Eis a pergunta que ecoa na cabeça de milhares de directores, professores e famílias: se o pessoal docente e não-docente está vacinado contra a Covid-19, se há testagens regulares e se até uma grande maioria dos jovens a partir dos 12 anos está também vacinada, por que razão se continua nas escolas a seguir as mesmas medidas sanitárias de Março, com professores e turmas inteiras enviados para casa quando se detecta um caso positivo, inclusivamente quando até às crianças mais novas se exige que andem de máscara? A resposta é simples: porque a DGS deixou o ano lectivo começar sem actualizar as suas normas.

Por exemplo, as medidas de saúde pública no rastreio dos contactos não reconhecem os elevados níveis de vacinação em Portugal, nem distinguem entre vacinados e não-vacinados. Ou seja, estar-se ou não vacinado é indiferente para a actual avaliação das autoridades públicas sobre os riscos de contágio e, consequentemente, sobre as medidas a aplicar nas escolas. Então, mas isto acontece por opção? Não. Acontece apenas porque a DGS ainda não publicou a revisão anunciada para breve, na qual essa diferenciação se aplicará. Qual é a pressa, não é?

Entrámos há dias no terceiro ano lectivo afectado pela pandemia e já se contam dezenas de turmas em casa e milhares de alunos prejudicados pela imposição de ensino a distância. Alguns estão no primeiro ano de escolaridade, sem qualquer autonomia para aprender remotamente, sem conhecer as novas professoras e sem ligação à escola nova. É, literalmente, tempo perdido. E, de resto, tempo perdido tem sido a regra escolar nesta pandemia. Nos últimos dois anos, os alunos portugueses destacaram-se por terem sido dos mais atingidos a nível internacional, seja pelas desigualdades no acesso ao ensino a distância, seja pela perda de aprendizagem e de dias de ensino presencial (os do ensino básico perderam mais dias do que a média da OCDE). Ora, por tudo isso, o mínimo exigível era que a preparação deste terceiro ano lectivo em pandemia visasse evitar ao máximo que novas situações de suspensão do ensino presencial sucedessem. Pois bem, essa preparação falhou.

Falhou, não porque o fracasso fosse imparável, mas por incompetência das autoridades públicas — em particular, da DGS. Neste recomeçar das aulas, Portugal e a Roménia são os únicos países da UE onde as medidas sanitárias que se aplicam nas escolas não foram actualizadas para fazer a distinção entre vacinados e não-vacinados, assim enviando desnecessariamente muitos mais alunos e professores para casa. Aliás, o período de isolamento em Portugal é ainda o mais longo da UE: 14 dias. Paradoxalmente, também nas comparações europeias, Portugal assume-se hoje como o campeão da vacinação contra a Covid-19, já perto dos 85% da população vacinada. Nenhum outro país europeu tem uma taxa tão elevada. Só que isto de sermos os campeões da vacinação, afinal, (ainda) serve de pouco — somos os mais lentos a ajustar as normas sanitárias para garantir que as escolas podem realmente funcionar.

Vivemos na incoerência de quem oscila entre o oito e o oitenta. Naquela zona cinzenta onde se ziguezagueia entre a enorme incompetência (da DGS) e a exemplar competência (da task force da vacinação). Poderia ser apenas frustrante, mas torna-se revoltante quando, em causa, estão novamente a educação e o desenvolvimento de milhares de crianças que precisam da escola para atingir os seus sonhos. Já chega desta incompetência, cujo preço é sempre pago pelos mais frágeis.

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