Nunca pensei que o movimento anti-vacinas fosse tão forte em Portugal. Calculava que houvesse alguns chalupas espalhados por aí, mas nada com esta dimensão. Quem diria que a maior resistência à vacinação dos portugueses estivesse na DGS e no Ministério da Saúde? Os anti-vaxxers têm suas teorias da conspiração, mas nada é tão eficaz a afastar o português da vacina da gripe como a incompetência de Graça Freitas e Marta Temido.

Logo no início de Maio, o Bastonário da Ordem dos Médicos avisou o Governo para acelerar o processo de compra de vacinas da gripe. Uns dias depois, o Governo confirmou ter ouvido o aviso da Ordem dos Médicos, revelando estar a tratar disso.

Em Agosto, Graça Freitas disse que o plano de vacinação contra a gripe vinha a ser elaborado “já há muitos meses (…) até porque há medidas que se têm que tomar com muita antecedência”, sublinhando que “a primeira medida de todas da preparação do plano de Inverno com Covid e sem Covid é que a vacinação contra a gripe seja feita de uma forma precoce e intensiva”. Depois, no dia 16 de Outubro, garantiu que “há vacinas distribuídas suficientes para começar a segunda fase [da vacinação]” e que “o SNS preparou-se para aumentar a cobertura da vacinação da gripe e para aumentar o acesso das pessoas a esta vacina”.

No entanto, na semana passada, Graça Freitas concedeu que a vacina não vai chegar para todos. Ou seja, a DGS é tão naba, que nem consegue mostrar-nos o que é bom para a tosse. Pelos vistos, fizeram mal as contas. Neste momento, é pior para os Portugueses contarem com os dados da DGS, do que com os dados do casino. As probabilidades são mais favoráveis.

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(Na mesma entrevista, Graça Freitas afirma estar abismada por se dizer que a DGS não comunica bem. Tem razão. A DGS comunica bem demais: como diz tudo e o seu contrário, não há espaço para errar. Se há uma alternativa entre duas opções, Graça Freitas aconselha ambas. Logo, é impossível escolher mal. Comunicação mais clara não há).

Sinceramente, não esperava este falhanço. Sobretudo, tendo em conta que o Ministério da Saúde e a DGS são liderados por mulheres e a aquisição de vacinas da gripe é, na prática, o mesmo que fazer compras online de produtos para os quais não se tem qualquer uso naquele momento, mas que vão dar jeito no futuro. Que foi, justamente, o que as mulheres têm andado a fazer desde que começou a pandemia. A minha, por exemplo, fartou-se de adquirir agasalhos em saldos, durante o Verão, para usar no tempo frio. Obviamente, não foi só isso que ela comprou. Recebemos cá em casa 2873 encomendas, entre a obra quase completa da Condessa de Ségur, 200 quilos de comida para cão a metade do preço, um moinho de café moldavo, um cão e um puzzle dos Painéis de São Vicente em que as personagens são mariscos – muito giro, o Lavagante D. Henrique. Às tantas, os CTT atribuíram-lhe um Código Postal só para ela.

Portanto, não há desculpa para um organismo como a DGS, com técnicos especializados, ter fracassado ao longo de 6 meses na execução de uma tarefa que a minha mulher, formada em Marketing, conseguiria realizar numa tarde, munida dum razoável pacote de dados 4G e de uma conta Paypal, enquanto bebericava sumos detox e via episódios do Outlander.

E foi o Presidente da República tirar a camisa para isto. Ali, forte, arriscando o resfriado para incentivar os Portugueses a vacinarem-se. (Quer dizer, para ser rigoroso, não se pode dizer que Marcelo tenha corrido real risco de se constipar. Não estava frio suficiente para isso, como se comprovou pela incipiente tumescência dos presidenciais mamilos). Por momentos, Marcelo foi o Mais Alto Alternadeiro da Nação, de peito ao léu a atrair os Portugueses aos Centros de Saúde, para depois se cortar à última hora, deixando-os de mãos a abanar e obrigando-os a satisfazerem as suas necessidades pelos seus próprios meios.

O falhanço com a vacina da gripe faz com que se comece a desconfiar da capacidade do Ministério da Saúde garantir a nova vacina da Covid. Mesmo que consiga comprar as doses necessárias, como espera convencer os Portugueses a vacinarem-se depois desta banhada? Vai ser preciso um esforço suplementar por parte dos responsáveis políticos. Não sei se o país está preparado para ver Marcelo Rebelo de Sousa em pelota.

Já para não falar das exigências logísticas. A vacinação só será bem-sucedida se garantirmos acondicionamento a -80°C. Receio que em Portugal não haja armazéns com essas características, onde seja possível criopreservar Marta Temido e Graça Freitas até à pandemia passar.

Ao que parece, enquanto vários países já revelaram o plano para a vacinação Covid, Portugal ainda não o fez. O que é natural, uma vez que não se consegue mostrar o que não existe. Isto revela bem a evidente divergência que existe entre o Governo e o povo. O Governo quer fugir com o rabo à seringa e o povo está doido por entregar o rabo à seringa.

Entretanto, todas as farmacêuticas estão concentradas na Covid, descurando os vários outros problemas que afectam a saúde das pessoas. Isso não é justo. Também deviam dar atenção às outras moléstias. Por exemplo, a Pfizer já tem a sua vacina anti-Covid. Agora que tem mais tempo livre, porque é que não aproveita para se dedicar à procura de uma vacina que nos proteja contra a DGS?