Este escrito vem a propósito da mensagem do título que se repete inúmeras vezes nas redes sociais. Atribuída e muitos empresários, a muitos recrutadores, a muitos observadores. De cada vez que a vejo vem assinada por uma pessoa diferente.
É evidente que todos gostaríamos de contratar boas pessoas porque tipicamente uma boa pessoa pode transformar-se num bom profissional, assim o queira.
Estimular, indiretamente, a que as pessoas sejam boas pessoas também nada tem de mal, antes pelo contrário. Não é o que todos deveríamos ser? Ou fazer por ser?
A questão é, porém, muito mais complexa do que a simples frase que se repete e repete.
Como se contratam boas pessoas? Como se escrutinam boas pessoas? Como se encontram boas pessoas? A referência da referência dá-me esta ou aquela como boa pessoa? Ainda mais além: o que é efetivamente uma boa pessoa? Aquele que nunca diz nada, que se abstém de dizer por trás mas também não diz à frente, aquele que se afasta dos problemas porque lhe cheira a esturro, aquele que não compra nenhuma contenda, nenhum assunto é assunto seu? Podíamos continuar por aqui fora e ir parar ao lado da desresponsabilização. Mas o importante mesmo, e o ponto deste texto, é mesmo saber onde e como se encontram as boas pessoas?
Há testes que nos permitam escrutinar boas pessoas? Não.
Há formas de avaliar boas pessoas a não ser pelo seu historial e pelos valores que vão pondo em prática? Não.
Há referências que nos dizem que esta ou aquela pessoa é boa pessoa e por isso essas referências são à prova de más pessoas? Não.
É complexo. Muito mais complexo do que parece.
A boa pessoa é uma pessoa de valores, digo eu, e que não prescinde ou se afasta deles doa o que doer. Mas isso não é para todos. Prejudica-se em função dos seus valores. Sofre em função daquilo em que acredita. Não aceita compactuar com o que se desvie do que é a sua retidão.
E se essa pessoa ao afastar-se dos seus valores o faz para salvar ou resgatar outras? E se não está disposto a sofrer quando chega a sua vez porquanto o salário faz falta para pagar as contas? E se ao não se desviar em nada acaba num redil que o torna refém de si mesmo?
As suas chefias são boas pessoas e pode confiar-se nelas?
As pessoas que lidera são boas pessoas e pode-se confiar nelas?
A pessoa nunca verga, em que circunstância for, perante as suas chefias e lideranças e perante os seus liderados porquanto é uma boa pessoa e apenas pratica os melhores valores?
Questões muito complexas.
Mas voltando ao ponto deste artigo: como se recrutam boas pessoas? Onde estão? Quais os testes para saber se continuam boas pessoas mesmo quando se lhes dá mais poder e se lhes põe dinheiro na mão? Mesmo liderando equipas? Mesmo tendo um ascendente sobre outros?
Desenganem-se aqueles que acham que conseguem recrutar boas pessoas. Desenganem-se aqueles que acham que a boa pessoa hoje não se pode transformar amanhã, em função das circunstâncias e do contexto, numa pessoa diferente. Por isso é muito complexo recrutar boas pessoas.
Uma coisa sei. Não se deve centrar a entrevista e o curricula apenas sobre questões técnicas. Mas e tudo o resto que lá vem é aceitável como verdadeiro? Como posso escrutinar? Quantas pessoas são verdadeiramente boas pessoas a vida inteira?
Mais importante que tudo isto e do que o recrutamento de boas pessoas parece-me, e só me parece, que é importante resgatar pessoas. Dar-lhes mais de uma oportunidade. E aceitar que elas falham como cada um de nós falha. É muito mais importante manter a confiança nas pessoas e aceitar que falham do que achar que vão sempre ser boas pessoas. Porque quando falharem nos seus valores – e todos falham – não estaremos, isso sim, a procurar aceitar a sua falha.
A frase devia ser: procura locais de trabalho onde perdoem as tuas faltas e não necessariamente recrutem boas pessoas. É mais fácil encontrar alguém com disposição para aceitar de novo e esquecer uma falha do que encontrar uma boa pessoa. Sobretudo que seja sempre uma boa pessoa.