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O Outono pede castanhas. Mas sabia que são um alimento extraordinariamente nutritivo? |
Existe de alguma forma um certo estigma associado às castanhas. Como se fossem a fonte de quilos indesejados por serem um alimento rico em hidratos de carbono. Mas falta um contexto mais aprofundado sobre este fruto para se perceber o bem que nos faz ao corpo — e à alma. |
O conceito de nos alimentarmos respeitando a natureza e, ao mesmo tempo, potenciando a nossa saúde, assenta em vários pilares. Um deles é do respeito pela sazonalidade dos alimentos. |
Isto significa que, numa determinada altura do ano, devemos deixar entrar no menu da nossa semana alguns alimentos típicos desse período. Ora, tratando-se do outono e dos meses de outubro a dezembro, claro que temos de pensar nas famosas castanhas. Mas ao incluirmos este (ou outro) alimento, devemos fazê-lo em troca de outro que esteja no nosso dia alimentar. Ou seja, não deveríamos continuar a comer o que sempre comemos, nas quantidades de sempre, e acrescentarmos as castanhas no final. E este talvez seja o melhor conselho que vai ouvir sobre o consumo de castanhas. |
A ideia será usar a castanha no prato em alternativa ao arroz, à batata ou à massa. Claro que, durante o dia, é uma alternativa ótima ao lanche habitual de pão ou mesmo no lanche em que costuma comer apenas fruta (se não a comer nessa altura, faça-o até ao final do dia). As castanhas são, seguramente, uma alternativa muito melhor que bolachas, pães de leite e cereais açucarados nos lanches das crianças. É verdade que temos de as descascar enquanto ainda estão mornas (para não se tornar numa tarefa penosa), mas aguentam perfeitamente dois dias no frigorífico, mantendo todas as qualidades. E se as colocar no congelador conservam-se por três meses (se forem cozidas, reduza o tempo de fervura, para não se desfazerem). |
Se optar por cozer, há dois procedimentos importantes: o golpe na casca e, o mais importante para a nossa saúde, incluir erva doce para facilitar a digestão. Também pode acompanhar com chá de erva doce e fará o mesmo efeito. |
O segredo, porém, está na quantidade. Se falo em substituir o pão por castanhas vamos tentar descortinar a quantas castanhas equivalerá. Assumindo que uma castanha média pese cerca de dez gramas, sete castanhas (cerca de 70g) é o equivalente (em calorias) a comer 70g de pão de centeio integral (duas fatias de 12cm). A comparação deve ser feita com pão integral porque só assim estamos a comparar dois produtos com fibra — logo, com comportamentos de absorção de glucose semelhantes. |
E no nosso prato, a quantas castanhas equivale a uma “porção” de arroz?
Para esta resposta, temos de fazer algumas suposições de base. A “porção” de arroz para um adulto ocupa ¼ do prato e corresponde em regra a 140g de arroz cozido. Sabendo que o peso do arroz cru triplica quando cozido, que os valores nutricionais oficiais são para arroz cru integral e que 35g tem as mesmas calorias que cerca de seis castanhas, então a correspondência para 140g de arroz cozido será de… oito castanhas. |
E castanhas estufadas, fazem sentido?
Claro que sim. Também as pode juntar a um assado ou simplesmente comer com uma salada. Pense no frango assado de outono com cebolas e castanhas à volta e acompanhado de salada. As castanhas combinam muito bem com couves, cogumelos e couves de Bruxelas. Verá que, sem grande esforço, as consegue incluir em uma a duas refeições por semana nas próximas seis semanas. |
Há mesmo uma receita de hummus de castanha?
Sim, claro. Pode consultá-la aqui. Junte aos clássicos palitos de vegetais e terá um lanche perfeito e saudável e com “comida de conforto”. |
E como explicar às crianças que as castanhas não são uma sobremesa mas sim um acompanhamento num prato?
Apesar de a castanha ser um fruto, os seus hidratos de carbono são diferentes das restantes frutas. As frutas têm em regra hidratos de carbono de absorção mais rápida, como a frutose e a glucose, mas a castanha tem principalmente amido, que tem uma absorção mais lenta (tal como o pão integral e os flocos de aveia). Quando, na escola, ensinam às crianças a roda dos alimentos explicam-lhes que há um grupo a que damos o nome de “cereais, derivados e tubérculos” que estão agrupados pelos nutrientes que nos dão — neste caso principalmente amido. E explicam também que deveriam escolher as versões mais integrais, por terem mais fibra. Apesar de a castanha não estar presente na roda dos alimentos (considerada por isso uma exceção à roda), tem mais semelhanças com este grupo de alimentos e por isso devemos inclui-la como alternativa a esses “cereais, derivados e tubérculos”. Claro que é saboroso termos castanhas no final da refeição, em vez de fruta. E faz bem à alma também. Mas o mais correto, em termos nutricionais, é vir no prato. |
Pode não ser tão fácil cozer castanhas como cozer arroz (e claro que financeiramente não será tão viável e por isso aconselho uma frequência menor), mas devemos encarar esse passo como uma aprendizagem da nossa cultura. E um desafio. A relação saudável com a comida numa família também implica o encontro de todos na cozinha, onde há entreajuda, onde se mexe nos alimentos e onde, nem que seja uma vez por semana, isso não seja um fardo para uns mas sim um momento de prazer para todos. |
Sabia que a castanha não contém glúten?
