O confinamento de março de 2020 funcionou.

Em parte, por ter sido ativada uma das nossas emoções básicas: o medo. O terror que se aproximava de Itália e Espanha, invadiu-nos. O Governo sustentou o sentimento. Fechou as escolas, contra o parecer de conselheiros de saúde. Os media, passaram de uma posição informativa para uma postura pedagógica. Comunicavam o que deveria ser a ação de todos nós. Um país alinhado. A remar para o mesmo lado apesar do medo, do sofrimento, das dificuldades.

Em contexto de intervenção psicológica há dois conceitos essenciais: aliança e rutura.

A aliança é boa para os intervenientes quando: concordam nos objetivos a atingir, combinam como vão alcançá-los baseados numa relação empática e de confiança. A rutura ocorre quando estes elementos se perdem. Não raras vezes, sinais impercetíveis instalam-se, promovendo as fissuras e as ruturas na aliança.

Esses sinais iniciaram em maio último. Quando os governantes apareciam a tomar café e a almoçar fora, dizendo ser seguro sair. As pessoas, de nariz nas cortinas de casa, interrogavam-se: “Será mesmo seguro?” Veio o verão e com ele a confiança. Sentiu-se liberdade, alívio.  A partir daí, o medo baixou consideravelmente, acompanhado de uma fadiga psicológica, de uma incógnita quanto aos desafios económicos e sociais. O outono não foi preparado. Afirmou-se que não se voltaria a fechar escolas. O inverno chegou com a ideia que era preciso salvar o Natal. Com cautela, mas podia-se circular, estar com a família. A confusão comunicacional instalou-se: as regras foram umas, depois outras. O ano novo chegou com a publicidade da vacina. A salvação tinha chegado, o medo perdeu-se, a motivação já não era a mesma e o reconhecimento de credibilidade entre interlocutores desvaneceu-se.

Nunca mais a aliança entre os Portugueses e as autoridades foi a mesma. A comunicação e a confiança perderam-se. E, com isso, a sensação de estarmos todos alinhados, a remar no mesmo sentido. A comunicação de risco, em tempos de pandemia, está estudada.

As mensagens têm de ser coerentes, claras, adaptadas à situação e o emissor tem de ser percecionado como credível e de confiança. A psicologia da comunicação de risco deve considerar aspetos emocionais e racionais. Os últimos centram-se em factos, em estratégias para lidar com a doença e em comportamento de saúde. Informação que deve ser dada em dose certa. Mas os estudos demonstram que as dimensões emocionais são mais suscetíveis de influenciar o comportamento das pessoas, a motivação e a adesão às políticas de saúde e de combate a pandemias. Evocar o medo é uma das estratégias de comunicação de risco. Mas depende de vários fatores, como a mensagem e os diferentes públicos a alcançar.  Tem de ser ponderada e equilibrada. O conceito de distanciamento psicológico também influencia a perceção de risco. Para uma determinada ameaça à saúde, quanto menor a distância psicológica, maior a ameaça percebida. Há vários fatores, baseados no conceito de distanciamento psicológico, que contribuem para a definição de uma política de comunicação de risco. A pandemia, ainda instalada, e a catástrofe social, emocional e psicológica, irá perdurar por muito tempo. Carece de alinhamento entre todos os protagonistas. E, para isso, uma comunicação de cariz psicológica e emocional pode ser um contributo essencial.

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