Angola e Brasil estão à beira de eleições. Deveria ser um momento normal e natural em países que vivem em democracias consolidadas. Mas, pelas notícias e discursos que nos vão chegando, o momento nestes dois países é de angústia pelo que pode acontecer nas horas e dias seguintes à contagem dos votos.

Bem sei que por estes dias só as notícias vindas do Leste da Europa e da Ásia dominam a nossa atenção, mas as eleições desta semana em Angola e as do Brasil em outubro podem ter efeitos muito mais diretos e imediatos na nossa vida quotidiana do que a guerra na Ucrânia ou o braço de ferro no mar da China.

Estima-se que residam em Portugal cerca de meio milhão de brasileiros e outras tantas centenas de milhares de angolanos. Para além das relações Estado a Estado, estamos unidos a estes dois países por laços familiares, afetivos e económicos que nos devem fazer encarar estas eleições como se fossem também um pouco nossas.

Milhares de angolanos de várias origens e religiões juntaram-se este fim-de-semana em Luanda a implorar um desfecho pacífico depois de conhecidos os resultados eleitorais. Pela primeira vez depois do fim da guerra civil, estamos perante umas eleições que podem retirar o MPLA do poder. Devia ser um momento de festa e de esperança, não tanto pelo resultado, mas porque o equilíbrio de forças entre Unita e MPLA aparenta ser um sinal de amadurecimento da democracia e, portanto, uma porta aberta para um maior e mais rápido desenvolvimento de um dos maiores e mais ricos países de África. As notícias de que estas eleições podem ditar o fim da paz no país são chocantes e mostram uma realidade política totalmente antagónica à vontade expressa do povo.

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No Brasil o cenário é semelhante. Os dois principais candidatos discursam mais como dois senhores da guerra do que como agentes políticos. Lula e Bolsonaro representam o pior do Brasil dos últimos cinquenta anos. Infelizmente, seja qual for o resultado, não é de crer que algo de bom esteja para acontecer do lado de lá do Atlântico. Mas as coisas podem ainda piorar se se aprofundar o discurso de ódio e de dúvida sobre o escrutínio eleitoral num país que tem um dos melhores e mais seguros sistemas do mundo.

As próximas eleições não são vistas como a festa da democracia nem em Angola, nem no Brasil. Os tempos não estão fáceis e podem ainda piorar com novas crises que não temos no radar.

É por isso que vale a pena olhar para o que temos de mais próximo e tentar, aí sim, fazer a diferença. Portugal e os seus mais altos representantes (Presidente da República e Governo) devem empenhar todo o seu prestígio internacional para ajudar estes dois países irmãos a levarem a bom porto os próximos atos eleitorais.

Marcelo Rebelo de Sousa deve medir bem e com grande ponderação a sua próxima viagem ao Brasil, em plena campanha eleitoral. Se não o fizer, até pode aparecer muitas vezes na televisão, mas será pelos piores motivos. Num momento como o que o Brasil atravessa, o Presidente da República de Portugal não pode ser usado com uma arma de arremesso entre dois candidatos.