Nós, os católicos, quando rezamos a profissão de fé, ou Credo, dizemos que a Igreja é una, santa, católica e apostólica. Una, porque está unida na mesma fé e na pessoa do Papa. Santa, porque o é no seu divino fundador, nos seus fins e meios, embora nem sempre nos seus membros, todos eles chamados, contudo, à santidade. Católica, porque universal, sem ser exclusiva de nenhuma raça, etnia, cultura ou ideologia. Apostólica, porque os bispos são os sucessores dos apóstolos, na continuidade da mesma missão salvífica universal.

A unidade da Igreja implica uma grande diversidade de católicos, pois os há de todo o género e feitio, nomeadamente, entre muitos outros, os duros e os fofinhos.

São duros os que sonham com uma Igreja monolítica, autoritária, condenatória e tradicionalista. Ante o que consideram a deriva pós-conciliar, apostam num regresso ao passado puro e duro. Enquanto cantam, a plenos pulmões, “Ó tempo, volta para trás”, refugiam-se em celebrações cheias de velas e de incenso, com muitas vénias e véus, murmuradas num velho latim eclesiástico, como se fossem as palavras mágicas que permitem aceder ao trono do Altíssimo, em que julgam ser os únicos admitidos. Cuidam muito dos adereços e das vestes, dos sapatos com fivelas e das faixas, dos chapéus à don Camilo e das capas à Cinzano, mas não tanto da caridade com os irmãos na fé que, por preferirem liturgias mais simples, mas não menos piedosas, consideram possessos do demónio. Prezam muito a obediência aos seus superiores, em que descobrem rasgos de divina predileção, em detrimento da hierarquia eclesial, contaminada pelo vírus letal do secularismo, e do Papa Francisco, alvo preferencial das suas muito ortodoxas diatribes.

No outro extremo do universo eclesial, estão os católicos fofinhos. São gente moderna, politicamente comprometida, sem outro complexo que o complexo de não ter nenhum complexo. Podem ser leigos, padres ou bispos até. Têm uma enorme preocupação por agradar ao mundo, do qual esperam as benesses que Deus nem sempre dá, nesta vida, aos seus eleitos. Namoram o poder e o dinheiro, mas sempre com vistas ao melhor bem, eufemismo que significa a sua própria carreira política e eclesial. São tão compreensivos que não diferenciam o bem do mal; tão ecuménicos que não sabem o que os distingue das outras confissões cristãs; tão inter-religiosos que acham que, afinal, todas as religiões são equivalentes, porque em todas há virtudes e vícios, santos e pecadores, verdadeira piedade e execrável farisaísmo, gestos de grande heroísmo altruísta, mas também detestáveis fanatismos terroristas.

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Os duros não dialogam e preferem as forças políticas autoritárias, em que se revêem. Os fofinhos falam com toda a gente, sobretudo com a esquerda e a extrema-esquerda, sem dizerem nada e aceitando tudo, desde que os aceitem também. Os duros fecham-se nos seus misteriosos cenáculos, de frente para o altar-mor, mas de costas voltadas para o mundo que os rodeia e de que fogem a sete pés, como o diabo da Cruz. Os fofinhos vivem para o mundo, têm os seus pobrezinhos de estimação e gostam muito de brincar aos assistentes sociais, a que reduziram a pastoral eclesial. Os duros proferem anátemas a torto e a direito, lavram sentenças de excomunhão a todos os que não pensam e agem como eles ou, pior ainda, são deste mundo e tempo. Os fofinhos são muito inclusivos com os defensores do aborto e da eutanásia, persuadidos de que, assim, terão sempre aceitação e palco na comunicação social, dominada pelo frentismo da esquerda e pelos lóbis extremistas. Os duros benzem-se cada vez que encontram um diabólico noviço ou professo na ideologia de género, enquanto os fofinhos desfazem-se em amabilidades com estes alternativos, não seja que os rejeitem nos ambientes e meios em que proliferam e dominam ou, pior ainda, lhes coloquem o infamante labéu de intolerantes, ou retrógrados.

Que me desculpem duros e fofinhos, mas não me revejo em nenhuma dessas capelinhas, por temer que nenhuma delas seja, verdadeiramente, a Igreja que, por ser de Jesus Cristo, é una, santa, católica e apostólica. É nos seus santos que me revejo, não como quem a eles se equipara, mas neles encontra o exemplo para seguir o Mestre que é caminho, verdade e vida.

Não procuro a segurança dos duros, nem a comodidade em que vivem os fofinhos. Não me revejo na severidade inquisitorial dos tradicionalistas, nem nas cumplicidades cobardes dos modernistas. Não me satisfazem as celebrações anacrónicas dos duros, nem me preenchem as liturgias profanas dos fofinhos. Não quero ser um ermitão que, por viver no deserto, mesmo que seja no meio do frenesim citadino, se desentende do seu tempo e dos seus irmãos. Mas também não quero ser um profeta corrupto que, por ter cedido à tentação do poder, ou do dinheiro, deixou de ser sinal de contradição.

A minha Igreja é a de Alguém que nasceu num estábulo, sendo Filho de Deus e da família e casa do Rei David. Alguém que comia com publicanos e pecadores, mas que nunca pactuou com os seus pecados. Que correu à chicotada com os vendilhões do templo, mas tocou com as suas mãos os olhos dos cegos, os ouvidos dos surdos e os membros tolhidos dos paralíticos. Que perdoou a adúltera apanhada em flagrante, mas que também lhe exigiu que não voltasse a pecar. Que acolheu os samaritanos, que os judeus desprezavam, mas que à mulher da Samaria, que encontrou junto ao poço de Jacob, recriminou por viver com um homem com quem não estava casada, depois de ter tido cinco maridos. Que fazia milagres ao sábado, contrariando os fariseus, mas que os não fez diante de Herodes, por se negar a satisfazer a sua ímpia curiosidade. Que recusou o trono que o povo lhe ofereceu, mas disse ao governador romano que era rei e que, como tal, tinha às suas ordens as legiões dos Anjos do Céu. Que recorreu ao seu poder divino para perdoar e salvar o ladrão arrependido, mas que o não usou para se salvar a si mesmo da morte ignominiosa na Cruz.

A minha Igreja é a dos patriarcas e dos profetas, dos apóstolos e dos mártires, dos confessores e das virgens. A minha Igreja é a que é perseguida na China e em França, pelo comunismo, pelo terrorismo islâmico e pelo laicismo. A minha Igreja é a que não precisa de se travestir de Che Guevara para lutar contra as injustiças sociais, nem desiste de proclamar o seu humanismo transcendente, na afirmação ousada da sua doutrina social. A minha Igreja é a que acolhe todos os pecadores, quaisquer que sejam os seus pecados, como a mim, pecador, recebe também, sem deixar de condenar o pecado, nem de a todos animar à conversão, sem desistir de ninguém. A minha Igreja é a de São João Paulo II, de Bento XVI e de Francisco, mas também de Agostinho de Hipona, Catarina de Sena, Inácio de Loyola, Teresa de Jesus, Josemaria Escrivá, Padre Pio, Madre Teresa, Jacinta e Francisco Marto, Edith Stein e Carlo Acutis.

A minha Igreja não é boa porque é minha, mas é boa precisamente porque não é minha, nem me pertence: é de Deus. Não é rígida, nem mole, não é dura nem fofa, mas una, santa, católica e apostólica. Porque a Igreja a que, embora indigno, pertenço, sirvo e amo, é a única que é de Nosso Senhor Jesus Cristo.