A justiça penal acordou para a violência doméstica a partir dos anos 70 do século passado, e talvez o seu início na esfera jurídica internacional se deva à Organização das Nações Unidas, instituição que proclamou 1975 como o Ano Internacional da Mulher e lançou, logo de seguida, a Década das Nações Unidas para as Mulheres (1976-1985), procurando promover a igualdade de direitos e a participação feminina.

A importante decisão da ONU desencadeou o chamado movimento Take Back the Night, o qual começou a sair às ruas em 1976, na Bélgica e na Inglaterra, através de manifestações com o objectivo de alertar para as constantes práticas de violência contra as mulheres, especialmente a sexual e o assédio em espaços públicos.

O Take Back the Night apresentava-se ao mundo como resposta direta a uma suposta cultura de medo que limitava a liberdade das mulheres de circularem em espaços públicos, principalmente à noite, sem receio de serem atacadas. O movimento nasceu da ideia de que todas as pessoas têm o direito de andar pelas ruas, independentemente da hora, sem temer pela própria segurança.

Nos anos 90, a violência doméstica passou a ser reconhecida como uma violação de direitos humanos, impulsionada pelo direito internacional. A Declaração sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres, adotada pela Assembleia-Geral da ONU, em 1993, surgiria como um verdadeiro marco ao definir a violência contra as mulheres como um problema social, e destacando a responsabilidade dos países em tomar medidas para preveni-la e erradicá-la.

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A partir de então, vários governos e respetivos sistemas de justiça começaram a ver a violência doméstica como uma questão que afeta não só a família, mas também a sociedade como um todo, exigindo uma resposta legal de proteção.

Em Portugal, a violência doméstica foi formalmente incluída no Código Penal em 2000, com a criação de uma tipificação específica do crime. Desde então, a legislação tem evoluído, a fim de reforçar a proteção às vítimas, incluindo medidas como a possibilidade de prisão preventiva para o agressor, ordens de restrição e de protecção, e o aumento das penas para casos de reincidência. Em 2009, a violência doméstica foi classificada como um crime público, o que significa que pode ser denunciada por qualquer pessoa, e não apenas pela vítima.

Essas mudanças refletem a compreensão crescente de que a violência doméstica é uma questão de interesse público, aconteça numa relação fortuita, de namoro ou de matrimónio, e uma ameaça à dignidade humana. Nem tudo tem de ser permitido. Quando, por exemplo, a mãe alega que o pai é violento, o sistema de justiça é obrigado a avaliar a gravidade e a veracidade das acusações, mas, antes, a proteção da criança é prioritária.

No direito de família, o princípio do superior interesse da criança orienta todas as decisões para a proteção da mesma. Tal significa que, se a convivência com o pai puser a criança em risco, os tribunais poderão optar pela guarda exclusiva da mãe ou, nalguns casos, limitar o contato do pai com os filhos, impondo visitas supervisionadas ou restrições no convívio, a definir e a acompanhar no Processo de Promoção e Proteção. A violência doméstica, especialmente quando envolve os filhos, justifica tamanhas limitações.

Mas, se por um lado é verdade que as sociedades estão atualmente mais atentas e prontas a fazer a denúncia dos abusadores, por outro lado, não é menos verdade que vivemos o flagelo das falsas denúncias de violências, particularmente no litígio parental. Denunciar, na maioria das vezes, o pai de ser uma pessoa violenta, verbal e fisicamente, tornou-se uma perigosa estratégia para se obter ganho processual e benefício de uma guarda monoparental, excluindo o outro progenitor da vida do filho e impondo, pela mentira, rupturas familiares.

As falsas queixas de violência doméstica ou de maus-tratos ficam normalmente sem castigo. O Ministério Público é a entidade pública que tem competência para promover ou aplicar medidas em defesa das vítimas, para dirigir ou para encerrar inquéritos, e para deduzir acusações ou arquivar processos. Os arquivamentos acontecem quase sempre por falta de provas, mas dificilmente se demonstra que os (ou as) denunciantes mentem.

Esse abandono do pai ou, melhor, da verdadeira vítima, constitui obviamente uma ameaça à dignidade humana. Durante meses e meses investigam-no como se se tratasse de um agressor, apenas para se conseguir impedir os filhos de conviverem com ele e, igualmente, com os avós paternos. Pretende-se a rutura total da família do hipotético agressor.

Este modus operandi perverso multiplica-se sob a proteção da morosidade dos tribunais e da pouca atenta avaliação da situação do menor em contexto de ruptura do casal pela Proteção de Menores. Neste contexto de disputa pela posse e guarda de filhos, a mãe costuma desenvolver uma relação de excessiva proteção, doentia, mentindo-lhes sistematicamente, manipulando-os, tudo com o intuito de neles provocar sentimentos de rejeição, imputando culpas ao pai.

E o resultado? O resultado são anos perdidos por todos, e nas famílias onde a mentira prevaleceu à criança que, entretanto, cresceu e se tornou adulta. E que será sempre emocionalmente frágil.