Os defensores do “marxismo”, do “marxismo-leninismo” e do “marxismo-leninismo-estalinismo” continuam à espera de um milagre que tarda em chegar: a construção do “verdadeiro socialismo”. Enquanto aguardam, vão teimando em acreditar que vale a pena tentar uma vez mais, mesmo com os gigantescos e enormes prejuízos humanos, económicos e políticos que isso acarreta.

Cuba é mais um exemplo disso. Os comunistas e seus partidários agarram-se a esse exemplo como a uma das últimas “bóias de salvação”. Um pequeno país insular socialista continua, com um povo unido, a resistir ao gigante vizinho capitalista. O conto é bonito, mas não é nada verdadeiro.

Este é um dos muitos mitos que já não justificam o estado de calamidade económica, social e política a que os comunistas cubanos levaram o seu país.

O “embargo norte-americano” é um deles. Este erro crasso da diplomacia da Casa Branca foi mais útil para prolongar a dinastia dos Castros do que para a derrubar. Não só porque, durante muito tempo, ajudou a unir grande parte da sociedade cubana, mas também porque nunca chegou a funcionar plenamente.

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Depois da tomada do poder por Fidel Castro & companhia em Havana, o país passou a ser sustentado praticamente à custa da União Soviética e da “comunidade socialista” do Leste da Europa, o que lhe permitiu investir meios não só na educação e na saúde, mas também no sector militar. Ou seja, na prática, o “bloqueio ianque” era apenas parcial.

Além disso, o “internacionalismo proletário” era outra fonte importante de rendimento para o regime de Cuba. Por exemplo, o governo de Havana não tinha despesas com os soldados cubanos que eram enviados para Angola, pois eles não combatiam gratuitamente ao lado do Movimento Popular de Libertação de Angola, da Etiópia, etc. Seria interessante saber quanto é que os angolanos pagaram pelo apoio cubano à ditadura de Agostinho Neto e de José Eduardo dos Santos, que riquezas saíram de Angola para Cuba.

Outro mito é a “ajuda humanitária”. Os enfermeiros e médicos que vão trabalhar para o estrangeiro recebem salários em “moeda forte” e parte dela vai para financiar os luxos da nomenclatura comunista. Isto já era feito na União Soviética, quando milhares de médicos, enfermeiros, tradutores e conselheiros militares faziam fila para serem enviados para o estrangeiro, pois iriam ganhar salários com que não podiam sonhar em casa. Os médicos cubanos que trabalham em Portugal são um exemplo disso. Trata-se de um processo de circulação de mão-de-obra que nada tem a ver com o “internacionalismo proletário” ou a “ajuda humanitária”.

E não nos podemos esquecer dos milhões de dólares que os refugiados cubanos nos Estados Unidos enviam para as suas famílias e que parte dele vai parar ao bolso dos dirigentes.

As causas que levaram Cuba a um autêntico estado de penúria e fome são as mesmas de todos aqueles que seguiram modelos económicos como o soviético: o controlo quase absoluto da economia pelo Estado, o sistema de partido único, a falta das mais elementares liberdades democráticas.

A China conseguiu evitar a catástrofe, pois os seus dirigentes não tiveram pejo em ir buscar as mais selvagens formas de desenvolvimento capitalista e, ao mesmo tempo, tomaram medidas férreas para que o desenvolvimento na economia não desse origem a “desvios ideológicos” e não abalasse o sistema de partido único.

Gorbatchov ou Deng Xiaoping?

As numerosas manifestações que tiveram lugar em inúmeras cidades cubanas podem levar alguns a pensar que o presidente cubano Miguel Diáz-Canel possa ser o Mikhail Gorbatchov (arquiteto das reformas na URSS) cubano, mas isso é altamente improvável, pois o primeiro conhece certamente bem o destino do segundo. Além disso, o aparelho do Partido Comunista Cubano também está ao corrente do que aconteceu aos seus camaradas soviéticos.

Diáz-Canel parece optar pela “saída chinesa”: uma abertura económica controlada, mas sob o controlo total do Partido Comunista. A forma como foram reprimidas as manifestações dos opositores e os apelos feitos por ele aos “revolucionários” mostram que Diáz-Canel não está com ideias de democratizar o sistema político.

Como a história mostrou, os partidos comunistas são incapazes de vencer umas eleições transparentes e democráticas e, por isso, não se espere que Diáz-Carnel seja o primeiro a arriscar pôr fim ao monopólio do poder dos comunistas.

PCP igual a si próprio

Nesta situação, o Partido Comunista Português mantém-se “firme” e “coerente” nas suas posições. No comunicado publicado, “Fim do Bloqueio dos EUA – Solidariedade com Cuba”, não existe uma linha sequer a reconhecer que o descontentamento naquele país da América Latina também possa ser fruto de erros dos dirigentes cubanos. Os comunistas portugueses continuam a recorrer a esquemas tradicionais e esfarrapados: “bloqueio norte-americano”, “ingerência” e “pressão” externas, ou seja, ao discurso do costume.

Se os dirigentes comunistas lessem com atenção os clássicos do “marxismo-leninismo-estalinismo”, concluiriam que os milhares de cubanos que saíram às ruas em sinal de protesto não o fizeram graças às “acções de desestabilização e provocação que os EUA promovem”. Isso vai contra o “abc” do “marxismo”. Para isso terão de existir “condições objectivas e subjectivas”. Se não existir descontentamento interno, nem a CIA, nem a Mossad, nem o SVR conseguirão organizar manifestações desta envergadura, pois, como é sabido, não se fazem omeletes sem ovos. Os “inimigos externos” podem apenas aproveitar-se dos erros cometidos pelos políticos no poder e só não o farão se forem incompetentes.

Ronda o ridículo a passagem do comunicado do PCP quando “salienta o exemplo de coragem e dignidade de Cuba e do povo cubano”. Mas os manifestantes descontentes não fazem parte do povo?

Nas eleições parlamentares de 2015 em Portugal, o PCP e a “melancia aliada” conquistaram 445.901 votos, ou seja 8,25%. Estarei enganado se afirmar, baseando-me na lógica comunista, que o povo português com coragem e dignidade se resume a esse número e encontra-se em vias de extinção?  Não é essa a lógica do PCP?