Enquanto o processo de aplicação da vacina tarda e é, justificadamente, criticado não só pela Ordem dos Médicos mas também por muitos especialistas das diversas áreas científicas implicadas, para não falar nos cidadãos mais velhos, que continuam a representar 85% dos óbitos registados pela DGS, não falando dos que jazem entre as vítimas do chamado “excesso de mortalidade”. Em suma, enquanto o desastre sanitário prossegue apesar dos confinamentos, o Governo continua a arrastar-se cada vez mais penosamente de casos em casos graves, cujos responsáveis ministeriais não querem assumir as responsabilidades enquanto o Primeiro-Ministro vira a cara.

Entretanto, a corrida à eleição presidencial iniciou-se com o desinteresse generalizado do eleitorado e dos próprios candidatos perante os resultados previsíveis, com a possível excepção do representante de uma quantidade ignorada de pessoas que se consideram, precisamente, não representadas pelo actual sistema político-partidário nem tão pouco pelo actual Presidente da República, cuja reeleição garantida só pode tirar interesse à campanha e aos próprios resultados eleitorais. A saber, o deputado André Ventura.

Como tenho argumentado, o principal indicador fornecido pelas eleições de dia 24 será, obviamente, a abstenção. Partindo do princípio que as eleições não serão manipuladas, no género de prometer a vacina às senhoras idosas dos “lares”, a expectativa é uma abstenção maciça, possivelmente superior à de 2016, na qual já então foram menos de 50% os inscritos que votaram em algum candidato.

Ao invés do que a comunicação social pretende veicular, a reeleição do actual presidente não será uma variável política significativa, seja qual for o jogo do PS: este continuará a fazer valer a actual versão do “bloco central”, a qual conduziu – com a “ajuda” da pandemia – à profunda crise em que o país caiu. A causa disso são as desgarradas políticas clientelares seguidas pelo Governo, para não falar das múltiplas formas de corrupção, assim como o aumento incontrolável da dívida externa devido a empreendimentos absurdos como a TAP e o ex-BES, que irão custar ao país mais do que o orçamento do SNS… Dez anos depois, as sombras de Sócrates e do “DDT” são mais espessas do que nunca!

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Neste sentido, a segunda incógnita mais relevante da eleição presidencial será a votação no candidato André Ventura. Se ficar em segundo lugar, como é possível, isso dirá muito do futuro dos outros partidos, abrindo o processo conhecido de adesão do eleitorado do PCP ao magma da “direita”. Se, porventura – passe o jogo de palavras –, chegasse ao segundo turno, seria a hecatombe a prazo do actual sistema partidário, o qual já só sobrevive graças aos múltiplos clientelismos e aos subsídios de todo o género.

Ora, a única sondagem credível entre as várias “estimativas” divulgadas pela comunicação social – na aparência, o nosso maior “influente” – é a do ICS-ISCTE, a qual nos conta uma história bem mais complexa. Com efeito, para além do indiscutível rigor estatístico da sondagem, ficamos a saber que das 2847 pessoas contactadas inicialmente, apenas 810 (28%) responderam ao inquérito e destas, apenas 623 (77%) disseram ir votar; destas últimas, 12% declararam não saber ainda em quem… Ou seja, os inquiridos que revelaram em quem votariam ficaram reduzidos a 600 e destes, apenas 40% declararam explicitamente votar no actual PR. Neste momento, só sabemos que pouco mais de um quarto dos inquiridos iniciais irão votar e, quanto aos que declaram ir votar nele, são apenas 40% da amostra final mais uns quantos indecisos!

Nestas condições, a última incógnita relevante é o resultado da embaixadora Ana Gomes, que na minha opinião tem acumulado muitos erros de colagem àquilo que a candidata crê ser o “verdadeiro PS”, algo bem diferente do que pensa António Costa e de grande parte dos eleitores socialistas que irão votar no incumbente. Neste sentido, caso Ana Gomes fique em segundo lugar, o que não é impossível, como esta sondagem prevê (7% versus 5% para Ventura), será uma derrota para o actual Primeiro-Ministro e para os seus homens e mulheres de mão. Se a candidata ficar em terceiro, arrisca-se a ser o fim da sua carreira política, assim como de qualquer alternativa credível ao líder actual…

A margem de erro da sondagem é grande e qualquer dos dois candidatos mencionados pode vir a ficar em segundo lugar. Se for o deputado Ventura, muita coisa será diferente no panorama político-partidário. Tal revelaria a visão de uma parte pequena, mas significativa, do eleitorado mais activo perante a manifesta instabilidade da actual situação do país, apesar da falsa unanimidade atribuída pelos “media” à opinião pública. Desta última, aquilo que fica mais evidente é uma divisão profunda, mas não expressa, acerca da situação real em que o país se encontra e como sair dela. Com o actual PR não é de contar para tal!