Será que se publicitássemos a castanha como “glúten free” teríamos mais consumidores? Dentro das opções sem glúten que o mercado oferece, esta é das que mais fibra contém. A castanha tem cerca de 6-7g de fibra em 100g, aproximadamente o mesmo teor que os bem-afamados flocos de aveia. |
E quanto ao colestererol?
Há estudos que falam na castanha europeia, que consumimos cá em Portugal, como sendo um excelente alimento para quem tem valores de colesterol e glicémia elevados. Tendo em conta que a principal causa de morte em Portugal são as doenças cardiovasculares e que somos um dos países europeus com mais prevalência de diabetes eu diria que poderia ser uma medida de prevenção genérica estimular o consumo de castanhas no outono — e não fosse apenas nos festejos de São Martinho. |
Dois factos sobre a castanha que vai gostar de saber: |
- É rica em fibra: tem 6g de fibra por 100g. Ou seja, dez castanhas médias são consideradas uma ingestão adequada diária, porque significam 25 a 30g fibra/dia. É essa a razão que faz das castanhas um alimento óptimo para diabéticos, em substituição de arroz branco, massa branca e batata branca.
- Tem dois antioxidantes que aumentam a sua concentração quando cozinhados (e devemos comer as castanhas sempre cozinhadas) que dão pelo nome de ácido gálico e ácido elágico com efeito importante antitumoral
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Já agora, deixo também uma sugestão de um texto que vale a pena ler sobre a castanha e o castanheiro e o valor que devemos dar a esta produção. |
E, para quem se quiser aventurar com novas receitas, encontra algumas sugestões no site do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável. |
Verdadeiro ou falso? Quero deixar de fumar mas já sei que vou aumentar de peso |
Verdadeiro. Principalmente se não planear. Não tem que dar por perdida a causa, porque há muitos casos de sucesso em que não aconteceu esse aumento de peso. Deve com algum tempo de antecedência começar a melhorar a alimentação e, se ainda não o faz, introduzir exercício físico de forma regular antes de deixar de fumar. Os estudos dizem que, em média, o aumento é de quatro a cinco quilos após um ano, embora sem qualquer aumento de risco para a saúde, já que os benefícios de redução de risco de mortalidade associados à cessação tabágica continuam mesmo com o aumento de peso. |
Uma pergunta frequente nas consultas: qual é a melhor fruta para comer? |
Todas. E tenho pelo menos três explicações para isso: |
- Porque não conseguimos encontrar numa única fruta todos os antioxidantes que nos vão ser benéficos e por isso precisamos diversificar. Pense nas cores diferentes que encontra nas frutas. São indicativas desta variedade de antioxidantes.
- Porque o conteúdo em fibra difere entre frutas, que juntamente com os fitoquímicos presentes na fruta, vai ajudar a diversificar a nossa microbiota. Nos último cinco anos descobriu-se muito sobre o nosso intestino. Sabemos agora que quanto maior a diversidade de bactérias naquele órgão, melhor será. Por isso podemos dizer que a diversificação alimentar tem um papel importante nesse parâmetro de saúde.
- Umas frutas são mais ácidas e outras mais doces. Por isso todas têm um papel para ensinar ao nosso palato qual é o sabor doce saudável. É o que nos permite depois distinguir sabores muito mais doces e limitar o seu consumo. O sabor que devemos procurar quando queremos alguma coisa deverá ser o da manga, banana, diospiro, abacaxi, melão e outras mais que goste. O que devemos ajustar é a quantidade de fruta que ingerimos de cada vez. Claro que, mediante alguma limitação de saúde, pode haver frutas mais benéficas que outras, mas isso também se passa com outros alimentos. Todas as indicações referidas nesta newsletter são para pessoas saudáveis.
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Este guia foi elaborado pelo Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável (PNPAS) e aborda dez conselhos úteis para alcançarmos uma alimentação mais saudável, aplicada a jovens e adultos, com conceitos acessíveis e graficamente muito simples de entender. |
Torna-se relevante rever estes conselhos principalmente nesta semana em que saiu o novo PNPAS (2022-2030) que reitera a importância da alimentação na nossa saúde, mostrando análises impactantes que deveriam ser uma call to action para todos dedicarmos um bocadinho mais da nossa atenção à alimentação. Deixo-vos aqui os valores de mortalidade e de anos de vida perdidos por incapacidade em Portugal em 2019, de acordo com este relatório: “A alimentação inadequada, enquanto uma das principais causas evitáveis das doenças crónicas não transmissíveis, nomeadamente da obesidade, doenças oncológicas, doenças cérebro-cardiovasculares e da diabetes mellitus tipo 2, contribuiu (em Portugal) para 7,3% dos DALYs (Disability-adjusted life years – anos de vida perdidos por incapacidade) (243 567 anos perdidos de vida saudável) e para 11,4% da mortalidade, no ano de 2019 (13.275 mortes).” |
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Mariana Chaves é nutricionista clínica, autora do podcast Aprender a Comer, na Rádio Observador, e do livro Dieta Única (ed. Guerra e Paz, 2016) [ver o perfil completo]. |