixa certamente na segunda categoria.”

No entanto, o Supremo permitiu, nessa altura, a vacinação obrigatória para funcionários da área da saúde que trabalhassem em empresas com fundos públicos, nomeadamente através dos seguros de saúde Medicare e Medicaid.

Supremo Tribunal trava plano de Biden para vacinação obrigatória em grandes empresas

Conclusão

É falso que o Supremo Tribunal norte americano tenha anulado a vacinação contra Covid-19 e é também falsa a alegação de que a vacina do tipo mRNA viola o Código de Nuremberga por “manipulação genética”. O referido Código não versa sobre as questões genéticas, que estão reguladas em legislação nacional. Além disso, as vacina do tipo mRNA não modificam o ADN do Homem, mas sim uma molécula da bactéria. O que o Supremo Tribunal travou, em janeiro de 2022, foi uma proposta do presidente dos EUA Joe Biden para tornar obrigatória vacinação para pessoas que trabalhem em grandes empresas, por considerar que a Administração de Saúde e Segurança Ocupacional não tem esse poder. Nessa decisão também não consta qualquer referência à “vacinação universal”.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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