A boa notícia sobre a disparidade de rendimentos em Portugal é que a diferença do PIB per capita entre as regiões diminuiu entre 2000 e 2017. Aliás, Portugal foi o Estado-membro da UE onde essa diferença mais diminuiu. A má notícia é que esta diminuição não resulta tanto das regiões pobres se terem aproximado das regiões mais ricas, mas das regiões mais ricas divergiram da média da União Europeia.

Segundo o INE, em 2000, o PIB per capita em paridade de poder de compra da Área Metropolitana de Lisboa era 120% da média da UE. Em 2019, tinha diminuído para 102%. Foi uma perda relativa na qualidade de vida de quase 20 pontos percentuais. Na Área Metropolitana do Porto este indicador desceu 6 pontos percentuais, de 82%, em 2000, para 76%, em 2019.

Estes dados são o retrato de um país que, uniformemente, não consegue recuperar. Entre 2000 e 2018, o centro e o Alentejo também divergiram, o Norte estagnou e apenas o Algarve, os Açores e a Madeira convergiram face à média da UE (respetivamente 1,7, 3,2 e 1,1 pontos percentuais). E isto foi antes da pandemia. A crise financeira colocou-nos num patamar inferior de convergência do qual, desde então, não tivemos capacidade para sair. Agora, a atual crise atirar-nos-á para um novo escalão ainda mais abaixo.

A escassos meses de receber o maior pacote financeiro que Portugal alguma vez recebeu, é crucial refletir sobre como podemos distribuir os fundos europeus (o remanescente dos fundos do Portugal 2020, os fundos do Plano de Recuperação e Resiliência e os fundos do próximo Quadro de Financiamento Plurianual 2021-2027) aos projetos que têm a melhor hipótese de nos tirar desta armadilha de baixo crescimento.

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Para saber o que fazer no futuro é preciso avaliar os resultados do passado. Um estudo recente sobre os fundos de coesão divulgado pelo think tank Bruegel identificou os fatores que explicam o melhor desempenho das regiões que mais convergiram entre 2014 e 2020: maior duração de cada projeto apoiado, enfoque inter-regional, gestão mais centralizada ao nível nacional, menor parte de cofinanciamento nacional, proporção mais elevada de beneficiários do setor privado e do terceiro setor e níveis mais elevados de financiamento do fundo de coesão.

Em Portugal, a Agência para o Desenvolvimento e Coesão já divulgou algumas avaliações sobre a execução dos fundos do Portugal 2020. Por exemplo, no que toca aos aspetos da coesão, publicou em 2019 uma análise que indica ter havido uma insuficiente adaptação da execução às necessidades particulares dos territórios. Já no que diz respeito aos efeitos dos fundos estruturais nas empresas, uma avaliação de 2018 identificou impactos positivos nos níveis de investimento, emprego, inovação e internacionalização.

Esta informação, embora ainda parcelar e não inteiramente atualizada, deveria servir para planear a execução dos fundos que estão a chegar. Devia também haver mais transparência na informação sobre os projetos financiados, para permitir que instituições académicas, think tanks e outros pudessem dar os seus contributos para este debate. Infelizmente, o Governo abandonou qualquer ilusão de transparência, ao incumprir com a obrigatoriedade, estabelecida pelo anterior ministro Miguel Poiares Maduro, de divulgar todas as operações aprovadas pelos Fundos.

Desde 2000, estamos todos mais iguais, mas sobretudo mais pobres face ao resto da UE. Para mudar, é preciso conhecer o que correu bem e o que correu mal no passado e aplicar essa experiência no desenho da implementação dos fundos. Por agora, na consulta pública do Plano de Recuperação e Resiliência, para além de um organograma de uma página sobre os ministérios envolvidos, não existe uma ideia clara de como será posto em prática.

Mais do que uma estratégia, o Governo parece ter uma consola de jogo: à medida que os fundos vão caindo vê onde é que eles encaixam, como se fazia no velhinho Tetris.