Passada uma semana desde o cancelamento da conferência de Jaime Nogueira Pinto, por decisão da FCSH da Universidade Nova, para onde nos levou o debate? Para a casa de partida. Ao longo destes dias, o país (à esquerda e à direita) criticou a decisão do director da faculdade, o ministro do Ensino Superior lamentou a decisão, e Marcelo abalroou a opção da faculdade. Mas lá veio o BE equilibrar as críticas, no debate parlamentar, associando tudo a golpes de propaganda dos promotores, sob o apoio do PS que assegurou ao país que os estudantes censores não fizeram “ameaças físicas” a ninguém. E, depois, o que aconteceu? Nada. A conivência da FCSH com formas de censura às liberdades política e de expressão não teve consequências. E, daqui a uns dias, ninguém se lembrará sequer do episódio.
Passadas duas semanas desde que a esquerda parlamentar em peso persegue Teodora Cardoso e o Conselho de Finanças Públicas (CFP), para onde nos levou o debate? Para lado nenhum. O governo e o PS prosseguem no confronto com o CFP e chumbaram o nome de Teresa Ter-Minassian, pressionando a sua independência (com ameaça de revisão da sua orgânica) e intrometendo-se numa decisão do Tribunal de Contas e do Banco de Portugal. Enquanto isso, o país assiste em silêncio aos ataques e entretém-se em discussões sobre a relevância da instituição presidida por Teodora Cardoso. Como se o ponto não fosse o encurralamento institucional do CFP por parte da maioria parlamentar.
Passadas duas semanas desde que o “caso das offshores” irrompeu, para onde nos levou o debate? Para lado nenhum. O país animou-se com teorias da conspiração, segundo as quais o governo PSD-CDS (e Paulo Núncio em particular) teria deliberadamente ocultado informação acerca de fuga de capitais e de pagamento de impostos. Entretanto, percebeu-se que os impostos foram pagos e que, no geral, as operações ocorreram sob o mandato do actual governo que, pela voz de Rocha Andrade, responsabilizou o sistema informático pela ausência de registos. Assunto arrumado? Nem por isso: descobriu-se que, entre 2013 e 2014, milhares de milhões de euros saíram do BES para offshores, precipitando a queda do banco. De quem era esse dinheiro e como se explica que essa fuga de capitais, que esvaziou o BES, passasse despercebida? Culpar o sistema informático não chega. Mas tem bastado ao debate partidário para apontar o dedo a Carlos Costa e ao Banco de Portugal, já que ir ao fundo da questão não parece interessar ao PS. Com quinze dias disto, nada mudou e, agora, dificilmente mudará.
Eis a inconsequência em que se encontra o debate em Portugal. Sempre foi assim? É certo que o histórico de casos é longo, multidisciplinar e multipartidário. Mas não há memória recente de tantos silêncios perante um controlo tão firme de uma maioria política sobre o rumo do debate público. O que difere entre o passado e o presente? O enfraquecimento das instituições – intimidadas na sua independência e atacadas na sua acção – que promoveu o aprofundar da dependência nos partidos políticos, agora os únicos árbitros das polémicas nacionais. Hoje, é para o parlamento que tudo escoa, vertido em comissões de inquérito, declarações políticas e debates de actualidade. E é lá onde todas as polémicas se afogam, convertidas em discussões de trincheira no teatro parlamentar, onde a verdade não tem lugar e, em cacofonia, cada lado acusa o adversário de malfeitorias. Nada é mais eficaz para acabar com um assunto de interesse público do que enviá-lo para o parlamento.
Este é um dos efeitos da actual preponderância política do parlamento: a exclusão das instituições independentes e a submissão dos temas nacionais às máquinas partidárias. Só se investiga o que não incomoda a maioria parlamentar – o acesso a informação acerca da CGD foi bloqueado. Só se discute o que convém à maioria parlamentar – observe-se como as questões sobre o BES têm permanecido sem resposta. Só se conclui o que satisfaz a maioria parlamentar – veja-se o à-vontade como, no debate parlamentar sobre a censura à conferência de Jaime Nogueira Pinto, o BE decretou a ausência de ataques à liberdade de expressão. Sim, é sinal de que a geringonça tem coesão e condições para sobreviver à legislatura. Mais tarde, descobriremos se o regime e os seus equilíbrios institucionais sobreviverão à geringonça.