1 As declarações de Donald Trump na semana passada sobre a NATO e a Rússia ultrapassaram todos os disparates que aquele carroceiro mal-educado, — como lhe tenho chamado, com as devidas desculpas aos profissionais do sector, que nunca abotoa o casaco e que nunca seria admitido num Gentlemen’s Club — terá produzido no passado (e os disparates do passado não foram poucos). A ulterior chocante notícia da morte de Alexei Navalny nas masmorras da Sibéria do ditador Putin agravou imensamente a já elevada gravidade moral das palavras de Trump.

2 As palavras de Trump foram amplamente citadas na imprensa internacional e nacional, mas podem e devem ser brevemente recordadas:

“Disse a um presidente de um grande país que, se os países europeus da NATO não pagassem a sua parte para a defesa eu não os ajudaria a defenderem-se contra uma invasão da Rússia. Não, eu não os protegeria. De facto, eu encorajaria a Rússia a fazer o que quer que quisesse.”

Estou a citar a partir da crónica semanal de Charles Moore no (conservador) Daily Telegraph de Londres na terça-feira da semana passada (13 de Fevereiro). E Charles acrescentou que as declarações de Trump devem ser lidas em conjunto com a patética entrevista do seu (de Trump) apaniguado, um tal Tucker Carlson, ao ditador Vladimir Putin em Moscovo. Foi uma patética exibição de servilismo propagandístico ao ditador Putin – “o pior monstro na Europa desde a morte de Stalin”, concluiu Charles Moore.

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3 Estou a citar Charles Moore não sobretudo por sermos amigos e por ele ser um frequente orador no Estoril Political Forum do IEP-UCP (que este ano celebrará a 32ª edição anual). Estou a citá-lo, sobretudo, porque ele é um respeitado colunista conservador (no sentido britânico do termo), biógrafo de Margaret Thatcher, antigo director do Telegraph e da Spectator as mais antigas e respeitadas publicações conservadoras britânicas.

Sendo um conservador e atacando directamente Donald Trump, Charles esclarece um fundamental equívoco do nosso tempo: o de identificar Trump e os vários populismos revolucionários de direita em crescimento na Europa com a direita democrática europeia (chamada ‘Conservadora’ no Reino Unido, “Democracia Cristã” em boa parte da Europa continental, talvez agora de novo “Aliança Democrática” em Portugal).

4 Sobre aquele equívoco monumental, escreveu no Expresso Henrique Burnay um artigo simplesmente magistral sob o título “Donald Trump é um suicida da América e os seus aliados europeus são anti-ocidentais”. Este título é só por si uma lição. E o texto assim titulado desenvolve todos os temas cruciais.

Em primeiro lugar, Henrique Burnay recorda que “Donald Trump é o mais anti-americano de todos os presidentes dos EUA de que nos conseguimos lembrar”. Recordando Reagan e George Bush, Henrique Burnay afirma muito justamente que “Donald Trump não quer ser o líder do Mundo Livre, como se apresentavam muitos dos seus antecessores.”

Em segundo lugar, Henrique Burnay sublinha que, “perante esta tragédia americana, a Europa terá de reavaliar a sua política de segurança e defesa”. Em seguida, e para evitar equívocos eurocêntricos e anti-americanos, Henrique sublinha que a União Europeia deve continuar a cultivar – e agora a liderar, em conjunto com o Reino Unido – a Aliança Euro-Atlântica.

E este certeiro alerta vale também, talvez sobretudo, para os patéticos fundamentalistas do “Brexit” que esquecem (ou, mais provavelmemte, ignoram) o estrutural empenhamento dos conservadores Winston Churchill, Ronald Reagan e Margaret Thatcher para com a aliança euro-atlântica, incluindo o seu apoio à União Europeia.

5 Finalmente, tenho de registar que este é o tema central da capa da mais recente edição do The Economist de Londres (17 de Fevereiro): “The Right Goes Gaga: Meet the Global Anti-Globalist Alliance”. O argumento central é muito saudavelmente semelhante aos de Charles Moore e de Henrique Burnay.

“Apesar do seu nome, ‘national conservatism’ [a auto-designação da chamada “nova direita”] não poderia ser mais diferente das ideias de Ronald Reagan e Margaret Thatcher. (…) Nos anos 1980, Ronald Reagan e Margaret Thatcher construíram um novo conservadorismo em torno dos mercados e da liberdade. Hoje, Donald Trump, Victor Orban e vários políticos na Europa estão a tentar demolir essa tradição”.

The Economist é também muito enfático em sublinhar a diferença fundamental entre duas direitas e duas esquerdas: uma direita e uma esquerda demo-liberais — que concorrem entre si, ao mesmo tempo que em conjunto defendem o Mundo Livre — e uma direita e uma esquerda iliberais – cujos programas populistas, estatistas e protecionistas cada vez mais se assemelham entre si e que pactuam com os inimigos do Mundo Livre.

A seguir, no segundo Editorial daquela edição de The Economist, aparece outro título bombástico. “Europe must hurry to defend itself against Russia – and Donald Trump” – no qual me inspirei para o título deste meu artigo.

Post Scriptum: Ninguém é bom juiz em causa própria e por isso deixei para esta nota final uma breve referência a que todos estes temas fundamentais da aliança euro-atlântica estiveram no centro dos debates na 2ª edição anual das Conferencias do Atlântico, em Câmara de Lobos, na Madeira, nos passados dias 24 e 25 de Janeiro. Randolph Churchill, bisneto de Winston Churchill, foi um dos principais oradores e o tema global foi precisamente “Winston Churchill, The Freedom of the Sea and the Atlantic Charter”.